quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Minha história mesclada à de Sampa – 3ª parte

Nossas casas’, talvez por serem relativamente grandes, sempre foram ponto de encontro da família. Era lá que se realizavam as festas de Natal, que eu esperava ansiosamente durante todo o ano. Para mim o momento mágico começava quando, no início do mês de dezembro, meu pai aparecia em casa com um pinheiro natural, que seria plantado numa daquelas latas de óleo, de 20 litros. Era quando a minha mãe tirava para fora as caixas que continham as bolas e enfeites para a árvore e, todos juntos, íamos colorindo o pinheiro com bolinhas de tamanhos variados, carinhas de Papai Noel, anjos variados, passarinhos, casinhas e toda a multiplicidade de enfeites de vidro fino como casca de ovo e brilhante como verniz que se espalhava pela árvore. Depois, aqueles festões dourados e a ‘neve’ feita com flocos de algodão. Por fim, emaranhar os galhos com os fios das lampadinhas coloridas e, agora, era só cobrir o latão que suportava o peso do pinheiro com um tecido vermelho e enfeitá-lo com um laço de cetim verde e, pronto! Era só ligar as lampadinhas na tomada e ficar maravilhado com a mágica beleza do Natal!

Depois de pronta e acesa a árvore, minha mãe preparava uma bela guirlanda feita com bolas coloridas e a prendia à porta de entrada. Chegava o momento em que meu irmão e eu pedíamos ao nosso pai para escrever a cartinha pedindo os presentes para o Papai Noel e, dia após dia, ficar na expectativa de ver se mereceríamos ou não ganhar aqueles brinquedos sonhados que, geralmente acabávamos ganhando.

As ruas e as lojas também se enfeitavam nessa época e, num sábado de dezembro, íamos todos até São Paulo para vermos os enfeites e os presépios das grandes lojas (Mappin, Mesbla, Pirani, etc.). Nada era tão feérico como hoje, mas havia muita magia pelo ar. As pessoas pareciam mais alegres e as crianças mal continham suas expectativas.

Na véspera de Natal, à tarde, começavam a chegar tios, primos e até alguns poucos amigos da família. Alguns traziam pratos prontos, outros garrafas de vinho e a mesa começava a ser montada para a ceia que era o ponto alto da festa. No ar, o cheiro dos assados se espalhando pela casa e os sons de risos e de conversas variadas, que se cruzavam e descruzavam, numa algazarra gostosa e de muita alegria. A criançada corria por todos os cantos, brincando, gritando, rindo, às vezes brigando e logo voltando a “ficar de bem”, pois era Natal e ninguém podia ficar “de mal” com ninguém nesse dia.

Quando era dado o sinal, geralmente pela minha avó, todos ocupavam seus lugares em volta da mesa engrandecida com o acréscimo de outra mesa e até de algumas tábuas, mas devidamente coberta por enormes toalhas coloridas e repleta das iguarias da época. À sua volta, todas as cadeiras da casa e alguns bancos, que eram tábuas sobre dois ou três bancos para caberem todos sentados. Ninguém se lembrava de que nessa data se comemorava o aniversário de Jesus e nenhuma prece era feita, talvez intimamente por uma ou outra tia mais religiosa. Depois de nos fartarmos com o banquete, finalmente chegava a hora mais aguardada pela meninada! Nessa altura, alguns dos mais novos já estavam dormindo ou morrendo de sono, mas resistindo bravamente à espera do ‘grande momento”.

No canto da sala, majestosa, a Árvore de Natal com suas lâmpadas pisca-piscando, com muitas caixas embrulhadas para presente espalhadas à sua volta. Que eu me lembre, nenhum de nós jamais se perguntou como aqueles presentes apareciam por ali. Para nós, o Papai Noel entrava enquanto estávamos distraídos e, se o víssemos, como castigo ele não deixaria os nossos presentes. Isso se dava sempre por volta da meia noite e era nesse momento que as mães começavam a separar as caixas e distribuir os presentes ‘deixados’ para os seus filhos. Era uma confusão de papel rasgado e amassado, laços de fita amontoados e gritos de surpresa e prazer com os presentes g
anhos. Depois de atingido o ponto máximo da festa, acabávamos nos rendendo ao cansaço e, embalados pela felicidade, nos entregávamos ao sono profundo para, no dia seguinte, brincarmos com nossos novos brinquedos.

Não sei quando os meus tios se retiravam, pois mesmo sendo grande, a casa não comportava todos para dormir. Meus primos eram espalhados em colchões pelo chão e ficavam lá em casa. Na manhã seguinte, alguns reclamavam a ausência dos pais, mas logo os esqueciam para brincar inocentemente. Por volta da hora do almoço, todos começavam a retornar. A mesa era recomposta, as comidas eram esquentadas e o banquete recomeçava. Era no almoço que um ou outro tio, uma vez meu pai, abusavam um pouco do vinho e acabava saindo um ligeiro bate-boca logo abafado pelos outros e, nada que uma boa soneca espalhados pelos aposentos da casa, não fizesse esquecer e tudo voltar às boas para o jantar, ainda feito com a reciclagem da ceia.

Por Zeca Paes Guedes

10 comentários:

Luiz Saidenberg disse...

Que belo texto, caro Zeca. Reflete com precisão o que eram as grandes festas familiares dessa época. Quase poderia escrever o mesmo, da casa de Tia Zilda, defronte ao então Cine S. Pedro.
A situação toda era muito parecida, como contei em Natal de 52. Os enfeites, os presentes, a árvore, o cheiro de pinho, as bolas de vidrilho, os bate bocas dos tios...belos Natais de outros tempos! Abraços.

Soninha disse...

Olá, Zeca!

Que gratas recordações!
Até senti o aroma dos quitutes das festas de final de ano...hummmmm!
Está chegando, né?!...Là vem Papai Noel... Hu huuuuuu...ou...ho ho ho...
Mas, seu texto fez meus olhos brilharem...de saudade...de alegria...de vontades...Principalmente de saude, com certeza. Saudade dos natais em família, de minha infância distante, de minha adolescência, da mocidade...da infância de meus filhos...nossa!
Ah, Zeca! Que magia maravilhosa os textos provocam em nós! As recordações de todos os autores são nossas também...
Obrigada, amigo!
Muita paz!

Soninha disse...

Oie...

Em tempo...eu quis dizer "principalmente de saudade"...
Perdoe-me.

Mais paz!

Miguel S. G. Chammas disse...

Natal!
Que coisa boa é festeja-lo.
Acredito que todas as festas de Natal de antigamente eram assim, pelo menos as de minha família eram e ainda são.
Eu, mantendo a tradição ainda as faço assim: família reunida, agregados idem, arvore de natal e tudo o que se tem direito.
Fui, inclusive, durante umas duas decadas, o Papai Noel da família, gtotalmente vestido e caracterizado.
Hoje mais cansado, fico apenas "urubuservando" os que tentam, sem muito sucesso (desculpem a modéstia) me substituir.
Mas a festa continua e só é empanada, para mim, quando a lembrança do adeus de Da. Terezinha me vem à mente.
Ela foi se encontrar com o aniversariante, numa tarde de 25 de Dezembro.

Arthur Miranda disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Arthur Miranda disse...

Zeca, que delicia os Natais de antigamente. Mas aqui em casa nós temos mantido a tradição, luzes,enfeites, arvore, bolas coloridas ceia e presentes. O ano passado então o mês de Dezembro para nós foi especial, tivemos ao nosso lado quase o dia inteiro muitos Papais Noeis que foi a presença da turma de escritores do SPMC e do atual Memórias de Sampa. Para nós aqui em casa, um grande presente.
Afinal para mim Natal é exatamente isso, estar lado a lado com os irmãos.
E SE O NATAL É UMA FESTA SADIA
VAMOS COMEMORAR O NASCIMENTO DE CRISTO TODO O DIA. Parabéns por mais um passeio literário, gostoso de ler e recordar.

Wilson Natale disse...

Guedes, falando do seu, você fala do meu Natal. Crianças que éramos, importava-nos a chegada dos primos, a alegria de abrir-mos juntos os presentes que Papai Noel nos havia deixado. E o seu texto remeteu-me às lebrãnças da espera ansiosa dos lindos cartões de Boas-festas que recebíamos pelos Correios e às lembraças dos nossos pais e tios, todos bem vestidos, nos colocando para dormir, e, como todo o ano, indo à Missa do Galo. Vovó permanecia conosco e contava lindas histórias...
Obrigado por trazer-me de volta os sons, as vozes e o cheiro dessas noites realmente felizes! E, como sou NATALE,NATAL é todos os dias da minha vida. Abração!

margarida disse...

Zeca, linda sua historia de natal. Lá em casa também fazíamos assim, apenas com uma diferença, não abríamos os presentes antes de assistir a missa do galo, que era a realizada a meia noite. Bom recordar estas doces lembranças, principalmente as da mesa farta e das brincadeiras com os primos.

Zeca disse...

CAROS AMIGOS!
Por culpa minha, este texto foi publicado antecipadamente!
Peço perdão a todos, mas ele simplesmente saiu, numa noite de recordações, quando estava ainda terminando a 2ª parte. E fui em frente. Na ânsia de enviar à nossa querida Sonia a 2ª parte destas memórias, acabei enviando também essa que fala de Natal, que havia reservado para publicação no mês de dezembro.
A Soninha também não sabe disso e, é a ela que peço, em primeiro lugar, perdão pela gafe!
Mas tudo o que é feito com amor no coração acaba ficando bom, não é mesmo? Então, por que não falar no Natal nesta época de eleições?! Serve para amenizar nossas angústias, nossas dúvidas, nossas expectativas.
Então, que seja Natal! E quando ele chegar realmente, comemoraremos de novo!
Grande abraço a todos.

Nelson de Assis disse...

Eita 'viagem' pai d'égua de boa...
Quantas saudades dos natais de antigamente com as tradicionais 'cestas de natal' Columbos ou Amaral. Eram festas bem diferentes das de hoje onde, as famílias se reuniam vindas de todas as partes. Presentes, comilança à vontade, alegrias e muita festa até a virada do ano.
Foi-se esse tempo e quem ainda consegue manter essa tradição, encontra um concorrente sagaz: a carestia comercial.

Abraços