quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O primeiro Natal paulistano

Sábado, noite chuvosa, temperatura amena em São Paulo. Lanche frugal, sala de jantar, todos conversando. O tema era o Natal, cuja ceia é realizada em casa.

De repente, a netinha (cinco anos), exclama:
- Vô, conta a história do Natal de quando você era pequeno!

Silêncio. Apenas o leve e suave som da chuva caindo; fecho levemente as pálpebras e minha mente retroage à longínqua década dos anos cinquenta.

Recém-chegados a São Paulo, onde iríamos morar nos próximos anos, ficamos acom

odados na casa da irmã de meu pai, aqui no bairro de Santo Amaro, onde passamos o primeiro Natal paulistano.

Na sala, uma pequena árvore de Natal com uns arranjos, destacando-se os Reis Magos e o menino Jesus na Manjedoura. Meus primos perguntando:
- O que vocês (irmãos) pediram para o Papai Noel?


Meu irmão:
- Pedi uma cartucheira com dois revólveres e o Cideme pediu um patinete.


Eles nos orientaram para deixarmos os sapatos debaixo da árvore Natalina que o Papai Noel deixaria os presentes lá. Papai Noel? Sim! Acreditávamos!

Na manhã do dia de Natal, fomos correndo à sala e não vimos os nossos presentes, mas dentro dos sapatos havia uma nota de quinhentos cruzeiros, uma para mim e outra para meu irmão.

- Pai. Veja! Papai Noel deixou dinheiro para nós ao invés dos presentes que pedimos.

Meu pai explicou que o Papai Noel não teve tempo de comprar e, por isso, deixou dinheiro para nós, o que daria para comprar um monte de brinquedos.

Se desiludidos ficamos, não me recordo; lembro-me que meu irmão ficou meio ressabiado, mas aceitamos e vimos que nossos primos ganharam o que pediram; o que, não me recordo, mas estavam todos felizes.


Nossas mães e avó, preparando o almoço de Natal e nós, no quintal brincando, com as notas de cruzeiros na mão, sacudindo-as para exibir aos primos, e alegres, sonhando com os brinquedos que tal dinheiro nos propiciaria comprar.

Recordo-me que os guardamos numa pequena caixa de papelão junto com outros objetos de "valor" que tínhamos e sempre olhávamos para ver o valioso tesouro.

A alegria durou pouco, pois um dia, ao abrirmos a caixa de papelão e a revirarmos, vimos que as notas haviam desaparecido. Foi um reboliço e choradeira total; ninguém sabia e não dizia nada.

Meu pai, que estava tratando da aquisição do Empório - Casarão - para o qual iríamos mudar, chegou à noite e logo o abordamos informando do desaparecimento. Ele, ficou pensativo e com um ar bem indagativo, disse:
- Será que não entrou um ladrão e as roubou?

O ano terminou e logo para o Casarão mudamos, até que um belo dia meu pai confessou que havia pegado as notas, pois precisava ajudar a pagar a compra do Casarão, e para surpresa nossa, mandou-nos ir à sala e lá vimos: a cartucheira com dois revólveres de brinquedo e o patinete, cuja cor era azul. Foi uma das maiores alegrias de nossa infância.

Muitos anos depois, recordando o fato e com nossos pais já na morada eterna, lágrimas de saudades aos olhos afloraram.

Foi o Natal mais marcante e, talvez, o mais belo de nossa efêmera infância que há muito os ventos dos tempos já levaram.

Por Asciudeme Joubert

7 comentários:

Miguel S. G. Chammas disse...

Lindo Asciudeme!
Que linda recordação natalina, saber que o presente ganho serviu, primeiro, para ajudar na aquisição dolugar que propiciaria o pão da familia, e que belo exemplo recebido de seu pai que não faltou com a verdade e repos o dinheiro com os presentes tão ambicionados.
Foi uma passagem muito bonita que você nos contou.

Soninha disse...

Olá, Asciudeme!

Seja bem vindo ao blog.
Que legal sua historia!
Nossos pais, os verdadeiros papais noel, fazendo tudo para ver-nos felizes, não medem esforços para isto, não é mesmo?!
Estas doces lembranças são vitamina para nossa alma e rendem boas histórias para nossos netos.
Valeu!
Obrigada.
Muita paz!

Arthur Miranda disse...

Viva, que bom ver você por aqui também. Estou muito feliz em ver você nesse blog tão cheio de carinho, É mais um corintiano nesse bando de " Loucos ", cheio de Palmeirenses, seja bem vindo Asciudeme, e parabéns pelo belo texto. Bum, bum , bum estou soltando fogos, pela sua chegada.

Luiz Saidenberg disse...

Muito legal, Asciudeme. E que bom pai, sério e cônscio de seus deveres , tb natalinos.
Prometeu e cumpriu!
Isto é que faz de um Natal uma verdadeira festa! Benvindo ao site do bem!
Abraços.

Wilson Natale disse...

Bem vindo ao Memórias de Sampa, Asciudeme.
Muitas vezes aparecia um dinheirinho no meu sapato. E não era por falta de tempo - Era falta de dinheiro para comprar o presente.
Mas, os Natais passam e o que fica, perdura para sempre é o amor incondicional que tínhamos dos nossos pais e por nossos pais.
Tenha um Natal muito feliz! E um Ano Novo com seus 365 dias cheio de Paz, Saúde e Realizações.
Abração,
Natale

Luiz Saidenberg disse...

ASciudeme, vou colocar, outra vez aqui, uma musiquinha de Alvarenga e Ranchinho referente ao hábito de se por o sapato para receber presente:
No Natar é preciso ter cuidado
pra não fazer o que feiz o Chico Março:
pôs na janela as butina da família,
no outro dia tivéro de andar descarço !
Papai Noér, com aquele saco cheio
de presente, não consegue andar ligêro,
é por isto que os ladrão de butina
gerarmente consegue chegar primêro !
Ho, Ho, Ho !

Myrte e Modesto disse...

Asciu, um Feliz e Esplendoroso Fim de Ano. Que 2011 seja o ano das realisações de suas expectativas mais aguardadas.
Myrtes e Modesto