sábado, 5 de março de 2011

O Carnaval, a Borboleta e a censura Federal

Em Janeiro de 1973 eu estava gravando um áudio de voz para um comercial do Baú da Felicidade, no Estúdio Cruzeiro do Sul, de propriedade do amigo Buzo, situado bem no meio do Centro velho de São Paulo, na Rua Conselheiro Nebias; em um intervalo da gravação fomos até um bar e café na esquina com a Rua Vitória, para um merecido lanche e, no bar, o diretor da gravação Renato Barbosa, irmão do Famoso Benedito Rui Barbosa (autor de novelas famosas) começou a rabiscar uma marcha rancho, que no final recebeu um titulo A BORBOLETA AZUL e ficou assim:

NO CARNAVAL EU VOU SAIR DE BORBOLETA AZUL
VOANDO PARA O NORTE E PARA O SUL.

A FANTASIA VAI SER UMA MARAVILHA.
EU VOU PULAR ATÉ GASTAR A SAPATILHA.
EU VOU CANTAR BEM ALTO ATÉ FICAR BEM ROUCA
E TODOS VÃO GRITAR, LA VAI A BICHA LOUCA.
ZUEIRA COMO ESSA EU NUNCA VÍ,
VOU SER ELEITA COMO O REI DOS TRAVESTÍS.
CRUZES, QUE HORROR! (REFRÃO - BIS)
EU VOU DESMUNHECAR PRÁ REFRESCAR O CALOR

O pessoal achou que a marcha era humorística e deveria ser gravada por mim; e não deu outra, dois dias depois, já com um belo arranjo musical, mais o coro pronto na fita do Play back, lá fui eu para o estúdio
colocar a voz. Gravei e saímos todos do estúdio, garantindo que seria a música mais tocada e cantada do carnaval de 1973.
Fui para a casa feliz, achando que enfim faria um sucesso nacional, iria faturar uma boa grana e com isso comprar um novo carro, viajar, etc. Mas, como felicidade de pobre dura pouco, dois dias depois, praticamente faltando 18 dias para o carnaval, fomos convidados pela Censura Federal, que assolava o Brasil naquela época, pedindo o nosso comparecimento até as suas dependências que na época ficava na Av. Xavier de Toledo, para nos informar que a letra da mesma, fora vetada, para o bem do “bom” costume. Rsrsrs.

Hoje em dia, quando ouço determinadas músicas e seus conteúdos apelativos, mesmo achando-as verdadeiras drogas, fico com inveja pensando: Como é bom a liberdade de expressão e como os tempos mudaram.
Mais tarde, dei essa música para a saudosa colega e comediante Consuelo Leandro, que passou a fazer muito sucesso cantando a mesma em seus shows, era sempre bisada e obrigada a repetir o mesmo número novamente.


Por Arthur Miranda (tutu)
Lembre-se que tudo passa
nesse mundo.

9 comentários:

Wilson Natale disse...

Arthur: Pelo menos a música foi parar na mão da Consuelo!
Fazer o quê, não é mesmo?
E você não teve o seu momento de sucesso, pois a censura - aquela bichinha louca resolveu que bichinha borboleta não podia. Só ela poderia, mas a Ditadura, uma bichona véia e mal-humorada não ia deixar nunca... Ahahahahaaaaaaaaaa!
Não permitiram a sua marchinha, porque naqueles tempos a "marcha" era outra.
Mas não deixamos de dançar no carnaval. Eles por sua vez,demorou, mas acabaram por "dançar" bonito. Fantasiados de urubús, hienas, morcegos-vampiro, eles partiram sem ter desfilado no Municipal, nem no Monte Líbano. E nem no São José (risos).
Mas é carnaval! Não dá para sair de borboleta, não faz mal. É só vestir uma camisa listada e sair por ai. Ou então, rasgar aquela cortina de veludo prá fazer uma saia. Ahahahahahaaaaaaaaaaaaaaa!!!
Gostei do texto, Arthur! "bão" demais.
Abração,
Natale

Zeca disse...

Alôôôôô, Carnavaaaaaallll!!!!!!!
Alôôôôô. Arthuuuuurrr!!!

E então, você gravou uma marchinha, cuja letra, além de engraçada, tinha tudo pra cair no gosto do povão e a velha e desdentada censura não permitiu?!?!?!?! Ainda bem que ela foi para a deliciosa Consuelo Leandro, que fez dela um sucesso em seus shows! Mas não existe um meio de retomar essa música e relançar? Acho que hoje, em meio a todas as drogas (drogas em todos os sentidos) que circulam por aí, essa marchinha poderia trazer um ar mais limpo e mais alegre!
Como sempre, gosto muito de ler os seus textos!

Um ótimo carnaval pra você!
Um ótimo carnaval pra todos!

Abraço.

Luiz Saidenberg disse...

Bela marchinha. Pois é, enquanto a maldita censura agia impunemente, cortando a torto e a direito, hoje - não sou moralista, mas tenho bom gosto- passa qualquer coisa, por mais escatológica que seja. Ruim mesmo, desagradável, chula, grotesca, inaudível... E somo obrigados a ouvir essas porcarias. Mas, sem dúvida democracia não pode ser comparada com ditadura. Só imbecís, ou comprometidos, podem ter saudades dela. Abraços.

MLopomo disse...

Porra Tutu, justo esse ano? Cê podia guardar para uns cinco anos depois, que a ditadura estava mais afrouxada. Foi ai que o Silvio Santos gravou a Pipa do Vovô, não "sobe mais!

Soninha disse...

Olá,Arthur!

Pois é! E hoje pode-se falar de tudo nas músicas...
Bunda é o mais comum...Fala-se palavras horriveis que,mesmo que saibamos o significado, choca-nos ouví-las nas canções... Fala-se de armas de fogo, de morte, de sacanagem, de corrupção, de drogas,etc,com a maior naturalidade...infelizmente.
Mas, cada época com seu monstros,nãoé mesmo?!
Cabe a nós termos o critério de ouvir ou não.
Valeu!
Obrigada.
Bom carnaval!
Muita paz!

Modesto disse...

Quando se ouve, nas novelas expressões no tipo de "...vc já trepou com aquele alí? ahh, se eu tiver que engravidar não vai ser com meu marido, não..." e assim por diante, chega-se a conclusão, (tardiamente) da hipocresia que existia naquelas sençuras criadas por retardados mentais que só queriam posar pra imprensa como baluartes da moral e da descência. Coitados, viviam nas sombras de uma inquisição mal formada, totalmente fora de época. Seu texto, sempre cativante, Tutu, parabéns.
Modesto

MLopomo disse...

Tutu, um amigo meu lendo seu texto, disse que os milicos proibiram tocar a gravação da sua musica, porque você compôs uma musica bichana em plena Boca do Lixo. Ali perambulavam machos atrás de Mariposas. Rapazes de sapatilhas gritando borboletas azuis, virariam uma taça nas mãos dos Trogloditas.

suely schraner disse...

Arthur,
tá tudo dominado.Tudo passa e seus belos textos ficam. A marchinha é hilária.Abraço.

Miguel S. G. Chammas disse...

Tutu, que pena o veto. Se fosse hoje nada disso teria acontecido.
Gostei da estoria da "bichona louca de sapatilhas furadas"
Peço perdão de só estar comentando teu texto agora pois viajando eu não tinha acesso a internet.
abração