Estou
no clímax do fechamento de uma partida de tranca. Sim tranca, aquele jogo
derivado do buraco, no qual o três preto tranca o jogo e cada um coloca suas
regras que são contratadas no início da partida, do tipo: Não vale lavadeira,
morrer com três preto na mão perde 100 pontos cada, e outras mais. Em nossa
turma o jogo é o mais simples possível, vale tudo, até roubar se for bem feito
e não descoberto.
Desculpe-me,
vamos retornar ao tema. Minha vez de comprar bastava um coringa ou um seis de
espada e eu e meu parceiro João Magro mataríamos a partida com mais de 500
pontos de vantagem sobre nossas queridas parceiras a Paula e a Alice.
Comprei
a carta e, antes mesmos de olhar qual era, sinto algo estranho escorrer por
minha testa, vindo parar no bigode. Foi uma gargalhada em coro por parte dos
parceiros. Passei a mão e pude contemplar um liquido espesso esverdeado e de um
aroma fétido. Lentamente levantei o olhar para verificar a origem do mesmo. Foi
difícil acreditar, era a cagada de um morcego. Isto mesmo, de um morcego.
Nossa
mesa de jogo fica na varanda dos fundos da casa em Bertioga e, acima da mesa,
pendurado na viga de sustentação da cobertura, a nossa caseira Marilene colocou
um bebedouro para atrair os beija-flores que por lá são inúmeros, de diferentes
tamanhos e cores.
Acontece
que durante a noite este líquido, que é uma mistura de agua com açúcar, atrai
os morcegos e este nosso amigo mal educado já estava viciado em vir servir-se
deste néctar colocado à disposição de forma fácil e abundante.
Imediatamente
eu, pródigo em travessuras e com o ego ferido pelo bicho ter cagado em minha
cabeça, tracei um plano de vingança. Retirei o bebedouro do arame que o sustentava
pendurado na viga. Fui para a cozinha e o lavei bem e preparei novo néctar, porém
desta vez a fórmula era cachaça com açúcar. Voltei para a mesa e comentei com o
pessoal que, depois de ter aprontado aquela comigo, o visitante deveria ser
premiado com uma nova água fresca e limpa.
Recomposto,
reiniciamos o jogo; e eu não peguei nenhuma das cartas esperadas e ainda por
cima tive que dispensar uma carta colocada que foi a canastra dos adversários. O
jogo continuou e por fim eu, que já estava cagado, e meu parceiro João,
acabamos perdendo aquela mão e ainda dando uma ré de trezentos pontos o que
recolocou as duas novamente na partida.
Agora o
jogo certamente iria se estender por mais algumas horas.
Nossa
anfitriã, Alice, refez o refil de cerveja gelada, azeitonas e amendoins e, ao
iniciarmos a partida, recebemos a visita do nosso amigo cagão.
Ele
chegou voando rasante por sobre o muro dos fundos e, com uma manobra digna da
esquadrilha da fumaça, orientado por seu infalível sonar radar, pendurou-se de
cabeça para baixo no bebedouro de onde sorveu um longo trago antes de
retirar-se em nova manobra acrobática com um maravilhoso looping e desapareceu por
sobre o telhado da casinha dos fundos.
Jogo
reiniciado, cartas distribuídas e lá vem ele novamente com tudo no bebedouro.
Alice exclama:
–
Marcão ele gostou da nova agua que você colocou, deve estar mais docinha que a
anterior. Não respondi, apenas balancei a cabeça de forma afirmativa e fiquei
com um olho concentrado no jogo e outro no morcego.
Acabamos
de ganhar esta rodada com uma atuação brilhante de meu parceiro o João que
estava mais concentrado e foi por poucos pontos de diferença. Este resultado nos
aproximava do final da partida, quando ele retornou, agora acompanhado por um
amigo de copo e de bar. O amigo pendurou-se na viga enquanto o cachaceiro foi
direto ao copo, quero dizer ao bebedouro. Nesta oportunidade sugou um longo
trago e pude ver o nível da “Água” baixar rapidamente. Após o trago ele
desprendeu um dos pés do bebedouro e ficou pendurado com apenas uma das pernas.
Olhou com os olhos arregalados para mim, soltou a perna que o prendia ao
bebedouro, ligou o sonar radar e disparou em um voo em parafuso batendo de cara
no muro branco entre nossa casa e a do vizinho. Seu companheiro saiu da viga e
foi até o chão na beira do muro para ver o real estado do amigo, porém nada
podendo fazer neste caso e sem compreender o que ocorria partiu e desapareceu
no negrume da noite.
Estabeleceu-se
então uma enorme gritaria por parte das mulheres que indignadas me acusaram de
ter envenenado a água dos passarinhos. Assim que elas deram um tempo pude explicar
que não havia envenenado a água, apenas tinha colocado no bebedouro uma água
que passarinho não bebe.
Peguei
o Morcego cagão e pude constatar que estava vivo, apenas estava chapado. Com
cuidado coloquei-o sobre o muro para que a bebedeira passasse e então pudesse
retornar seguro à sua morada.
Passadas
algumas horas percebemos que ele não estava mais sobre o muro. Não sei se levantou
voo ou simplesmente caiu do lado do vizinho.
O jogo
não terminou. Indignadas por minha atitude a Alice e a Paula negaram-se a
continuar a partida decretando a nossa derrota pelo ocorrido.
Perdi o
jogo, mas não poderia deixar o cara defecar na minha cabeça e sair impune.
Depois
deste episódio abolimos a prática de colocar bebedouros para pássaros em casa.
Por
Marcos Falcon
5 comentários:
Olá, Falcon!
Há quanto tempo, heim?!
Que situação! Levar uma cagada de pombos ou pássaros é, até, normal... Mas, de morcego??? kkkkkkkk
A vingança foi boa, embora eu ache que o bicho gostou muito da água que passarinho não bebe.
Valeu.
Feliz 2014!
Muita paz!
Obrigado Soninha um 2014 lindão para vocês
Falcon
Falcon,adoro ler suas historias que sempre me alegram e me faz rir de montão. Nunca imaginei que alguém faria isso com um pequenino morcego...rsrs, mesmo que ele seja ladrão de bebida do beija-flor.Adorei sua historia, um beijo e feliz ano novo pra toda sua família.
FALCON, que maldade!
Afinal todo mundo sabe que os morcegos são os ratos bonzinhos que viraram anjos.
Já que você tinha dado um fogo no coitado, devia segurá-lo no chão e cagado em cima dele! Ahahahahahahahahahaaaaaaaaaaaaaa!
Valeu! Adorei!
Abração,
Natale
De tanto ser perseguido por "falcões", o filhote do "Bat-man", na primeira oportunidade, se vingou de um Falcon.
Espero que vc tenha servido pelo menos, de alambique confiável.
Gostei de sua crônica, Marcão, parabéns.
Modesto
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