segunda-feira, 16 de abril de 2018

Quem pode entender?



Sempre procuro contar coisas engraçadas e hilárias vivida por mim, nos meus mais de 67 anos, mas todos sabemos que, infelizmente, a vida não é feita só de alegrias; algumas coisas são tristes como a história que vou contar hoje. Triste e intrigante, dai o título dela. 
Todos os amigos deste site sabem que vivi 47 anos da minha vida na Parada Inglesa, bairro da zona norte de São Paulo. Da casa em que nasci até a última onde morei naquele bairro, não havia mais que dois ou três  km quadrados, portanto conhecia todo mundo que morava por lá. Um destes meus conhecidos chamava-se José Rodrigues. Ele foi uma pessoa pública, muito famosa, não com este nome, mas sim, com seu nome artístico que não vem ao caso agora, até porque, para mim, ele sempre foi apenas o Zé, um tremendo de um amigão e muito mais que isso, meu irmão maçom. O Zé sempre foi uma pessoa muito saudável, forte, sacudido, não fumava, bebia apenas socialmente e apesar de artista, tinha uma vida regrada e não cometia excessos. Quando o Zé estava com 62 anos, em 2012, aconselhado pela filha, a Aninha, que é médica pediatra, ele foi fazer um check-up geral com um cardiologista conhecido dela. Fez esteira, eletro, foi auscultado e tudo mais. Segundo o médico e pelo resultado dos exames o Zé estava inteiro. Naquele mesmo dia a Aninha foi até o apartamento dele para saber dos exames e o Zé disse que o médico havia falado que estava tudo bem, mas ainda assim pediu que a filha desse uma olhada nos exames, o que ela fez, e pelo que ela entendia de cardiologia, realmente não havia nenhum motivo para preocupação. Bateram um papo, e depois de uns 40 minutos ela se despediu do pai e da mãe e foi embora. Quando chegou na portaria do prédio, na hora que a porta de elevador abriu, o porteiro já a esperava dizendo para ela subir que, pelo interfone a mãe houvera avisado que logo depois que ela saiu, o pai não sentira-se bem. Imediatamente ela voltou, ele morava na cobertura do décimo-quarto andar, quando lá chegou o Zé já estava morto, sofrera um infarto fulminante.
Então eu pergunto: Meu Deus do Céu, quem pode entender?... Quem pode entender?

Por Marcos Aurélio Loureiro

O marginal



Corro pelas marginais dos rios sujos da Pauliceia de todos os rumos 

com o pudim de coco no saquinho plástico
e os esqueletos magros dos cachorros soltos
da cidade de ferida aberta atrás de mim.

Corro pela São João e a Ipiranga de toda gente de toda espécie

com o pão de mel na mão de unhas pretas pela fuligem cinza
e os motoqueiros de viseira inútil das buzinas insanas atrás de mim.

Corro pela Paulista da elegância com o anel de pedra de mil quilates 

no bolso direito das calças jeans e a ambulância do instituto do coração na exclusiva faixa da via pública atrás de mim.
Corro pelo Minhocão do padre Péricles com o buquê no peito dos laços rosa entre as lanternas vermeho-brancas do subsolo escuro da Praça Roosevelt para lhe dar um beijo na sua boca inchada, mas a polícia de cavalos pardos atrás de mim. 

Por Eloi Fonseca