quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Memórias de um dedo médio



A época pode ser situada entre os anos de 1955 e 1956.
O local é a Cantina da ESCOLA TÉCNICA DE COMÉRCIO FREDERICO OZANAN, situada à Praça Franklin Roosevelt, 129 – São Paulo.
Os envolvidos eram todos os alunos dos Cursos da referida escola e o proprietário da Cantina, um senhor de nome Saul que a havia comprado do antigo proprietário, o sempre querido Francisco (Chico para todos os alunos e alunas da velha escola).
Identificados os participantes vamos, enfim, aos fatos:
Éramos, todos, estudantes dos cursos de Técnico de Contabilidade ou Secretariado, com idade entre 14 e 19 anos, ávidos por alguma notícia que nos fizesse rir ou bagunçar durante os intervalos das aulas.
Quando a Cantina era ainda de propriedade do Chico, tínhamos uma válvula de escape muito boa.
Ele, diariamente, expunha uma gravura do “Amigo da Onça” (figura criada pelo cartunista Péricles e publicada na revista semanal “O Cruzeiro”).
A piada do dia tinha sempre uma alusão a um aluno ou aluna e causava verdadeiro reboliço entre todos. Comentários e piadinhas tomavam conta de todas as rodinhas e faziam o tempo passar mais depressa.
Quando a cantina foi vendida para o Saul (nunca consegui decifrar a sua nacionalidade, para mim, era uma mistura de português e qualquer outra raça europeia).
Ele tinha uma figura bastante estranha, era mal-humorado, resmungão e bastante pão duro. Fazia questão de não ser simpático e não admitia qualquer tipo de pendura. Ficava uma fera se alguém pedisse fiado.
Tinha mesmo um aspecto esquisito, um tanto quanto de não muito asseio.
Definitivamente, não caiu no agrado da classe estudantil e não conseguiu se enturmar com nenhum dos grupos líderes da escola.
Nós os alunos, vivíamos na vigília constante para flagrar qualquer gesto, ato ou derrapada do dito cujo para contar a todos e, assim, justificar os risos e chacotas da hora do recreio.
Na época, os refrigerantes tinham uma versão menor que era um sucesso no público estudantil.
Eram o Guaraná Caçulinha, a Coca-Cola pequena, etc.
Devido a grande aceitação, os estabelecimentos comerciais, inclusive a Cantina da Escola, tinha um significativo estoque desses vasilhames.
Um belo dia, eis que o Saul lança uma novidade na Cantina.
Era uma delícia bastante supimpa, Leite com Groselha, embalada em garrafinhas de Coca-Cola e produzida na própria cantina.
A novidade caiu imediatamente no gosto de todos, e no recreio seu consumo era bastante acentuado, mesmo por que o custo era menor que o de um refrigerante e, lógico, era muito mais saudável.
Um dia o sucesso da beberagem caiu em descrédito e, em pouco tempo estava fadado ao esquecimento.
O motivo deste descrédito foi que alguém, em algum momento não registrado no tempo, constatou que o velho Saul preparava o tal Leite com Groselha despejando os ingredientes em cada uma das garrafinhas e, para misturar, enfiava seu dedo médio, sem qualquer tipo de asseio, no gargalo de cada garrafinha e balançava-a antes de colocá-la na conservadora.
A notícia se espalhou como vento e causou nojo em todos os alunos.
Até hoje, só tomo Leite com Groselha se eu mesmo promover a mistura.
Arre égua! Como diriam meus amigos nordestinos.


Por Miguel Chammas

4 comentários:

Memórias de Sampa disse...

Olá, Miguel!

Eu adorava o guaraná Antártica, aliás, é o meu preferido até hoje. E ficava feliz quando meu pai nos dava a garrafinha caçulinha para cada um de nós... Nos dava autonomia. Um refrigerante só para nós, sem ter que dividir com ninguém. Nos tempos de escola, também saboreava a coca-cola na versão garrafa pequena.
E o tal leite com groselha de sua escola? Vixe! Eu, heim!
Leite com groselha só em casa e muito bem preparadinho, com toda a higiene necessária.
Muita paz!

Sonia Astrauskas

Wilson Colocero disse...

Nunca fui muito de frequentar a cantina da escola (l'argent era curts), mas às vezes pedia um "refresco de groselha", só que depois, com a mudança do dono (agora é que você me relembrou), o refresco passou a ser "lembranças da groselha", e aí o Saul perdeu mais um freguês! Valeu pela lembrança e pelos bons momentos de "teletransporte" ao querido Ozanam!

Teresa disse...

Eu não frequentava a cantina da escola pelos mesmos motivos do Wilson; aliás, se me perguntarem onde ficava, não sei dizer. Gostava de leite com groselha, mas feito em casa, pois não podia me dar ao luxo de tomá-lo fora. Levava lanche de casa que era comido a seco. Saía da escola às 11:30, direto para o trabalho na rua XV de Novembro, a pé e, quando dava, um cachorro quente na Salada Paulista com um guaraná caçula.

Nelinho disse...

Pois é Miguel, se nós formos visitar a cozinha de alguns restaurantes com certeza vamos deixar de comer fóra por um bom tempo, principalmente no bairro chinês da Liberdade! kkkk.