terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Memórias esfarrapadas

 
imagem: Os esfarrapados Miguel Chammas (sanfoneiro) e seus amigos
 
Estamos em janeiro de 2013, o ano acaba de começar, mas para a maioria do povo brasileiro, 2013 vai começar de verdade na quinta-feira depois do Carnaval, em plena quaresma. Até lá iremos levando os dias em banho-maria.
O verão está em plena atividade, o calor é insano, então por que iremos nos preocupar com a vida? Vamos esperar... como canta aquela modinha: “Prá quando o Carnaval chegar...”.
Dizem (mas não provam) que São Paulo não tem Carnaval, então pergunto o que aconteceu naquela segunda-feira de fevereiro do ano de 1947?
Explico: Precisamente naquele dia, um grupo de foliões de São Paulo, moradores do bairro do Bixiga, decidiu, na melhor forma de direito popularesco, organizar um bloco carnavalesco. Esse bloco que primava pela peculiaridade de não ter estatutos, diretores e demais burocráticas atitudes tão a gosto dos cultores de formalidades.
Foi ele batizado por “BLOCO DOS ESFARRAPADOS”, pois, de acordo com sua base estrutural, não defenderia cores, nem teria fantasias formais. Seria formado apenas por um grupo de foliões dispostos a desfilar pelas ruas do bairro, fantasiados, cada qual, com fantasias criadas por suas ideias, confeccionadas em papeis, em jornais, em roupas velhas ou o que mais fosse conveniente.
Ideia aprovada, saiu o bloco pela vez primeira naquela tarde de segunda-feira levando, de início, uns poucos adeptos e, entre eles, Armandinho Pugliesi (que o organizou por vários anos) a percorrer o bairro do Bixiga.
Em cada rua por onde ele passava, mais carnavalescos aderiam ,e ao final, centenas de foliões, na maioria homens, devidamente zonzos pelo desfile etílico que também se  instalara na passeata, terminavam a brincadeira já no início da noite.
Essa atividade foi se instalando no tradicionalismo do bairro e até hoje é motivo de orgulho dos moradores do Bixiga.
Eu, quando jovem e solteiro, também desfilei nesse bloco. Primava por me fantasiar com temas da época. Foram várias fantasias, de Palhaço, de Cruzeiro Novo, de Capanga/capenga, e muitas outras. Eu e os outros componentes dos Duques de Piu-Piu nos divertíamos prá valer e, lógico, bebíamos como gente grande.
O Bloco tem uma peculiaridade ímpar, permite que as pessoas com vontade de sair nele, mas sem coragem de irem ao ponto de concentração devidamente fantasiadas, esperem a passagem na porta de sua casa e, então, se incorporem à bagunça.
No meu entender, este é, realmente, o grande carnaval de rua, não requer luxo ou grandes aparatos, cada um vai do jeito que quiser e entra ou sai do bloco em qualquer lugar.
Hoje, residindo distante do meu Bixiga, tenho, por vezes, uma vontade enorme de me misturar aos componentes desse bloco, só não levando a cabo minha vontade, por saber que as pernas não mais me permitirão esse ousado desvario a transitar no carnaval.
Salve, então, o Zé Pereira que foi o primeiro “bloco de sujos”.  

Por Miguel Chammas

9 comentários:

Soninha disse...

Oieee...

Realmente, os carnavais de hoje não se comparam aos de outrora.
Aquelas folias de rua, tão alegres e simples... a população aproveitava e todos podiam se divertir.
Quanto a foto, está aí a prova de como você já foi magrinho, né?! rsss
Valeu!
Muita paz! Beijosssss

Zeca disse...

Miguel!

Tem certeza que o sanfoneiro da foto era mesmo você? Hehehe...
Eu sempre fui mais pacata, embora sempre gostasse de carnaval, mas mais para assistir, poucas vezes participei de blocos. Só que, antigamente, era tudo mais tranquilo, as pessoas se divertiam de verdade; tanto as que estavam nos blocos quanto as que assistiam a passagem e acompanhavam a folia.
Eu gostava muito de ver aquele famoso, em Santos, onde os homens se vestiam de mulher... acho que era Bloco da Dorotéia, ou algo semelhante. Você como bom folião deve conhecer, imagino.
Mas voltando ao seu relato de hoje, eu não cheguei a conhecer o Bloco dos Esfarrapados; talvez por sempre aproveitar o período de carnaval para viajar. Mas este ano, pelos motivos que já conhece, estarei mesmo em Sampa e, se tudo correr bem, talvez eu dê uma volta pelo Bixiga, praticamente aqui, em casa para ver o desfile dos farristas. Se quiser companhia, pode vir...

Abração.

Zeca disse...

Putz! Escrevi pacata! É PACATO!
Acho que me imaginei no Bloco da Dorotéia... hehehe...

Jens disse...

Este é o verdadeiro espírito do Carnaval, camarada Miguel, que infelizmente não existe mais. Quando criança organizávamos um bloco de sujo e saíamos pela rua, batucando em latas de azeite e querosene vazia. Bons e velhos tempos.

margarida disse...

Miguel, parabéns!Lembrei desta marchinha e dedico a todo Bloco do Sujo do Bixiga.

Olha o bloco de sujo,
Que não tem fantasia,
Mas que traz alegria,
Para o povo sambar,
Olha o bloco de sujo,
Vai batendo na lata,
Alegria barata,
Carnaval é pular.

Olha o bloco de sujo,
Que não tem fantasia,
Mas que traz alegria,
Para o povo sambar,
Olha o bloco de sujo,
Vai batendo na lata,
Alegria barata,
Carnaval é pular.

Plác, plac, plac,
Bate a lata,
Plac, plac, plac,
Bate a lata,
Plac, plac, plac,

Anônimo disse...

Bons tempos, heim Migué! Diversão pura namoros instantâneos, iniciações, arranca rabos, sangue de diabo, lança perfume, matinés carnavalescas no cine Espéria...
Até que vc saiu bem na foto...
Abraços do Ignacio

Laru disse...

Bela lembrança, Miguel, os carnavais de rua sempre atrairam muita gente. Agora, se quizermos formar um "Bloco de Esfarrapados", não precisamos de muita procura, em algum canto da cidade sempre se reunem "personagens" que já estão caracterizados, é só colocar um pouco de música, esta feito o desfile. Parabéns, Miguel.
Laru

Arthur Miranda disse...

Nunca fui um verdadeiro folião, mas tenho muita saudades dos carnavais do passado, dos blocos, das fantasias de marinheiro, de malandro, de cantinflas etc. Valeu Miguel.

Wilson Natale disse...

MIGUEL:

Ô abre alas, que eu quero passar!
Ô abre alas, que eu quero passar!
Eu sou da Lira, não posso negar.
Rosas de ouro é quem vai levar!...

No teu texto e comentários, um mundo de lembranças.
E, na foto, em linguagem "bixiguenta", mi istá u Migué, mais magru qui um tuberculoso! Mas, belo... Poxa qui coxa! Si vuce mi saisse vistido di mulher, num ia sai "ileso" na quarta de cinzas...Ahahahhahahaaaaa!(Ô mardade)
Nos meus tampos- anos 50, ia ver os cordões no Brás e os blocos do Bexiga.Gostava demais!
E o anônimo que comentou, trouxe à baila o Cine Espéria, que tornou-se o Teatro Bela Vista, fundado por Nídia Licia e Sérgio Cardoso e que foi, com direito a força policial, multidão, jornalistas, desapropriado e devolvido aos donos. Hoje é o Teatro Sérgio Cardoso.
Você ainda morava ao lado, quando aconteceu isso? Se estava, escreva a respeito. Foi um fato que causou escândalo em Sampa!
Abração,
Natale
PS: Vou vestir uma camisa listada e sair por aí...