Obs.: Retiramos a foto, por proibição de sua divulgação.
Por Modesto Laruccia: Na reunião do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, USP, realizada no dia 18 de outubro de 2011, da qual fui convidado. Estavam presentes Fabiane Leite (TV Globo, SP), Júlio Abramczyk (Folha de São Paulo), Manoel Carlos Chaparro (ECA-USP), coordenada por David Braga Jr. O tema principal era:
“O IDOSO NA IMPRENSA”.
Chaparro foi nosso professor de jornalismo, na terceira idade quando fundamos o jornal “Reproposta”, que depois se transformou em livro. Entre os convidados, estavam colegas de classe como a Esther e a Izaura Marques. A Izaura, não a via desde quando terminamos outro curso que fizemos com a professora Cremilda Medina, o “Laboratório de Textos”, desde 2007. Nosso reencontro foi muito alegre e lembramos as peripécias que passamos na época.
Pra os que ainda teimam em permanecer deste lado do “cabo”, não devem lembrar muito da Izaura Marques. Ela tem um texto publicado nos fins de 2010, na SPMC. Escreve muito bem, tem hoje 84 anos, foi radio atriz da rádio Record e, nesse dia, cedeu-me um texto feito por ela, na época de jornalismo que, pra quem aprecia estória das rádios em São Paulo, aqui vai encontrar muitas informações interessantes e preciosas, contada por quem viveu todos os parágrafos. Por ser um pouco longo, vamos dividir em duas partes, eis a primeira:
R E L Í Q U I A - 1
A vida nos transforma em contadores de histórias. É fácil relatarmos a trajetória do outro, mas quando se trata da nossa, ficamos engasgados. Não sabemos ao certo como iniciar, o andamento que deve ter, nem como terminar. O tempo passa com a rapidez de um supersônico e trazer à tona os fatos pela ordem acontecida, desmembrar, achar o fio da meada no labirinto da memória é um trabalho que exige sabedoria. Assim para evitar engasgamento finjo que falo de outro alguém, como criança que brinca de faz de conta e relato um pouco sobre minha vida profissional: abril de 1941. Uma chuva forte a faz entrar em um prédio da rua Conselheiro Crispiniano quase esquina da avenida São João. Por curiosidade lê sua tabuleta e em um dos andares estava mencionado Rádio Piratininga. Não pensou duas vezes. Acostumada desde seus dez anos a participar do programa infanto-juvenil da Rádio Educado de Campinas e depois em São Paulo na Rádio Bandeirantes que ficava na rua São Bento, nos programas Mulher de Sagramor Escuveiro, e do Ave Maria, do Joia Junior, tomou o elevador e desceu no andar indicado. Com a facilidade que hoje não existe mais, foi atendida pelo diretor do rádio-teatro, Otávio Augusto Vamprê. Fez na mesma hora um teste de voz, leitura de texto e acertou que na quarta-feira estrearia no Grande Teatro Piratininga. Dia 16 às 19 horas lá estava pronta para a estréia, mas uma surpresa a esperava. Vamprê havia se transferido para a Rádio São Paulo e em seu lugar estava Raimundo Lopes, que a recebeu com toda firmeza dos antigos diretores..
- Participar do Grande Teatro, hoje. Mas de jeito nenhum, não conheço suas possibilidades. – Não importa.- Como não. Além disso não há na peça papel adequadro para principiante – Crie um. Avisei meus pais da minha estréia e não devo, não posso e não vou decepcioná-los.
Raimundo respirou fundo e a levou para a sala de ensaio onde já estavam os atores, Lucilia Freire, Antonieta Soneti, Climaco Cezar e Carlos Maia que além de ator era médico. Papéis distribuídos, Raimundo inicia o ensaio dizendo; vamos ver se encontramos uma cena para a encaixarmos. E a encontrou, quando o contra-regra, tocava a campainha da porta: É aqui. Climaco, marque... você vai dizer, Maria, atenda a porta, disse Raimundo, e dirigindo-se a ela, e você diz... sim senhor. Está bem.
Aí tinha sua esperada estréia respondendo, sim senhor. Mas na hora esticou a fala, sim senhor, pois não, um instante, já vou atender. Deve ser o doutor Jaime. Ele disse que viria falar com o senhor. O programa não era gravado, como atualmente, e a esticadinha já tinha ido ao ar dando início a uma carreira que durou 44 anos de rádio intercalado com shows, teatro, televisão, dublagem, gravações em disco de histórias infantis, publicidade. Redatora de quadro de humorismo como Cartomante Fiu-Fiu e dramáticos Uma Voz ao Telefone, Isto Aconteceu Comigo. Programa feminino, adaptações de filmes e contos, para as rádios de São Paulo, Bandeirantes, Excelsior e Nacional e para TV o Teatro de Bolso (Globo). Recebeu o troféu “Viola de Ouro” como melhor atriz de programa sertanejo na TV Globo. Aposentada, ainda continuou por mais cinco anos na ativa fazendo cinema de animação, audiovisuais e como professora em cursos de teatro e oratória. Dirigiu grupos amadores. Contou histórias em escolas. Como falar sobre cada uma dessas atuações é meio complicado vamos simular uma rápida entrevista. Faço as perguntas e você satisfaz minha curiosidade.
A primeira é saber por que quem trabalha em rádio é chamado de radialista. Entenda. Quem trabalhava em uma emissora de rádio o fazia quase que somente para satisfazer o seu prazer, seu deslumbramento. Por isso, era considerado idealista. Então, Nicolau Tuma teve a idéia de juntar as palavras radio e idealista e deu radialista. Hoje o ideal esta sendo trocado por faturar.
Você usava um nome artístico. Não. O meu próprio, Izaura Marques.
Com meio século de carreira deve ter atuado em varias rádios e Tvs.
Rádios acho que todas, de São Paulo. Comecei, como já citado, na Piratininga que foi a falência. Fui para a Difusora a convite de Raimundo Lopes. Houve uma junção da Tupi com a Difusora e passei a pertencer ao elenco também da Tupi sob a direção de Otávio Gabus Mendes. Nesse tempo participava do programa de auditório Revista Escândalo da rádio Cosmos, hoje América. Aqui cabe uma curiosidade. Você sabia que foi o antigo dono da Cosmos que implantou um sistema de pesquisa que resultou no tão conhecido e temido IBOPE. Em 1943, Oduvaldo Viana veio do Rio para dirigir a radio Panamericana que inaugurava e lá fui eu. Quando a PAN foi vendida para Paulo Machado de Carvalho e transformada em Jovem-Pan, o cast do teatro foi transferido para a São Paulo que já era especializado em Rádio Teatro. De vez em quando participava de programas da Record, emprestada pela São Paulo até que me transferi para a Cruzeiro do Sul que tinha os estúdios na Praça do Patriarca. A direção era do Cassiano Gabus Mendes e de Ivany Ribeiro que um ano depois contratada pela Bandeirantes (Rua Libero Badaró) me levou junto. Era diretor geral o locutor esportivo Rabelo Júnior, criador desse gool prolongado que todos os locutores usam na transmissão de uma partida futebolística e que deu à ele o título de “O homem do gol inconfundível”. A Bandeirantes mudou para a rua Paula Souza e eu para a Radio Excelsior, com Mário Donato que as vezes emprestava atores para a Educadora. Com o surgimento da Nacional todo o elenco atuava na Excelsior e na Nacional, onde me fixei por 34 anos. Gravei programa educativo para Rádio Cultura.
Em TV participei desde 1954 até me aposentar, na Organização Vitor Costa, Globo, TV Cultura, SBT e Excelsior.
O rádio-teatro foi famoso em sua época. O que era preciso para que uma emissora apresentasse um bom rádio-teatro.
Uma série de “bom”. Bom elenco versátil, bom texto, bom diretor, bom contra-regra, bom sonoplasta.
Entendi. Um grupo jóia.
Acertou. Muito embora as vezes houvesse num elenco algum “canastrão”, no todo tinha que ser de primeira. Mas um bom diretor podia fazer de um canastrão, um ator. O contra-regra, ou seja o responsável por todos os efeitos sonoros se errasse estragaria toda uma cena. As musicas para temas ou mesmo em bg, muito bem escolhidas pelo sonoplasta e deviam entrar na hora certa. O texto bom para despertar o interesse do ouvinte. Enfim se tudo não fosse muito bom, perderia audiência. Outra coisa interessante é que as novelas de rádio faziam a cabeça do ouvinte trabalhar porque era ele quem idealizava os cenários, já as novelas televisivas mostram tudo pronto e as cabeças não trabalham.
A pouco tempo, você voltou a gravar novelas para rádio Record. Achou que houve diferença na forma de trabalho.
Nossa, muita. Na verdade, a Rádio Nacional ou Globo, onde atuei por mais de trinta anos, já gravava a programação, por isso gravar não representava novidade. O que estranhei foi que não há mais ensaio. Se grava direto, às vezes diálogos ou mesmo só as falas de cada personagem. Depois fazem a montagem. Achei falta nas rubricas engraçadas que ilustravam os antigos textos, (ruído de assoar o nariz) em Éramos Seis, levada pela Record ou (chocar de corpos) que queria dizer abraço. Enfim, essa série foi um jogo de cintura para mim porque só sabia que era uma cigana. É muito bom gravar, assim não vai ao ar nenhuma falha. Mas que os nossos erros eram divertidos eram. Na Pan, Alair Nazaré tinha que dizer: sempre que ela volta da missa ela toca essa música e ela trocou a ordem. Sempre que ela volta da música ela toca essa missa. Um locutor também da Pan cometeu um erro ao ler uma propaganda, hoje mais conhecido como comercial e disse “Aveia qualquer” mas com muita presença de espírito corrigiu em cima: Aveia “qualquer” não, exija aveia “Quaquer”. Numa novela religiosa, se não me engano era a vida de Santa Edwiges, dialogando com Walter Forster e o dizia punha sua “mão” em meu ombro e muito compenetrada disse, ponha sua “mãe” em meu ombro. Agora vexame mesmo passei, que lembre, umas três vezes. Fui escalada para substituir uma colega que ficara afônica. Era um quadro de auditório, Primo João, e o inicio era cantado. Fiquei gelada porque eu não canto nem de baixo do chuveiro. Ensaiei a cantoria com o acompanhamento de piano, mas na apresentação o que entrou foi a orquestra do Silvio Mazuca. Fiquei totalmente perdida apesar de um dos músicos levantar e cantar a melodia com o pistom eu não me encontrei. Isso foi na rádio Bandeirantes. Fazendo um show beneficente, num clube na avenia Ipiranga, num esquete com Osmano Cardozo, entrei eufórica no palco e eufórica caí com as pernas para o alto e de frente para platéia que riu a bandeiras despregadas. O que mais me deixou nervosa, confusa, aconteceu na penitenciária, no antigo Carandiru. Novamente dialogando com Walter Forster, garbosamente usava um vestido “tomara que caia” e ele quase caiu mesmo. Um contra-regra da Globo costumava dizer quando errava; desculpe a vergonha que passei e fui eu que disse no show para os detentos. Um errinho era uma tragédia tanto na rádio, como no início da TV que a programação era ao vivo nos obrigando a termos a memória na palma das mãos. Depois chegou o vídeo mas ele não voltava, tínhamos que gravar direto e ficarmos no estúdio esperando para saber se estava tudo certo ou se tínhamos que regravar. Era um sufoco.
Sei que dublou seriados. Houve algum que marcou mais.
Dublei longa metragem também e muito. Sem duvida em série foi o Nacional Kid. Primeiro filme japonês com efeitos especiais que veio para o Brasil. Dublava um garoto de seus 6 anos, Kuru. Ainda hoje muita gente lembra do Nacional Kid. Era a alegria da criançada nos anos 60. Sabe, a dublagem também acompanhou o tempo. Em 50 e 60 o filme era divido em anéis e todos os dubladores que participavam daquele trecho dublavam juntos. Tínhamos que falar dando sincronismo absoluto ao modo de falar do autor cinematográfico e quando um dublador errava, voltava todo anel por varias vezes (dez, trinta ou ainda mais). Difícil, não é? Mas hoje é bem mais fácil se trabalha com o fone de ouvio.
Para enfrentar sua carreira fez algum curso de especialização, para rádio, dublagem ou teatro.
Sei que hoje esses cursos se espalham, mas não. Tanto na rádio, na dublagem como na TV e também no teatro, aprendíamos com cada diretor. Tive excelentes diretores; Raimundo Lopes, Otávio Gabos Mendes, Farid Riscala, Talma de Oliveira, Júlio Atlas, Ivany Ribeiro, Túlio de Lemos, Renan Alves, Daniel Filho, Oduvaldo Viana, Luiz Pini, Eny Autran, Carlos Machado e outros que talvez agora tenha me fugido. Todos muito exigentes. Na rádio São Paulo havia um diretor que costuma dizer quando tínhamos poucas falas: tu tens poucas falas, mas elas devem ser ditas e muito bem ditas. Na Panamericano, hoje Jovem Pan, a programação de auditória era decorada, um verdadeiro teatro. Aprendi muito e tanto fazia papéis dramáticos como caricatos. Na TV era comediante, e sabia que é muito mais fácil fazer o público chorar de rir. Em várias situações cheguei a fazer dois papéis ao mesmo tempo, tendo que dialogar comigo mesma. Pó de Pirlim... Pim, Pim, de Monteiro Lobato, adaptado para disco, interpretei Pedrinho e Narizinho. Outra boa escola foi fazer quadros em vários programas, ao vivo e de improviso. Com Manoel de Nóbrega em programa de auditório, na rádio Nacional os quadros Adão e Eva e o do Ventríloquo que era o Nóbrega, eu e o Canarinho, que ainda está na ativa, fazíamos os bonecos, era um quadro muito divertido. Outro programa de grande audiência foi A Praça da Alegria, atualmente apresentada por Carlos Alberto de Nóbrega, pelo SBT como A Praça é Nossa e onde eu fazia a Lili, a menininha mais sabida enquanto o Ronald Golias era o garoto mais atrasado da Escolinha de Grupo.
No teatro, na Companhia de Hilda Asson sob a direção de Hélio Quaresma foi uma boa escola. Mas o teatro infantil nos dá mais trabalho, a criança é mais exigente, mais crítica. Com tudo, vou revelar a você, o que me deu mais lição de trabalho e de vida, foram os shows que fazíamos com a Caravana do Nóbrega, todo fim de semana em circos de periferia.
Pode citar colegas que trabalharam com você.
Olhe que a lista pode ser interminável, porque todo radialista era meu colega. Vou satisfazer um pouco sua pergunta. Alguns já nos deixaram saudosos, outros ainda estão em atividade. Na TV Tarcísio Meira, Francisco Cuoco, Lucimara Parisi, Osvaldo Louzada, Nair Belo, Renato Consorte e muitos outros. Dubladores, Yvete Jaime, Borges de Barros, Helena Samara, Gilmara Sanches. Os de rádio, todos os radialistas das décadas de 40 na 80 (século passado). A rádio continua funcionando mas para o rádio-teatro o mercado está fechado.
Os programas de TV, você decorava com facilidade? Não sobrava tempo para decorar texto. Tinha praticamente uma apresentação atrás da outra. Costumava fazer isso durante os ensaios o mesmo enquanto ia uma cena que não participava, decorava a minha. Memória fotográfica. Mas sabe, muitas vezes acontecia de colocarmos nossa “colinha” nos cenários e depois do ensaio geral o diretor de estúdio trocar tudo e a nossa salvação ia pro brejo. Foi trabalhosa a programação de TV no início, os cenários eram precários, não se fazia externas e o guarda-roupa vinha da casa teatral. O que salvava mesmo era o elenco excelente. Até os comerciais eram ao vivo.
2ª parte de “RELÌQUIA
- Houve alguma chance que você tenha preterido.
Várias... em 43 na Pan o locutor esportivo Nage criou um programa que ia ao ar das 12 h às 12h30 chamado Nageada. Era um casal, ele e eu, que discutia futebol. Fui então insistentemente convidada pelo Nage a ser comentarista de campo e não quis. Achava que não entendia de futebol e seria um fracasso. Em 52, já na Excelsior quase fui para o cinema mas desisti. Havia um teatro na TV que era feito por artistas de teatro vindos do Rio. Uma ocasião veio o Procópio Ferreira mas uma atriz não havia podido vir e a Globo me pediu socorro. Lá fui eu. Não havia tempo para ensaiar quanto mais para decorar o texto, teria que improvisar. Então o Procópio explicou que era uma empregada jeitosa querendo conquistar o patrão, que era ele, que o papel atravessava a peça toda e lá fomos nós para o ar. Quando terminou, Procópio disse: o que fica fazendo em São Paulo, Izaura. Tem que ir para o Rio, menina. Agradeci mas... Também em 65 quando a Globo passou a funcionar no Rio, muitos colegas se transferiram para lá mas preferi continuar aqui. Agora “fora” mesmo eu dei, quando a Globo me propôs ser jornalista, hoje seria ótimo. Já disse à você que os comerciais iam ao ar ao vivo, não foi. Contrataram então algumas garotas para esse fim, mas o número de Garota Propaganda era pequeno e começaram a escalar as atrizes para completar o quadro. Eu não queria porque meus horários já eram terríveis e teria que ficar a tarde toda trancafiada na TV. Foi falar com Paulo de Gramond que era diretor artístico: Paulo eu sou atriz e não garota propaganda. E ele muito diretor respondeu: pois faça de conta que é um teatro onde interpreta esse papel. Saí da sala pensando; tenho que arranjar um jeito e arranjei. Havia uma propaganda de um bendito “pente”. Pedi ao câmera que focalizasse nosso contra-regra que era totalmente calmo e fiz o comercial: façam como o Darci. Ele adora este pente, não usa outro, não é Darci. Fui chamada na direção – que isso não se repita. O próximo comercial era sobre um copo térmico para aquecer mamadeira e eu: querido papai, acabou seu desespero por ter que se levantar a noite para preparar a mamadeira do seu neném. Deixe-a pronta dentro deste recipiente térmico e quando ele berrar é fácil o papai fazê-lo calar. Novo chamado: como você fala com o pai, é com a mãe. O terceiro foi a conta exata para sair dos comerciais. Era sobre um prato elétrico para esquentar comida, pão etc. e eu bem sexy: Minha senhora este prato é ótimo para esquentar o que a senhora “precisar esquentar”. Nunca mais fui escadala.
Que censura. Taí, o que você conta sobre o tempo da censura.
Tempo da censura... Num quadro de humorismo na Excelsior interpretando uma garçonete dizia a dois fregueses que não queriam nada: Mas nem uma coxinha de galinha. Os três pontinhos fizeram o auditório rir e eu levar a maior bronca. Quando as peças sofriam censura tinham que ser trocadas na última hora, davam um trabalho danado. Já na TV, você vai rir quando estava esperando nenê só fazia cenas em off ou por traz de janela, coisas assim, era proibido grávida na TV de certo porque “lembrava” sexo. Hoje...
Os artistas da televisão são assediados pelos telespectadores, os de rádio, eram reconhecidos pelos ouvintes.
Claro, recebíamos uma calorosa correspondência quase que de todo o Brasil. Éramos reconhecidos pelos fãs em qualquer lugar porque tínhamos uma excelente programação de auditório com as orquestras, de Silvio Mazuca, Migliori, Gaó, Guerra Peixe, Osmar Milani, Marcelo Tupinanbá e apresentação de grandes cantores, partindo de Dorival Caymmi, intercalados com quadros de rádio-teatro. Era um publico que aplaudia, não era comandado, regido mas espontâneo. Também as reportagens em revistas especializadas como a Revista do Rádio e em jornais eram constantes e muito bem feitas. Havia também um álbum do Rádio, que tenho até hoje, e um outro que era de bala que vinha com fotos de todos os radialistas. Você comprava as balas e ia formando o álbum. E quer saber, até hoje encontro antigos fãs que ficam felizes quando me vêem. Quer exemplo. O nosso colega de jornalismo Modesto Laruccia, disse: tive paciência de esperar 52 anos para ter a honra de ser incluído no rol de suas amizades. Um antigo admirador das sempre jovem atriz ( : ) e ainda sou procurada para entrevista por rádios, jornais e revistas, o que é gratificante.
Em sua tragetória, muita coisa deve ter sido especial.
Ah, sim... Não só por trabalhos desenvolvidos mas cenas reais... que aconteceram. Não estou lembrada que programa apresentávamos mas lembro do corre-corre terrível com tiros e tudo... era época da ditadura e tínhamos na Rádio Panamerica, um bom elenco perseguido; Oduvaldo Viana, Mario Lago, Dias Gomes, Agostinho Aguiar Leitão e outros que agora não recordo. Só sei que como num passe de mágica todos viraram super-homens e saíram voando por todos os lados.
Um dos aniversários do pograma Manuel de Nobrega foi transmetido diretamente do cine Piratininga, que ficava entre o Brás e o Belém, na avenida Rangel Pestana e era considerada o maior da América Latina, foi inesquecível. Alem de estar totalmente lotado, os aplausos eram tão calorosos que davam a impressão de que ia haver uma implosão. Também em Brasília apresentando o programa do Silvio Santos já no SBT, havia gente pendurada de todo jeito e olhe que o espaço era grande. Tivemos que sair como que foragidos e mesmo assim nossos carros foram bloqueados pelos fãs, foi uma loucura. As festas de aniversario da Nacional deixaram uma lembrança gostosa.
No carnaval de 87 graças ao meu currículo, fui escolhida para jurada das escolas de samba de São Paulo no quisito samba no pé. A emoção provocada pelas baterias durou até saírem os resultados... Ou até hoje.
Agora, particularmente especial aconteceu quando atuava na Rádio São Paulo, la na avenida Brigadeiro Luis Antonio. Levávamos ao ar a novela Entre Dois Mundos do novelista Agostinho Aguiar Leitão. Interpretava um garotinho que era décimo terceiro filho de um casal. Esse personagem vivia entre o mundo material e o espiritual, era muito bonito de muita sensibilidade. Fui então, procurada pelos pais de um menino que, em fase terminal, dizia que não queria morrer a artista que interpretava o Zabelê. Conheci emocionada esse menino de 12 anos. Poucos dias depois ele faleceu. Essas passagens não se esquecem.
Há outro fato que marcou foi em 1952 na Excelsior, quando o redator José Ferreira Carrato criou um programa chamado Meu Filho, Meu Orgulho era a radiofonização sobre um bom filho e a mãe recebia de presente um lindo broche de ouro. Tive a alegria de ser heroína em um deles e minha mãe homenageada. Agora transferi o símbolo de Meu Filho, Meu Orgulho para minha filha Camila que me deu 5 netos.
Você falou em netos... Não foi complicado conciliar o seu trabalho com a vida particular.
Um pouco. Nem sempre tinha empregada, ou pelo menos confiável, e tinha que levar minhas filhas comigo em todo o lado, mas sempre pude contar com colegas que se transformavam em pagens em meu socorro e meu marido me incentivava muito.
Tem uma coisa me confundindo. As vezes você fala Nacional e as vezes Globo. Por quê?
Não há nada confuso. A história foi assim. Em 1950 me transferi da rádio Bandeirantes para Excelsior dirigida por Mario Donato. Em 1952 Victor Costa da Radio Nacional do Rio de Janeiro propôs à Excelsior uma junção e fundou a Nacional de São Paulo. Passamos então a trabalhar para as duas emissoras. Os programas vinham do Rio. Um deles de muito sucesso o Balança Mais Não Cai. Um ano e meio ou dois Vitor Costa comprou a TV Paulista que ficava bem ali na rua da Consolação esquina da avenida Paulista e foi formada então a Organização Vitor Costa. Com o falecimento do Vitor foi que passou a ser Globo. A TV Globo, creio que em 1965, passou em parte a funcionar no Rio. Esta explicado.
Entendi. Mas estou tentando descobrir por que você não continuou. O rádio-teatro esta sem campo mas a dublagem, o teatro e a TV estão aí.
Simples... queria descansar um pouco, “saborear os netos”, e se um artista para uma temporada voltar é complicado.
Acredito. Voltando, sabe que vi no Arquivo do Estado uma exposição sobre Histórias dos Bairros e você estava lá.
Você viu. Foi uma entrevista sobre Santana, feita por historiadores. Um trabalho muito bonito. Outro que achei bastante interessante foi o livro editado pela Droga Raia, Páginas da Vida, com relatos de seus clientes.
Onde você narra um natal da sua infância.
Exato. Você está sabendo muito. Mas tudo isso foi no passado, sem saudosismo.
É, até agora só falamos do século 20. Tentando selar minha pretensa posição de entrevistadora, o que você faz no século 21?
Freqüento cursos abertos à terceira idade na Universidade de São Paulo. Jornalismo, Leitura e Interpretação de Texto. Livro Reportagem e Narrativas da Contemporaneidade. Isso aumenta meu saber promovendo minha participação em vários projetos culturais.
Na Oficina Cultura Oswaldo de Andrade, no projeto Perdigoto com a coordenação de Antonio Prata e Chico Matoso, a publicação de 5 contos na revista Sentidos. Na Faculdade Santana vídeo palestra, sobre rádio. Redijo crônicas ou contos para o “espaço aberto” do jornal Reproposta, que foi criado pelo professor Doutor Manuel Carlos Chaparro, hoje on line com a supervisão de Katiuscia Lopes. Narrativas para quatro edições do Projeto São Paulo de Perfil, idealizado e coordenado pela professora Dra. Cremilda Medina. Atuado em sarau literário realizado em biblioteca publica e hoje participando do lançamento dessa revista. Posso afirmar que essas aberturas enriquecem a minha vida, aumentando o tamanho de minha relíquia. Porque... Nossa memória e uma relíquia que guardamos carinhosamente.
IZAURA MARQUES
Por Modesto Laruccia
13 comentários:
Laru,
faço questão de registrar aqui meu maior agradecimento por ter me dado a oportunidade de voltar a um passado neste relato tão bem detalhado por sua autora, a Izaura Marques.
Confesso que vivi ontem e revivi hoje uma longa e quase total trajetória da minha insignificante vida.
Foi emocionante lembrar nomes que estavam embotados na minha memória. Cenas, muitas que vivi ou tive noticia quando aconteceram. Emissoras de rádio e teatro que conheci e por quem tinha carinho.
É vero! A vida é uma colcha de retalhos que um dia, por um acaso, são alinhavados e nos oferecem uma colcha para agasalhar nossa velhice.
Este texto da Izaura fez, comigo, exatamente isso. Agasalhou minha memória, alimentou minhas saudades, beijou, por assim dizer, a minha fronte.
Obrigado!
LARÙ, carino: Tu hai fatto girare la mia testa con tutte queste belle cose!
Bravissimo! Parabéns pelo texto!
Quantos nomes relembrados e quantas lembranças!
Valeu por essa visão do mundo do rádio que, a gração de hoje não pode entender.
Valeu pela prória Izaura que quase centenária ainda tem uma vida intensa e produtiva.
Memórias de uma grande mulher a ser fixada para sempre na Internet.
Valeu, mio caro!
Natale
Modesto, Eu ainda estou muito emocionado, com essa sua entrevista com a Izaura Marques, Uma figura maiúscula, do bons tempos de nosso Radio, Ela talvez nem se lembre de mim, mas quando eu era bem jovem, antes de trabalhar em Televisão, eu fui algumas vezes na Radio São Paulo na Av. Angelica onde eu ia ver meu Sobrinho Arthur Carlos Araujo que foi casado com a também talentosa Odete Lins, eu cansei de cruzar com a Isaura, nos corredores da Citada emissora. Assisti muitas vezes a mesma atuar no Programa Manoel de Nóbrega na Radio Nacional Paulista na Sebastião Pereira, ( eu devia ter meus 15 anos). E depois já como artista, eu acho que cheguei a gravar vozes, com ela para algumas historias infantis do Baú da felicidade, infelizmente não tive a oportunidade, de trabalhar com ela em programas humorísticos.
Esse é um momento que eu me sinto orgulhoso de participar desse Blog
Modesto, parabéns você foi fundoooo Querida Izaura, que Deus te de muita saúde, e que ele permita que um dia possamos estar juntos num encontro com as redondas. Valeuuuuuuuuuuuuuuuuuuu, gente.
Olá, Modesto!
Transmita à Izaura, por favor, nosso carinho e nossa gratidão por este texto e pela foto que tão gentilmente nos cedeu.
Que história bacana. Para mim, que não conhecia e que pouco sei destes tempos vividos, foi muito gratificante.
Fez-me lembrar de mina querida mãe, falecida recentemente, que cantou na rádio, nos seus tempos de mocinha.
Foi ótimo você nos entregar este trabalho magnifíco para que pudéssemos colocar aqui em nosso blog, que está mais rico agora, com este acervo, aliado a todos os outros textos de todos os nossos queridos amigos autores.
Obrigada.
Um beijo para Izaura e para você.
Muita paz!
Modesto,através do seu texto me fez lembrar alguns nomes que ficaram na historia. Mas o mais importante é que conheci um pouco mais suas qualidades e a magnifica trajetória de vida da Izaura Marques.Parabéns pra você e que Deus proteja a Izaura, com bençãos de saúde e muita paz.
Modesto, uma verdadeira relíquia essa entrevista histórica, memorável,nos colocou por dentro das coisas do rádio, parabéns.
Na falta de um Augusto Foreis Domingues, o grande Almirante, que praticamnte compilou toda a história do rádio carioca, temos o esforço de abnegados como ISAURA MARQUES com este texto absolutamente brilhante e necessário, que nos foi presenteado pela genialidade do Modesto Laruccia, arguto ouvinte e escrevinhador. O relato da vida profissional de Isaura Marques, a partir de hoje, fica gravado a ferro e fogo no cenário da cultura paulistana e do país.
Parabéns, parabéns, parabéns!
Ignacio
No inÍcio de meu comentário citei errado o nome do Almirante; seu nome correto é HENRIQUE FORÉIS DOMINGUES, sei lá de onde apareceu aquele "Augusto"... e continuo afirmando que está fazendo falta alguém que esreva a história do Rádio em São Paulo...
Desculpem pela mancada histórica!
Ignacio
Belo e histórico texto, Modesto. Um prato cheio para os apreciadores do rádio e teatro! Abraços.
.
Modesto!
Só posso parabenizá-lo e agradece-lo por ter dividido conosco este belíssimo e rico texto!
Parabenizá-lo pela escolha, pois a Izaura, do alto dos seus 84 anos, tem, com certeza, muita "história" para contar. E a facilidade com que ela discorre sobre os diversos temas propostos na entrevista, nos proporciona mergulhar de cabeça no texto e dele não querer mais sair. Era apaixonado pelos mais diversos programas de rádio e, nessa paixão, incluídas as radio-novelas que acompanhava ao lado da minha avó. Com certeza ouvi muitas interpretações dessa Dama da Rádio, sem, no entanto, (re)conhecê-la como ela bem merece. Hoje, com a leitura desta jóia rara, sinto-me mais completo, melhor informado e feliz pela (re)lembrança de vários programas e várias pessoas que foram tão importantes em nossas vidas, cada qual cumprindo seu papel.
E, finalmente, agradecer a feliz escolha e a homenagem prestada a essa multi-artista, não apenas por você, mas por todos nós que tivemos a oportunidade de lê-la hoje. Eu, com certeza, posso declarar-me fã dessa estrela! Não apenas pela sua trajetória na rádio e na TV, mas por toda sua vida, tão bem resumida nestas poucas palavras! Ficaria lendo infinitamente, embevecido pelas lembranças, tanto quanto ficávamos, eu e minha saudosa avó, sentados calados ao lado do rádio, vibrando com as radio-novelas!
Obrigado, meu caro!
Abraço
.
Modesto, parabéns por esta maravilhosa entrevista com a Izaura, me fizeram relembrar com saudade os antigos programas radiofônicos de uma época de ouro do rádio, parabéns, Leonello Tesser (Nelinho).
Prezado, esta foto da Isaura Marques, não pode ser utilizada neste seu site. Ela foi feita pelo jornalista Francisco Martins de AgênciaFM. Somente sob liberação pode ser usada.
agenciafm@gmail.com
http://cinemetro.blogspot.com.br/2011/11/isaura-marques-radio-atriz.html
Olá, Cine metro!
Vou retirar a foto, mas só coloquei porque foi cedida por ela mesma.
Obrigada.
Muita paz!
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