(O texto é uma comentário do autor numa postagem de Teresa Fiore no Facebook)
Era uma
escola de comércio.
Estudávamos à noite, porque trabalhávamos durante o dia.
Tínhamos teatro, fanfarra, jogral e jornal, tínhamos atividades externas,
jogávamos vôlei aos sábados à tarde e domingos pela manhã.
Tínhamos professores que sentavam ao nosso lado e compartilhavam nossos pedaços
de frango, bolo, tudo que vocês faziam e dividiam nossas batidas, nossos
coquetéis, nossas cervejas. Compartilhavam nosso ideal e nos transmitiam os
deles. Éramos moldados da forma mais sutil que um ser humano pode ser forjado.
Passaram por nós e nós por eles como se fossemos uma massa só.
Tínhamos amigos que desmarcavam compromissos para assumir outros juntos com a
gente, amigos que se enamoraram, que ficaram juntos, que se separaram, amigos
que estão sempre com a gente, mesmo aqueles que já se foram.
E já se foram tantos.
Era uma escola de comércio.
Gente simples, com seus vestidos mais aprumados, com seus ternos já muito
surrados. Alguns vinham até com a marmita vazia dentro da pasta, pois para muitos,
o almoçar fora estava além do horizonte, além de qualquer possibilidade. A
mensalidade às vezes atrasava e os responsáveis pela escola, fingiam não
perceber isto e a gente ia levando como podia. Muitas vezes, o almoço (ou
possivelmente o jantar) era a mortadela do bar do Miguel. Tínhamos amigos que
nos eram tão caros e que nós, como tão humanos que somos, erramos em não colocá-los
numa redoma e protegê-los dos desencontros da vida.
Mas, acho que isso nem eles iriam querer.
Era uma escola de comércio.
Hoje, perdida entre a estrutura de um prédio recém acabado, repousa uma alma
sublime. Mais ainda, repousam energias de todos nós que por lá passamos. Ninguém,
em sã consciência, vai entender que nas entranhas daquele edifício existe um
pedaço do tudo que passamos na vida. Passo por lá e silenciosamente relembro
quase tudo que lá vivi. Pouco fiz nesta jornada. Fui um aprendiz de aprendiz
que hoje, desgraçadamente, choca quem nunca viu ou ouviu tudo aquilo que
passamos.
Somos antigos; saudosistas; retrógrados, mas serei e ostentarei todos os
adjetivos que me forem imputados porque um dia eu vivi aqueles incomensuráveis
anos doirados.
Escrevo hoje este pequeno texto depois de uns dois ou três anos de auto exílio.
Tua mão me fez retornar a isto e contrario senso ao que imaginava quando
comecei a escrever isto, não vou chorar não.
Por José
Carlos Munhoz Navarro
7 comentários:
Olá, José Carlos!
Que bom que você voltou a escrever que é um dos seus principais talentos. Uhuuuu
Recordar é viver, efetivamente. E, que bom quando temos boas pessoas e bons acontecimentos em nossa vida para recordar.
Valeu!
Muita paz!
Sei muitas histórias de lá, contadas pelos meus pais (Roseli e Fernando) e por amigos deles que se tronaram meus amigos também.
Aquele lugar formou muita gente linda... Como é bom gente linda né?
José Carlos, feliz daquele que tem lembranças dos bons tempos e de amigos verdadeiro. Adorei o texto, que você talentoso como é, nos presenteou. Queremos mais! Um abraço
Zé meu irmão, como é bom ler o que escreves.
Teus textos são ditados pelo coração e escritos com a saudade.
Não se isole novamente, escreva mais, muito mais...
Navarro, que saudades, garoto sapeca, "despareceu" das escritas... mas, vc está aí, com encantadora narrativa sobre sua escola. Não a conheci, nem sei onde fica mas, depois de ler seu texto é como se eu fosse um 'EX". Uma crônica de sensíveis devaneios, gostoso de se ler, com particularidades ricas em detalhes. Parabéns, Navarro.
Modesto
Navarro, que bom que você tem suas lembranças e hoje pode contar um pouquinho para todos nós um tempo bem vivido. Meus Parabéns.
Navarro! Finalmente você retorna com seus textos maravilhosos, permita-me não concordar quando você diz que "pouco fez", pelo contrário, você fez (e faz) muito ao relembrar momentos felizes de um tempo que não volta mais, você saíu do "exílio", o bom filho à casa torna! abraços, Nelinhio.
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