Mas, não vou me antecipar.
A superstição dos outros entrou na minha vida logo que eu nasci. Nasci grande, gordo e... De olhos abertos! Minha tia-avó vaticinou: “Esse menino não atingirá a juventude”! Benzeu-se. Mais tarde, quando me despontaram os dentes foram os dois inferiores que nasceram primeiro e não os de cima. Dona Lídia, nossa vizinha persignou-se e disse: “Que dó! Essa criança viverá pouco tempo”.
Anos mais tarde, preocupadas, mamãe e vovó perceberam que eu era “sinistro” ( esquerdo, canhoto). Foi um deus nos acuda! Afinal, sabiam todos que o canhoto tinha uma tendência para o mal... Passa mais um tempo e percebem que eu lidava muito bem, tanto com a direita como a esquerda. E todos sabiam que um ambidestro nunca ia saber o que quer da vida... Mas o meu “nonno” rindo, disse: Quanta bobagem! Esse nasceu com o rabo para as estrelas. “Sinistro e destro” vai acender uma vela para Deus e outra para o diabo e com certeza vai dar-se muito bem!” (Nota: Sou canhoto só para escrever e para tudo o mais uso a mão direita.)
Pode uma coisa dessas? Pode! Tudo que era novidade, diferente, entrava no campo da superstição. Hoje crianças só faltam nascer falando. Mas nos anos 40, a maioria nascia de olhos fechados e levavam um bom tempo para abri-los. Na maioria dos bebês, nasciam primeiro os dentes de cima. Outros como eu, os debaixo. E alguns levavam um tempo maior para que os dentes lhes aparecessem. Os canhotos então –coitados- levavam reguadas na mão para que se tornassem destros. Eu, graças a Deus, como tive uma professora que “andava de mãos dadas” com Piaget e Maria Montessori – grandes pedagogos - continuei canhoto.
E, com o tempo eu fui sendo iniciado no conhecimento do “mundo das sombras”. Mundo que nem a “Light” conseguiu iluminar... E o que aprendi? O que me ensinaram?
Aprendi com os napolitanos e calabreses que se deve manter uma tesoura virgem (não usada) sob o berço de um recém-nascido até que lhe caia o cordão umbilical. Assim, se impedirá que “le streghe” - as bruxas - venham a lhe sugar o sangue (as energias) evitando que o bebê enfraqueça, definhe e morra; que todo o bebê deve ter amarrado ao pulso ou pescoço uma fita vermelha com um guizo pendurado, para evitar o mau-olhado.
Que, para evitar as noites insones, ou de sono agitado, ou pesadelos, deve-se manter um punhal virgem sob a cama a fim de evitar as almas penadas, os íncubos e súcubos. Enterrar um punhal virgem próximo ao portão ou entrada da casa evitará que o azar e os inimigos entrem.
Não levar vassoura velha para casa nova (dá azar); pintar as paredes e limpar a casa para onde se vai mudar (uma espécie de exorcismo para expulsar fantasmas e energias negativas).
Não olhar no espelho na noite de sexta-feira da Paixão e na noite de Todos os Santos, pois veríamos os demônios e fantasmas. Deveríamos nos benzer quando a chama de uma vela tremesse em ambiente fechado, pois era sinal de aviso de morte na família, ou que uma alma penada havia passado. Não trazer para casa nada que pertencesse ao cemitério, pois as almas viriam reclamar a devolução...
Superstição! Tanta superstição. Isso sem contar aquelas que são de conhecimento geral; isso sem falar das tantas que nos deu os “Zingari” (ciganos) e o sincretismo religioso.
Paro por aqui e vou direto aos “perigos” dos namoricos.
Gostando ou não, eu era o “Cocco di mamma e di nonna” (queridinho da mamãe e da vovó). E delas, vinha uma avalanche de conselhos, sobre tudo quando comecei com os namoricos, sábias que eram, faziam sérias advertências sobre o assunto. Falavam dos perigos do namoro e sobre mulheres malvadas dispostas a tudo para “arranjar” um marido. (E eu, franguinho novo, estava só namoricando, “tirando linha”...)
Mamãe e vovó viviam repetindo: - “Bada, Ciccio! Le streghe son’ dapertutto”! (cuide-se Ciccio - meu apelido! As feiticeiras estão por toda a parte!)...
E, por via das dúvidas, aconselhavam que eu sempre tivesse moedas de centavos no bolso para simbolicamente pagar, caso uma namorada me desse de presente uma caixa de lenços. Como eles ficavam constantemente com a gente, era usado para muitos feitiços e o pagamento simbólico cortava qualquer feitiço.
Diziam: Se ganhar uma gravata, pague uma moeda por ela. Gravatas são enfeitiçadas para prender um homem como se prende um cão com a coleira. Se ganhar roupa debaixo (camiseta, cueca, meias) aceite e no caminho de casa jogue fora. Camisetas enfeitiçam o coração fazendo com que um homem nunca mais se apaixone por outra pessoa. Cuecas enfeitiçadas deixam o homem impotente, somente sentindo desejo por quem lhe deu a cueca. E as meias, então, eram perigosíssimas! Se enfeitiçadas a mulher iria conduzir os passos de um homem fazendo com que ele “dançasse conforme a música que ela tocasse”...
Se a namorada trouxer um prato com doces, coma. Se lhe trouxer um doce só, não coma. Invente uma desculpa. Pois ela está querendo adoçar, amarrar você. Se ela servir café para você e mais pessoas, tome. Se ela servir você por último, ou trouxer café somente para você, recuse. Pois o cafezinho pode ter sido coado na calcinha dela, suja com o primeiro fluxo menstrual. Isso fará com que ela prenda você pra sempre. E será a sua dona.
Ah! E o mais importante! Nunca deixe uma namorada cortar seu cabelo ou as suas unhas. Com os cabelos ela fará feitiços para ser dona de sua cabeça e pensamentos. E com as unhas poderá fazer feitiços para matá-lo...
Diante dessas maravilhas anunciadas sobre do que pode acontecer num namoro, “brochei” por uns tempos. Na verdade não fui aconselhado. Fui aterrorizado! Mas a carne é fraca e eu - que sempre me senti confortável na larga estrada da perdição - fui em frente com os meus namoricos, não ligando muito para os feitiços e sortilégios e nem o que eles poderiam acarretar. Tá certo que me incomodava muito aquele tilintar de moedas no meu bolso.
"Que las hay, las hay"...
Por Wilson Natale
12 comentários:
Le streghe de la vita...realmente, os italianos contribuiram com muitas crendices, que se ajuntaram às já existentes nacionais. Quanto
a ser destro ou sinistro, lembremos que Michelangelo era ambidestro. E assim tb minha filha Carolina, grande desenhista.
Scuzzi, signori ! Sono sbagliato! Confundi Michelangelo com Leonardo, este, sim, ambidestro !
Olá, Wilson!
Nossa...é mesmo! quantas crendices, quantos medos, quantas dúvidas, foram inseridas em nossa formação, por conta daquilo que acreditavam nossas avós, mães e outros parentes...
Lembrei-me das crendices de minha amada avó materna...quando tivemos nossos filhos, ainda em período de resguardo, ela não deixava ninguém entrar no quarto para nos ver, sem antes perguntar para as mulheres se estavam menstruadas, pois tinham de avisar a parturiente para não secar o leite...rss...colocar fiapos do cobertor do bebê na testa dele para acalmar o soluço...rsss
Nossa...entre tantas outras crendices, que ficaríamos horas a falar sobre elas.
Valeu, Wilson...muito legal!
Obrigada.
Muita paz!
Wilson hay pero no muchas.....
Se fossemos perder tempo cuidando dessas bruxarias não aproveitariamos a vida que é bela e boa.
O negocio e veviver bem e colocar tudo nas mãos de Deus!
Wilson hay pero no muchas.....
Se fossemos perder tempo cuidando dessas bruxarias não aproveitariamos a vida que é bela e boa.
O negocio e veviver bem e colocar tudo nas mãos de Deus!
Wilson, não acredito em bruxarias, superstições e demais crendices. Mas não vou comentar nada, pois tenho medo que meu bisneto primogênito possa nascer defeituoso. rsrsrs.Gostei da narrativa.
Falar sobre Crendices Populares é falar de um assunto sem fim. Mas que diverte, diverte.
Agradeço pelos comentários.
Natale
Ei, Natale!
Quanta bruxaria, quanto feitiço! Ainda bem que feiticeiras são mulheres e, assim sendo, vamos deixá-los (os feitiços) correndo soltos que a gente corre atrás (das feiticeiras)...
Mas gostei e me diverti bastante com o texto. Parabéns! E traga mais.
Abraço.
Caríssimo macumbei..., ou melhor, Natale, vc. sabe que enquanto lia sua "macabra" crônica, o trinco da porta da minha sala, cuja maçaneta em forma de argola, estava estacionada de pé, isto é, tinha aberto a veneziana e larguei a peça como estava, caiu na posição original, pra baixo. Pensei logo, o Natale esta se queixando por eu não ter feito o comentário. Não deu outra: li sua mensagem no meu e-mail. Por favor, não vá me presentear com uma cueca, gravata, par de meia, só camisas.
Meu filho Moacyr, de criança, na mesa, usava só a mão esquerda. A Myrtes, preocupada me disse, será que ele vai ser canhoto? se for, não tem importância. Perguntei a ele por que ele não usava a mão direita. Ele responde: estou comendo como vc, segura o garfo ou colher desse lado e eu faço o mesmo, na mesma direção. Ele levava a expressão de que deve-se "espelhar" nas atitudes paternas. Ele me via como a um espelho. Hoje ele é PHD em engenharia química, formado na Escocia e trabalhando na Arabia Saudita e na Malásia, na extração de petróleo. Vive no exterior ha 6 anos, tem apartamentos e casas, dois filhos trabalhando e estudando na Malasia e na Australia. Tudo isso porque ele é ambidestro, come com a "destra" e escreve com a "sinistra". Os outros quatro filhos, todos destros estão bem mas, todos no Brasil. Bem, Natale, o cerne da questão é sua crônica, ESPANTOSAMENTE FABULOSA, me piacciuto assai, sei un vero lavoratore di letere, sinistra ma, bela. Arrivederci, auguri i saluta a tutti.
Mô
Larù, mio caro: Ti Ho fatto uno scherzino (uma bricadeirinha)per E-mail.(risi).E a brincadeirinha rendeu um bello comentário! Grazie!
E te conto um segredo: Aprendí com um Barese que, quando uma namorada nos dava um fora, a gente deveria escrever o nome dela no pé esquerdo e pisar no chão com toda a força, para que ela oltasse e nós nos tornássemos dono dela. Caso estivéssemos interessados em uma garota, deveríamos fazer o mesmo, só que no pé direito. Então ela se interessaria por nós. (risos)
Abração,
Natale
Wilson, esqueci de te contar uma: quando perco alguma coisa, amarro um pedaço de barbante no pé da mesa e acho o objeto logo em seguida. Acredite se quizer, faço isso até hoje.
Mô
Larù, esta do pé da mesa eu não conhecia. Mas, continuo achando aquilo que perco, dando três pulinhos para São Longuinho. (risos)
Postar um comentário