quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Pra ver a banda passar

Imagem: carnaval da Av. Tiradentes, antes do Sambódromo

Não sou de Carnaval. Fora os bailes da infância, a que íamos levados pelos pais, em clubes locais, regados a lança perfume, confete e serpentina, fora o desfile que víamos da sacada do Clube Cultura Artística, em Campinas, com bumba meu bois e fanfarra, a folia coletiva nunca me entusiasmou.
Fora os dois anos que passamos no Rio de Janeiro, - e ali não se pode escapar aos ritos de Momo- dos grandes desfiles de blocos não oficiais na Av. Rio Branco até um humilde bando de moradores descendo, com bateria e muita ginga a R. Jardim Botânico, um senhor já idoso sem camisa e sacudindo a pança num ritmo insensato, totalmente fora deste também pouco sensato mundo. Depara-se com a folia a cada esquina. Pura, espontânea, pouco tendo a ver com os milionários desfiles globelezais da Marquês de Sapucaí.
Mas, como disse, não entendo esta louca alegria generalizada , a multidão desvairada. Minhas alegrias e paixões, embora intensas, relacionam-se muito mais com experiências pessoais, mais íntimas.
Nos anos em que tivemos casa no litoral, íamos para lá, sem nada ver ou ouvir de Carnaval, e voltávamos após a folia acabada. Nada de desfiles de grandes escolas, siliconadas cabrochas de destaque, porta estandartes e mestres salas. Até hoje é assim, e o famoso Carnaval apenas uma ilusão estranha e distante. Costumava dizer que, para mim, Carnaval é todo dia. A festa iniciando-se toda manhã e só extinguindo-se à noite.
Agora, nem mais ao litoral vamos; multidões de carros descendo a serra, sujeitos a arrastões e horas de congestionamento, para encontrar lá embaixo a continuação desse tumulto insano. O mesmo aconteceu este ano. Enquanto a farra explodia nos sambódromos, ficamos por aqui mesmo, em São Paulo, recolhidos, fazendo nossos passeios pelo bosque vizinho, vendo um bom filme à tarde.
Foi então que a banda passou. Pelo bairro calmo, em parte deserto pela ausência dos moradores viajantes, na tarde do sábado. Estridente, alegre, mas podia-se adivinhar que modesta, humilde, simples, inocente em suas raízes.
A alegria espontânea, como nos velhos tempos. Saí do sossego do lar para conferir. Na rua de trás, umas poucas dezenas de pessoas, todas locais, mães com crianças, alguns fantasiados modestamente, um ou outro mascarado, e a bandinha, a “furiosa”, como já se disse, tocando furiosamente. Um dos foliões ostentando um estandarte verde, no qual se lia Brooklyn.
Em plena rua, toda coberta de confete e serpentina, surpreendendo com sua alegria os poucos motoristas que passavam. E aí sim, as emoções que não senti nos Carnavais passados reclamaram sua quota. Uma banda passando.
No bairro tranquilo, na rua deserta, na tarde morta, com nuvens ameaçadoras de chuva como pano de fundo. Não era alucinação: eu vi mesmo a banda passar, tocando coisas de amor. Nem tudo está perdido, neste mundo.


Por Luiz Saidenberg

4 comentários:

Memórias de Sampa disse...

Olá, Luiz!

Bacana lembrar dos velhos e novos carnavais. Seu texto ficou muito bom!
Eu, particularmente, não gosto muito do carnaval também. Gosto do lado cultural e folclórico, de sua história, etc...
Prefiro descansar num lugar menos tumultuado e, vez ou outra, ver alguma coisa pela TV.
Lendo seu texto, lembrei de quando eu era pequenina, junto com meus irmãos, meu pai nos levava na Av. Tiradentes para ver os desfiles de escolas de samba... Até dormíamos nas arquibancadas, pois não aguentávamos ficar vendo o tempo todo... kkkkkk
Por isso, escolhi uma imagem de desfile na Tiradentes, ok?
Obrigada.
Muita paz!

Sonia Astrauskas

MIGUEL cHAMMAS disse...

Luiz, ao contrário de você, me considero um eterno carnavalesco, hoje, com o avanço da idade, não mais me sinto desejoso de um bom baile carnavalesco de outrora, mas continuo na torcida por minhas escolas do coração (Vai-Vai em Sampa e Mangueira no Rio de Janeiro), atravesso as madrugadas assistindo os desfiles pela TV, assisto e vibro com as apurações, enfim, hoje pulo o carnaval como posso.
Mesmo assim, curti teu texto cheio de lembranças e constatações deliciosas. Foi bom relembrar os velhos carnavais e saber que a bando continua passando.
Fiquei com gosto de quero mais.....

Unknown disse...

Oi Luiz, fui acostumada ao carnaval de rua, lá no bairro da Penha. Não era banda , mas muitos blocos que desfilavam pelas ruas do bairro. Sem contar que meu pai fazia uma pequena , mas gostosa comemoração do carnaval. Tinha auto falante, serpentina, confetes, as tradicionais marchinhas e toda criançada podia se dirvetir de graça, era na rua de casa e durante a tarde. Agora ver a banda passar cantando coisas de amor, deve ter sido bom demais.

LEONELLO TESSER (nelinho) disse...

Luiz, tomara que no próximo carnaval essa simpática bandinha volte a passar entoando suas músicas alegres e descontraídas para os moradores do bairro. Eu já fui fâ do carnaval, até cheguei a frequentar bailes, hoje sou um mero espectador dos desfiles de escolas de samba.