sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Uma mulher dinâmica - 3ª parte


 
(O que passo a relatar é o princípio de nossa vida no Parque Continental, as duas primeiras partes foram tópicos a serem desenvolvidos, (trailer do que vou contar, tá?), procurando sempre me ater no tempo verbal do presente.
Este nosso sobradinho fica na “Quadra “B” – passagem “E” n. 33 -, (não confundir com endereço sepulcral) rua sem saída e estreita. No final de cada viela, está a área verde, intransponível, e em frente das duas últimas casas, uma defronte a outra, há um pequeno recuo pra que os autos posam fazer manobras pra sair da rua. Cada morador tem, pelo menos, um carro e, pra estacionar, põe na garagem e se deixar na porta, só com duas rodas sobre a calçada. Deu pra entender?
Nesta rua (ou passagem) ficou 5 anos de muito trabalho, iniciativas, contrariedades, mas plena de felicidade. No fim do ano de 1969, nasce nossa 5ª filha, a Mylene, (gostei do nome, Mylene Demonjeao, antiga artista do cinema Francês), o 7º membro da família com nome começando com “M”. A Myrtes, com encargos da casa, levando e despachando as crianças pras escolas. Observando outras famílias, Myrtes chamou minha atenção para um detalhe muito importante: as dificuldades que todas tinham em mandar seus filhos à escola. Como tudo que é planejamento popular, pegamos a população do Jaguaré, Vila Yara (Osasco), desprevenidas de uma infraestrutura, faltando tudo.Como eu, a grande maioria tinha seus filhos em idade escolar e as escolas da região ficavam numa distância que era longe ir a pé e perto pra uma condução, que não existia. A Myrtes logo se manifestou:
“Modesto, vou tirar a carta de motorista e vou transportar as crianças.”
Meus vencimentos estão melhorando, nossos filhos vão às escolas de Osasco, o Mauricio e o Moacyr vão ao Fernã Dias, em Pinheiros, (eles já tinham completado o primário no Romão Puiggari, no Braz). Ela ficou com aquilo na cabeça.
Um fim de semana prolongado por algum feriado, que não lembro qual, meu cunhado nos convida a passar esse fim de semana na Colônia de Férias da Caixa Econômica, onde ele trabalha, no Suarão, litoral sul. Com meu fusquinha verde-amazonas, 1967, (último modelo fabricado com a potência de 1.200) fomos com todas as crianças pra praia do Suarão.
La chegando, minha mulher logo me pediu:
“Mo, me deixe pegar o carro, aqui na praia, é mais fácil, me ensina as mudanças de marcha, os pedais e...”.
“Mimy, respondi, se algum guarda me pegar...”.
“Deixa de ser medroso; essa praia é deserta, (1969 todos usam as praias pra se locomover de uma praia a outra), e eu vou só aprender a movimentar o carro.”
Não preciso entrar em detalhes pra explicar que a insistência da minha amada, quando quer alguma coisa, sai de baixo, ela quer e está acabado. Entra no carro, e eu começo: “Dê a partida.”.
“Isso eu sei, estou do seu lado, sempre e observo.”
“Muito bem, agora pise na embreagem, engate a primeira, vai soltando a embreagem devagarzinho, e acelere um pouco”...
Na primeira arrancada, aos pulos, deu seus primeiros movimentos.
“Agora, querida mia, muito cuidado com os canais, (pequenas valetas formadas pelas águas da chuva e outras origens que, acompanhando o declive natural das praias, deságuam no mar), se parar o carro com as duas rodas, da frente ou de traz, dentro do canal, quanto mais você acelerar pra desencalhar, mais elas (as rodas) afundam. E, aí, babau, minha querida, com a subida da maré, “adios pampa mia”. Ninguém tira o carro de lá. Por isso, quando surgir um canal, acelere bastante pra passar, capicce?  Do you understand?... entendestes?... dos vidanhe nabere katushka?... salamalek?...”
“Sim, velho chato, eu vou tirar esta carta, quer você queira ou não... sei que você não acredita em mim mas, você vai ver.
“Nenhuma das minhas irmãs sabem dirigir; só a Rosália tem carta mas, nunca pegou nenhum carrinho de pipoca pra guiar e você quer dar uma de gostosa e fazer aquilo que só nós, homens, estamos em condições de fazer.”
Ouvindo isso, engatou uma “primeira” pisou no acelerador e disparou... Não precisam ser adivinhos nem ter bola de cristal pra saber onde o carro parou... Num límpido, cristalino e atraente CANAL.
Dei um berro estonteante: “Te avisei em vários idiomas pra tomar cuidado e você lá é que foi cair! Sabe quando você vai tirar essa carta de motorista? N-U-N-C-A, NUUUUUNCA, TÁ OUVINDO? NUNCA.”.
Tive que engolir tudo o que falei. Depois de 2 meses ela está com a carta na mão, dirige até hoje, a única da família (mulheres na mesma faixa) e NUNCA SOFREU UM ACIDENTE, graças a Deus. (continua)
 
Por Modesto Laruccia

6 comentários:

Soninha disse...

Olá, Modesto!

Lendo sua história, mais me convenço que o mundo é das mulheres... mulheres fortes!
Uhuuuuuu!
Beijos em Myrtes.
Muita paz!

Miguel S. G. Chammas disse...

Mô, "o peixe morre pela boca...", vc esbravejou tanto e acabou com o rabinho entre as pernas (peixe tem rabinho?).
Saiba, então, o MUNDO È DAS MULHERES!
Gostei de ler e de continuar sabendo os detalhes de sua vida.

margarida disse...

Modesto, a Myrtes é uma guerreira e determinada. Tenho certeza que ela acredita que tudo está ao seu alcance e por isso consegue tudo na vida. Um abraço pra vocês.

Arthur Miranda disse...

Acho que é por essa razão que eu sempre gostei das mulheres e nunca pensei em gay, kkkk. estou aguardando a continuação dessa mini-serie. Beleza Modesto, parabéns.

Zeca disse...

Modesto,

você acaba de dar uma prova irrefutável de que quando uma mulher quer alguma coisa, ela consegue, quer a gente queira, quer não! E o melhor de tudo é que, quando querem de verdade, acabam se dando melhor do que os homens! Sei que isso foi em outra época, onde todos nós ainda tínhamos o ranço da educação recebida de que algumas coisas eram "coisas de homens" e outras "de mulheres". Felizmente hoje isso já mudou e elas estão desempenhando funções "masculinas" com muito mais competência que muito marmanjo por aí. Conheci, há poucos dias, uma "pedreira" de mão cheia. Digna do Pereirão da novela.
Estou aguardando a continuação...

Grande abraço - aos dois!

Wilson Natale disse...

LARÙ, carissimo:
Bem feito! Nunca duvide da tenacidade e vontade de uma mulher!
Dona Myrtes tem, como se nota, gasolina no sangue.
Minha prima, 80 anos, este ano, dirige muito bem a sua Cherokee prá todo o lado. Nunca bateu, nunca teve uma multa.
O único acidente, foi na fazenda, quando apredia dirigir: Jogou o carro numa lagoa, arruinou o carro e matou bem meia-dúzia de patos!
Ahahahaaaaa!
Mulheres fortes sabem o que pode e não pode fazer. Se não fosse forte, com certeza D. Myrtes teria desistido. Pois, o que não falta em uma mulher forte é a sensatez.
Un bacione in testa.
Abraços
Natale