domingo, 10 de abril de 2011

A história de Márcia, uma escrevedora de cartas


O trabalho que mostraremos aqui se realiza no poupatempo de Itaquera e nossa companheira Márcia Calixto é voluntária, lá no setor. O poupatempo nunca autoriza a divulgação deste trabalho, mas, desta vez, permitiu que o jornalista Tiago Araujo, do caderno São Paulo, falasse sobre o assunto e que entrevistasse Márcia que, por sua vez,me autorizou a postar aqui, haja vista a matéria ter saído na internet, em Março de 2011.
Entrego-lhes, com meu carinho de sempre!
Muita paz!

Uma caneta e uma folha de papel. Usando apenas estes simples materiais, Márcia Calixto, de 57 anos, ajuda pessoas que não sabem ler e escrever a se corresponderem com parentes, a preencher formulários e a realizar outros serviços que envolvam a leitura ou a escrita. Ela é voluntária do Escreve Cartas, programa do Poupatempo inspirado na escrevedora de cartas Dora, interpretada por Fernanda Montenegro no filme “Central do Brasil”, de Walter Salles.
Toda quinta-feira, Márcia dá expediente como voluntária e ajuda pessoas a retomar contato com parentes que vivem longe.
Aposentada e mãe de duas filhas, foi por meio desse programa que Márcia encontrou a maneira de realizar um trabalho voluntário utilizando o que sabe fazer de melhor: escrever. Durante 20 anos, Márcia trabalhou na área de recursos humanos do Tribunal eleitoral. Foi lá que aprimorou a arte da escrita. “Lá, eu jamais esquecia que por trás de cada processo, de cada papel, tinha uma vida. Por isso, sempre procurei redigir os textos de forma clara, facilitando a compreensão de todos”, conta. Márcia descobriu o Escreve Cartas pesquisando na internet. Fez a inscrição e em pouco tempo foi chamada. Após um rápido curso de capacitação, passou a integrar a equipe de voluntários do programa na unidade do Poupatempo de Itaquera, zona Leste, onde atende às quintas feiras, desde 2008.
Parentes presos - A maior parte das pessoas que procuram o serviço quer enviar cartas a parentes presos ou a programas de televisão. Também existem aquelas que buscam recuperar o contato com pessoas que estão em outras regiões do país, principalmente nordeste, ou no interior de São Paulo. Entretanto, diferentemente do que acontece no filme “Central do Brasil” (em que a personagem cobra para escrever), o serviço do Escreve Cartas do Poupatempo é totalmente gratuito, inclusive a postagem.
No começo, segundo Márcia, as pessoas ficam inibidas para falar de assuntos pessoais, mas logo se soltam, pois o atendimento é feito com muita simpatia e bom humor, como afirma a aposentada Edileuza Albuquerque da Cruz, de 56 anos, que sempre utiliza o serviço: ''As voluntárias são atenciosas, prestativas e nos tratam muito bem. São um amor.''
Assim como no filme “Central do Brasil”, em que a personagem de Fernanda Montenegro, a Dora, escreve cartas para analfabetos e acaba se deparando com diversos tipos de situação, Márcia também já testemunhou fatos inusitados, como o caso de um francês que não sabia se expressar com exatidão em português e pediu ajuda para declarar-se por carta à sua namorada brasileira. No entanto, os voluntários que escrevem as cartas ficam sem saber resultado de seu trabalho. Só ocasionalmente aparece uma pessoa para agradecer por ter reencontrado alguém por meio do serviço.
Reconhecimento público - Segundo a voluntária do Escreve Cartas, Elizete Caroline, as pessoas recebem a atenção dos voluntários e ficam tão agradecidos, que acabam retornando até para assuntos mais comuns, como pedir ajuda para entender a fatura do cartão de crédito ou conta telefone. “A gente senta aqui por algumas horas e muitas vezes nem nos damos conta do bem que proporcionamos a essas pessoas”, conta Elizete.
Neste ambiente, Márcia já presenciou muitas histórias emocionantes. Como o caso de uma moça que pediu para ela fazer uma cópia de uma Carta que seria destinada a um irmão que estava na prisão. “A carta tinha que ter uma cópia, pois a família leria junto a ele, em comunhão de pensamento, como se ele estivesse presente, durante a ceia de Natal, servindo de alento e reforçando a esperança de todos. A carta, segundo a moça, seria o presente de Natal da família e foi muito tocante saber que minha ajuda foi tão simbólica nessa história”, conta.
Além de escrever cartas, Márcia também preenche formulários e atende outras necessidades burocráticas de quem passa pelo Poupatempo de Itaquera.
Mas nem só em escrever cartas consiste o trabalho de Márcia e dos voluntários. O local tem um movimento muito grande de preenchimento de formulários. “Parece uma coisa simples preencher um formulário. Porém, eles contêm alguns termos que não são de conhecimento de todos. Então, o pessoal de outros setores do Poupatempo encaminha essas pessoas com dúvidas até nosso setor”, relata.
Além de preencher formulários, os voluntários fazem procurações, declarações e até currículo. Eles também ajudam pessoas com deficiência visual a utilizarem o serviço do Escreve Cartas. “Gostei bastante do serviço. Às vezes a gente fica procurando quem nos ajude, mas com esse serviço tudo fica mais fácil”, conta Terezinha Saldanha, de 35 anos, deficiente visual que obteve auxílio no preenchimento de um formulário.
Voluntaria por vocação - O Escreve Cartas não é o único trabalho social realizado por Márcia. Ela atua como voluntária na região da Vila Prudente, zona Leste, local onde reside. Lá, ela auxilia num projeto que arrecada brinquedos que são distribuídos às crianças da comunidade no natal. “Temos um grupo de voluntários que realizam um cadastro nas favelas da região durante o decorrer do ano. Após isso, procuramos padrinhos para essas crianças cadastradas, que no natal, recebem um brinquedo, amenizando a carência a que essas pessoas de baixa renda ficam vulneráveis nessa época”, explica.
Outra função exercida por Márcia é a elaboração de textos contando fatos sobre São Paulo, principalmente a respeito da zona Leste, que são publicados no site  http://www.saopaulominhacidade.com.brCom todas essas experiências, Márcia enfatiza a importância de se saber usar as palavras: “Eu sempre acreditei na força das palavras. Temos que esgotar o verbo antes de tomar qualquer atitude. No Escreve Cartas percebi que a importância da palavra é maior do que eu pensava, pois, quando ela atinge as pessoas precisam dela, seu poder é imenso.
Segue link da matéria:
POR TIAGO ARAÚJO


7 comentários:

Wilson Natale disse...

As boas qualidades de uma pessoa devem ser, sempre, exaltadas.
O trabalho voluntário da Márcia é, sem dúvida, um trabalho de amor e dedicação ao próximo.
Hoje em dia pouos sabem a significação do que seja SER ANALFABETO.Márcia sabe e, com dedicação e paciência - e bom humor - vai suprindo com sua caneta e papel a deficiencia que eles têm. Ameniza-lhes a dor da distância, da ausência, que fica maior quando não sabemos escrever.
Com certeza, Márcia também é "ledora de cartas"!
O filme "Cetral do Brasil" e agora este texto sobre a Márcia me fazem voltar no tempo e lembrar da minha avó e outras tantas mulheres que tomavam para si a função de escrever cartas aos parentes dos outros. E faziam isso com ética e sigilo de confessionário.
Parabéns Marcia! Você é como a árvore da parábola de Jesus. Não a figuera seca. Mas a figueira que dá e dará bons frutos.
Abração,
Natale

Miguel S. G. Chammas disse...

Marcia, nda me cabe fazer depois de ler este textodo que lhe render meus mais sinceros agradecimentos.
São atos de pessoas como você que ainda me permitem ter um pouco nde crença na humanidade.
OBRIGADO!

Luiz Saidenberg disse...

Márcia, em primeiro lugar, parabéns pelo belo trabalho e abnegação. Seu trabalho, como o de um anjo, é dar voz a quem não a tem, para comunicar-se com seus afetos longínquos. São os contrastes de nosso país: na era da informática, com recursos cada vez mais assombroso e rápidos a cada dia, há um imenso Brasil para o qual toda essa parafernália tecnológica é pura fantasia, tão distante dele como as lendas do Boitatá e de Mula Sem Cabeça são para nós. E nossa cara Márcia, com emoção e brilho, faz a intermediação entre esses Brasís tão contrastantes. Louvável, realmente.

suely aparecida schraner disse...

Parabéns, Márcia! Também fui voluntária no programa Escreve Cartas do Poupatempo Santo Amaro e, bem sei o enorme prazer que é realizar este trabalho. Além de ótima voluntária, seus textos são excelentes. Sou sua fã.

Zeca disse...

Tiago!

Como disse o meu bom amigo Miguel, quando leio ou ouço a respeito de pessoas que, como a Márcia, dedicam uma parte do seu tempo em favor do próximo, sinto aumentar um pouquinho a minha crença de que ainda é possível encontrarmos pessoas boas por aí.

Afinal, vivemos num tempo em que a maioria das pessoas está voltada para dentro, para seus casulos - ou "prisôes" - como se estivesse se protegendo de toda a violência (de todas as espécies) que nos rodeia, nos assusta, nos acua.

E gestos solidários, de compaixão, de amor ao próximo, conseguem enternecer nossos corações que andam "endurecendo" com o tempo.

Já tentei realizar trabalhos voluntários aqui, onde moro, mas as exigências são tantas e, por vezes, tão descabidas (leia-se "política"), que acabo ajudando pessoas que posso, sem pertencer a nenhum grupo específico. Certamente, se vivesse em São Paulo, esse seria um trabalho que eu gostaria de fazer.

Parabéns, Márcia, por seu exemplo! E parabéns a todos os que, como você, não têm nenhum problema em ajudar ao próximo!

Abraço.

Laruccia disse...

Os méritos da Márcia, pelo que ela proporciona aos analfabetos e com problemas em alguns dos principais sentidos, são louváveis e onde se respalda a essência da verdadeira caridade critã.
Por outro lado, parece que meus colegas esqueceram que quem redigiu esse texto e proporcionou a nós todos tomarmos conhecimento da existência da Márcia e seus honrados afazeres foi jornalista Tiago Araujo. Então, que seja dado os cumprimentos ao Tiago que bem merece pelo trabalho em convencer o Poupa-Tempo para entrevistar e publicar essa bela mensagem. Parabéns a Márcia e ao jornalista Tiago Araujo.
Laruccia

Soninha disse...

Olá, Tiago!

Poxa, que bacana esta matéria, né?!
Márcia já havia falado comigo sobre este trabalho voluntário e eu sempre tive vontade de fazer também.
Que bom que o Poupatempo autorizou a divulgação deste trabalho.
Parabéns pela matéria! E,parabéns também para nossa querida amiga Márcia Calixto!
Valeu!
Obrigada.
Muita paz!