Zumbidos, em nossa cidade, existem muitos. Ela zumbe, ronca, resfolega, rosna, geme, uiva em suas entranhas metálicas ou de concreto armado. Às vezes, o zumbir também pode vir de dentro, de nós mesmos.
Talvez parta de um sinus, atinja o ouvido médio, acionando o estribo, o martelo, a bigorna ou outro qualquer dispositivo que esteja no caminho; que sei eu?
Mas, num dia destes, inaugurou-se em casa uma nova modalidade dezumbido, nunca ouvida antes.
Como fazemos todas as manhãs, quando ligamos o rádio na Eldorado AM, desculpem, na nova Rádio Estadão-ESPN, pois a tradicional Eldorado foi varrida para um canto da FM, o que se ouviu foi um zumbido medonho.
O barulho estridente calava qualquer estação AM, por mais espalhafatosa que fosse.
Na FM, tudo bem. Esperamos uns dias e o zumbido continuou. Durante algumas horas ainda dava uma trégua, mas, então o barulho generalizou-se. A culpa devia ser do rádio relógio, um velho e honesto GE com quinze anos de idade, pensamos. Já tinha dado umas mostras de que requeria aposentadoria, então devia ser ele mesmo.
Temos outro, pequeno e moderninho, mas, sem a sabedoria trazida pela experiência do velho GE, salta abruptamente de estação, explode ou extingue o volume sem gradações, ao mínimo toque.
Tentamos, portanto, salvar o veterano aparelho. Levei-o a um japonês, com oficina aqui perto.
Com má vontade, o oriental nem testou o rádio.
- Hummm, não adianta consertar. Nem mais peças se encontram para este!
Que fazer? Não havia mais jeito e nem sentido levá-lo de volta para casa. Deixei-o na primeira caçamba que encontrei, das muitas que infestam o bairro do Brooklin.
Instalamos, então, o novo radinho e, pasmem, o zumbido AM persistia!
Pobre velho GE, tinha sido sacrificado injustamente. Ainda corri até a caçamba, mas, era muito tarde. Chequei as estações no rádio do carro, na garagem. Tudo normal. Que é então, que interfere em nossa fiação doméstica para sufocar a AM?
Obras, brocas, moto serras, nunca faltaram no Brooklin Novo, desde que estamos aqui.
Por que, só agora, este tipo de interferência, mais de vinte anos depois?
Uma nova e poderosa engenhoca, recém inventada, pós ponte estaiada, fazendo sua incômoda estréia?
Ou os marcianos, agindo subterraneamente, construindo terríveis máquinas de destruição em massa... Para, como num conto de H.G. Wells, um belo dia aflorarem à superfície com seus terríveis tripés ambulantes?
Ou, talvez um novo espigão, que é o que mais se vê por aqui, mas de última geração, gerando suas obras no subsolo, sem mostrar qualquer sinal, exceto o zumbido, para então irromper, imenso, pronto e totalmente operante, desovando já nas ruas uma nova torrente de carros?
Enquanto isso, nosso rádio, agora outro, maior e mais potente, emprestado do filho, continua a zumbir freneticamente na AM. Só que com mais e mais agudos decibéis.
Talvez seja um aviso; esteja antecipando o final dos tempos, o total colapso do Homem diante da Máquina.
Por Luiz Saidenberg
12 comentários:
Olá,Luiz!
Este texto me fez lembrar de quano mudei para São Bernardo do Campo, há 29 anos... Eu estava acostumada com as rádios que eu ouvia em Sampa, mas,em SBC não pegava quase nehuma. Era só chiado.kkk
Depois,com o passar do tempo,o alcance das rádios se expandiram e eu conseguia ouvir as rádios favoritas de Sampa.
Hoje, morando no litoral, também tento ouvir algumas rádios de Sampa e SBC e nem sempre consigo...ou melhor, consigo o velho e bom chiado. kkkkk
Muito divertido seu texto,Luiz.
Valeu!
Muita paz!
Luiz, estranha e ruidosa essa tua tragédia auricular.
O pior é que ficas sem poder deleitar-se ao som da emissora preferida.
Não te apoquente amigo, eu também sofro com um zumbido forte em meus timpanos, mas esta ha tanto tempo ali instalado que se, parasse hoje de zumbir eu sentiria sua falta.
Agora,convenhamos, ficar sem ouvir minha estação de rádio preferida, isso eu não suportaria. A rádio Bandeirantes é minha companheira nos dias e noites e, sem ela, a vida não teria o mesmo sabor.
Trate de providenciar, com urgência, o remédio para esse teu problema e depois, faça da solução um outro bem cuidado texto.
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Caramba, Saidenberg!
E a gente que mora na beira da praia e, principalmente, mais longe de São Paulo, acaba pensando que o zumbido no rádio é por conta da distância, da falta de infra estrutura na pequena cidade e por aí afora. Afinal, em pleno Brooklin, um dos mais tradicionais bairros paulistanos, também se sofre do mesmo mal!
Já experimentou ligar para a rádio e denunciar esse zumbido? Quem sabe eles tenham uma explicação!
Senão, nada mais a fazer do que o que nós, moradores do litoral, acabamos fazendo: acostumar-se com os chiados extra-terrestres!
Como sempre, mais um excelente texto!
Abraço.
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Luiz, como vai? Problemas com a recepçao das ondas hertzianas em Amplitude Modulada em seu aparelho de rádio? O que fazer? Sinceramente não sei, mas a enorme quantidade de antenas para telefonia móvel instaladas pela cidade pode ser uma das causas do tal zumbido. A potencia irradiada é tão forte que na Paulista, por exemplo, interfere nos letreiros a LEDs dos ônibus. E, parece que está interferindo também na programação em AM das rádios; poucas tem algo interessante para se ouvir...
Em todo o caso, parabéns pelo texto, meio queixoso, meio filosófico, recheado de um humor peculiar. Boa leitura, gostei.
Abraço do Ignacio
Luiz, sua historia esta zumbindo nos meus tímpanos, parece que tem grilos no meus ouvidos, justo eu que sou um bom Ouvinte, ou trinta ou quarenta, espero ainda ser um bom ouvinte depois dos oitenta. Mas para ficar com um bom AM e FM aqui em Lorena, só mesmo com o som da SKY HDTV- que alem de pegar mais de 120 canais de TV, ainda tem vários canais de musica brasileira(todos os Ritmos), tem musicas Internacionais e muitas Rádios AM e FM. Ainda bem pois aqui em Lorena nossos rádios a pilhas só pegam a Rádio Chiado ou FM Zumbido, que falam baixo em São Paulo e só cochicham para o Interior. Parabéns e abra bem os ouvidos.kkk
Saidenberg: Você não tentou segurar a antena? É só ficar segurando que a estática desaparece (risos).
Falando sério: Penso que o problema é geral. Meu rádio portátil funciona muito bem na parte de cima do meu sobrado, na parte debaixo, preciso levantar a antena telescópica. Pode?... Antes, em cima ou em baixo ele funcionava legal.
O meu moderno relógio TELEFUNKEN - ahahahaaaa - ainda funciona bem, mas poucas estações entram sem estática,hoje em dia.
É tanta parafernália eletrônica que vozes e músicas ficam presas no trânsito do éter.
Saudade daqueles velhos trambolhos de cabeceira que funcionavam em ondas curtas, médias e longas; em ondas tropicais...
Estamos em plena falência da comunicação.
Abração, Brrrrrrrrrr, twit, brrrrrrr! (desculpe a estática) brrrr, zuuuimmmmm, proffffssssss!...
Natale.
Saidenberg, acho que sou uma privilegiada, ainda não sofro com zumbidos e as maquinas desta casa estão em perfeita ordem. Zumbido mesmo vem da rua, quando venta até ou algum maluquete, na sua maquina volante, coloca o som para o bairro ouvir, aí não há como segurar tal zumbido nas portas, janelas, vidraças etc. Muito divertido seu texto.
Muito obrigado. Ruídos paulistanos são horríveis, mas creio ter a achado a solução: o negócio é escrever sobre eles.
Foi só enviar este texto, e o terrível zumbido parou, como por encanto. Agora, na Santa Paz...
Uma amiga que mora no Brooklin, onde morei por 36 anos, disse que a torre da embratel, tambem faz ruidos no radio e TV.
LuiZ, não Zombas do Zumbido pois a Zona de Zimbabue Zerou o Zangado Zé Zarrolho, Zombando do Zeferino, uZeiro e veZeiro do vaZo Zincado do Zico.
Desculpe, Saidenberg, não resisti ao abusar de seu espaço e me acomodar em dar vasão a minha curiosidade pra saber quantas vezes se usa a letra "Z" numa frase.
Sua crônica está deliciosa, divetida e vc acaba de me lembrar sobre uma ocorrência de várias dezenas de anos atrás que ocorreu comigo e que até agora ninguém me deu uma explicação cabível sobre a questão. Vou contar num próximo texto. Parabéns.
Modesto
Conte mesmo, Modesto.
Ao som de cadê Zazá...
Um velho amigo contou-me tb algo muito estranho, quando voltou a S. Paulo pela morte de sua mãe, com 96anos. Hospedou-se na velha casa dela, e por diversas vezes o rádio ligava sozinho! Tô fora! Abraços.
Seu texto me remeteu a Guimarães Rosa: "O caboclo que houve o vento bater no buritizal. O caboclo que conhece o boi pelo resfolegar da madrugada porque dizia:- NA VIDA NUNCA HÁ SILÊNCIO”.É que enquantoo caboclo caminha, racha a mamona no sertão. O calango chispa rápido, o bem-te-vi canta lá no chapadão e a planta continua nascendo, crescendo,florindo, frutificando,para a messe fantástica que ele tão pouco conhece. Adorei o seu olhar transformadoem belas palavras. Parabéns!
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