quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Brincando de nosso Brasil

texto de Ewerton Neto
Adaptação de Arthur Miranda



Em nossa terra tem brincadeiras
que todo mundo conhece.

Tem pião, tem bolinha, tem dadinho.
Tem carnaval e confete, tem dama,
Tem palitinhos esse então ninguém esquece.
Porém, o nosso melhor brinquedo,
o melhor brinquedo que existe,
o mais conhecido por todos,
e não importa a idade,
é brincar de Nosso Brasil.
É fácil de se brincar,
quase todos se divertem.
E o pobre só pode participar
como peças, obviamente.
Parece-se com o Xadrez,
também tem rei, rainha,
bispo, cavalo e peão.
Nele também, o Rei vale mais
que a rainha , a rainha
Mais que o Bispo, o bispo mais
que o cavalo e o cavalo mais
que o peão.
Pois como já dizia um nosso falecido
Presidente (do qual alguns filhos... da Pátria,
é claro ), tem saudades:
O cavalo cheira muito melhor que nosso povo.
A diferença é que, nesse jogo,
as peças são vivas e os peões
estão sempre morrendo.
Uns, morrem de desemprego
Outros, de apatia; muitos de ignorância,
Outros, sem hospitais,
ou então de juros altos .
Porém, a grande maioria,
morre de fome e doenças
por toda a periferia.
Assim sendo, é fácil distinguir o peão.
Porém, as peças maiores, também as mais

importantes, com mais força nas decisões,
nem sempre são reconhecidas com muita facilidade.
É muito difícil saber-se quem é cavalo,
bispo, torre ou rainha, porque todos são
muito parecidos e usam as mesmas artimanhas;
brigam o tempo todo mas, no finalzinho do jogo,
acabam mesmo dando as mãos.
Tanto é assim que, certo Bispo, Mais cedo
do que esperava, ganhou num joguinho desses
a posse de uma TV.
Em Nosso Brasil, pra vencer ,
a coisa mais importante é fazer
uso da lei de Gerson:
Levar vantagem em tudo.
Por esta razão, a tática mais usada
é mudar as regras do jogo
a todo o momento,
em beneficio próprio.
Por exemplo: para liquidar o maior número
de peões com apenas uma jogada, basta pagar
o salário mínimo, não registrar a carteira
profissional, não dar aumento aos aposentados
e votar um grande aumento
ao salário dos Cavalos, Bispos, Torres, Reis,
e Rainhas.
Ou então, superfaturar os preços dos remédios,
isso mata qualquer peão.
O que faz essa brincadeira
tornar-se fantástica e irresistível,
é ver como é fácil liquidar os peões.
Porque o Nosso Brasil é um jogo,
em que quanto mais peões
se lascarem para sustentarem os cavalos,
as torres, os reis e rainhas, mais fortes
e imbatíveis eles serão.
A pequena diferença deste jogo com o
Xadrez tradicional, é que nesse, não se
ganha dando Xeque - mate , mas só com
cheques sem fundos .
E o peão paga a conta .
O Nosso Brasil é um jogo
em que, para se sair vencedor,

precisa-se menos de técnica
e muito de esperteza.
Existem várias hipóteses para
ganhar, nenhuma delas, porém,
ensinadas em bancos da escola,
mas, com toda a certeza, ensinadas
nas escolas dos Bancos.
É um jogo divertido e tem a garantia
de que os corruptos vencedores
por mais que se envolvam em falcatruas,
jamais conheceram um autêntico Xadrez,
pois contam com imunidades parlamentares.

texto de Ewerton Neto
Adaptação de Arthur Miranda.

7 comentários:

Luiz Saidenberg disse...

Muito legal, Tutu. Bela transcrição. É o nosso Brasilzinho: o que vale mesmo é a lei do Gerson.
De resto, a Lei...ora, a Lei ! Abraços.

Zeca disse...

Muito bom, Arthur!
E esse jogo, tão bem retratado nesse belo texto, está sendo jogado exatamente neste momento, embora todos nós saibamos, de antemão, que a "Rainha" sairá vencedora, pois o "Rei" utiliza todo o seu poder de convencimento, arrebanhando votos e mais votos do pobre povo que, sem conhecimento claro das regras do jogo, segue sempre o "Grande Líder" que, ao invés de governar, sai por aí gastando o nosso dinheiro, fazendo palanques e discursos para garantir não só a posse da sua "Rainha", mas com ela, garantir que seus sequazes, bispos e cavalos, tenham garantidas todas as suas mamatas e a impunidade dos seus crimes. Os peões? Ora, os peões! Para eles, futebol e mentiras, que já está muito bom"
Abraços.

Laruccia disse...

Maneira alegre de se mostrar uma coisa triste. É divertido de se ler mas, traz em seu conteúdo a amarga realidade da nossa situação. Pelo menos no xadres, as figuras são simbólicas e antigas mas, sempre refletem algo da atualidade atual.

Wilson Natale disse...

Arthur,
Gostei desse panorama bem humorado do Brasil de ontem, hoje e... provavelmente de amanhã.
Já diz o ditado antigo: "É rindo que se castiga a moral e os costumes".
Pena que poucas são as pessoas que tiram proveito dessas denúncias e tentam fazer desse país algo menos pior. Pois fazer algo melhor, vai demorar muito tempo. Sim, porque não adianta mudar tudo se a mentalidade não muda.
Abração
Natale

Soninha disse...

Olá, Arthur!

O Ewerton estava inspirado quando escreveu isto...E você também, meu amigo!
Mas, o brasileiro consegue até brincar com suas desgraças...
Bom seria se já pudéssemos desfrutar de mais compreensão, mais igualdade, mais justiça social, não é mesmo?!
Bom seria se nosso líderes pudessem ter esta consciência também. Governar com sabedoria e justiça.
Um dia chegaremos lá. Precisamos praticar a democracia verdadeira e nos educar para podermos modificar a situação, construindo um Brasil e um mundo melhores.
Valeu!
Obrigada.
Muita paz!

Miguel S. G. Chammas disse...

Obrigado Tutu por tamanho tapa na cara. Esse texto por vc adaptado é o retrato vivo de Nosso Brasil.
Quem me dera poder assistir alguem desmanchar esse tabuleiro e jogar todas as pedras no fundo de um poço (como os do texto do Mario) bem profundo.
Valeu!

Modesto disse...

Desculpem pela escorregada: "atualidade atual". Deus me livre, que vergonha.
Laruccia