Existem memórias teimosas, que persistem em nossa mente. Não ocorrem
frequentemente, mas quando passamos por certo lugar, elas reaparecem. Uma marca
do passado, reavivada de passagem. Foi assim com aquela igreja.
Devia ser uma igreja muito marcante, para se fixar assim na
memória.
Como e porque? Foi na infância. Creio que vínhamos de Campinas pela
Viação Cometa, e, na subida da Lapa de Baixo, havia uma agenciazinha, talvez um
ponto de parada dos ônibus.
Toda vez que ali passei lembrava disto, apesar de não compreender
porque parávamos ali. Vínhamos pela velha Via Anhanguera, e ao chegar a São
Paulo já começava a acontecer o extraordinário. Não sei como, o ônibus vinha
pela Av. Raimundo Pereira de Magalhães, após o Tietê. Já era estranho, como é,
até hoje. Depois de um trecho meio descampado, entrava em São Paulo... Pela
porta dos fundos!
Uma passagem estreita, sob os trilhos da estrada de ferro, cercada de
pedras tomadas de húmus e trepadeiras, como a entrada de uma caverna. Passagem
para um só veículo, então era... E assim ainda é necessário esperar o semáforo
abrir.
Calma, já estamos perto da tal igreja. Parava-se na tal agência de
ônibus, e com direito a uma circulada pelas redondezas. Foi aí que avistei a
igreja, que mais me pareceu um pagode, tão diferentes eram suas formas.
Passaram-se décadas, mas eu me questionava: ainda existiria? Toda vez
que por ali passava, o que acontecia raramente, lembrava-me de quando a vi, de
longe, e tentava vislumbrá-la. Mas, que nada.
Foi aí que Ana Maria Mortari postou sua foto, no Facebook. Reconheci-a
de imediato, após talvez mais de sessenta anos passados. E tratei de pesquisar;
era, antigamente, a Igreja Húngara, daí o inusitado de suas torres, com seus
toques de castelo da Transilvânia, dos Montes Cárpatos, da Mongólia, sei lá.
Por isto havia pensado, na primeira vez, num pagode chinês.
Como não podia deixar de ser, fui visitá-la no aniversário da cidade. De
longe, seus ângulos agudos cortavam o espaço vazio, em nada se parecendo com o
resto da vizinhança, que por sinal, acho que não mudou muito também, desde
minha infância. Era isto que tanto me impressionou. Esses cortes bruscos,
combinados com uma varanda de madeira e um galo no alto de uma das torres são
mesmo notáveis, embora a igreja seja bastante pequena e simples.
Atualmente, é Igreja Presbiteriana Independente, e se mantém ativa, com
uma série de ações beneficentes. Aí está, mais um mistério de São Paulo
resolvido, e graças à Internet, que colocou todos à nossa disposição. É só
pesquisar e lá vem essa igreja, o Cine Santa Cecilia, a Mansão Mormanno.
De Volta Para o Passado, outra vez.
Por Luiz Saidenberg
4 comentários:
Olá, Saidenberg!
Muita alegria tê-lo de volta nas páginas de nosso querido blog, trazendo-nos suas histórias vividas na querida cidade de São Paulo.
Realmente, uma igreja diferente e marcante dentro desta multicultura inserida na cidade de São Paulo.
Um mergulho em seu passado e nas tradições paulistanas.
Muito bacana.
Obrigada.
Muita paz!
Sonia Astrauskas
Essa "caverna secreta" a que você se refere, também está viva na minha lembrança até agora. Passávamos por ela de ônibus, mas no sentido contrário, indo da Lapa para a Vila Anastácio, aonde moravam alguns primos. Lá pelos idos de 1955 era um bairro preferido pelos húngaros, daí o surgimento da Igreja (ou, ao contrário, a razão dos húngaros irem para lá)!
Gostei dessa viagem para o passado, que você tão lindamente me proporcionou. Obrigadão!!
Finalmente caro amigo Luiz você está de volta! eu conheço essa igreja, mas faz tempo que não passo por ela, parabéns pélo texto.
Muito obrigado, amigos.
Continuo na pesquisa de locais curiosos, que sobraram do progresso, muitas vezes destrutivo, de nossa cidade.
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