Muito recentemente o Arthur (ou será Arthir? Ou será Tutu?) escreveu um texto sobre o famoso Manoel de Nóbrega, destacando uma passagem dele com a censura federal. Lembrei-me, então, deste texto que fala também do assunto e da figura do inesquecível cômico Costinha e prometi, no comentário daquele texto, reeditar este meu rabisco.
Então, lá vai:
MEMORIAS TEATRAIS
Anos 60, os bondes já não têm ponto terminal na Praça das Bandeiras, e já não sobem a Rua Santo Antonio.
No final da Rua Santo Antonio, onde hoje está localizado um estacionamento enorme e subterrâneo da prefeitura, havia sido construído um teatro.
O Teatro de Alumínio tinha sido construído como se fosse um galpão de estrutura metálica, tão comum nos dias de hoje.
De forma abobadada, cobertura em folhas de alumínio, tinha uma figura externa bastante simplória, mas, por dentro, era um teatro com todas as dependências necessárias e com boa acústica.
Muitos espetáculos foram ali encenados e a vários eu assisti.
Como fato marcante na minha memória, está uma temporada ali realizada pela companhia do comediante Costinha.
O espetáculo, como a maioria do comediante de quem eu era fã, era uma revista com números musicais e pequenos esquetes. Os números musicais eram defendidos por um grande e inesquecível amigo, Paulo Domingues, que muito cedo passou para o andar de cima.
Por ser fã de Costinha e ter o Mingo no elenco, eu ia a quase todas as sessões.
Eram tempos negros, a censura atuava com veemência infatigável, o espetáculo do Costinha era bastante visado pelos “guardiões da moral e da família” e ele sabia disso. Na platéia, na primeira fila, a primeira cadeira da esquerda tinha cor diferente das demais, era de cor vermelha e ficava reservada para acomodar o traseiro de um censor de plantão.
Costinha, antes do início do espetáculo, olhava por um furo que normalmente existe no pano de boca dos teatros, para se certificar que o “amigo censor” já havia chegado. Esse gesto era feito diversas vezes a cada noite antes do pano se abrir, pois a presença ou não do censor é que iria medir o grau das bobagens e críticas que seriam juntadas como “cacos” na sequência da revista.
Lembro-me uma noite em que, depois do terceiro sinal e antes da abertura das cortinas, Costinha olhou pelo furo e não vendo a cadeira ocupada, colocou de imediato, a cabeça para fora das cortinas e deu uma abertura diferente ao espetáculo.
Falou para platéia se preparar, para quem tivesse bexiga solta colocar fraldas, para quem fosse recatado sair e trocar o bilhete para um dia mais tranquilo, para quem fosse deficiente da audição se aproximar mais, para as solteironas buscarem assentos mais distanciados que evitariam constrangimentos maiores, tudo isso por que o “FILHO DA P... do censor tinha ido dar o C... e não estava presente para levá-lo em cana”.
Eu, que tinha resolvido assistir o espetáculo das coxias naquela noite, tive mesmo de trançar as pernas, por diversas vezes, para não me molhar todo.
Hoje, o Teatro de Alumínio está vivo apenas na memória de alguns mais idosos. Os jovens dificilmente saberão o que foi este teatro.
É uma pena!
Por Miguel Chammas
Então, lá vai:
MEMORIAS TEATRAIS
Anos 60, os bondes já não têm ponto terminal na Praça das Bandeiras, e já não sobem a Rua Santo Antonio.
No final da Rua Santo Antonio, onde hoje está localizado um estacionamento enorme e subterrâneo da prefeitura, havia sido construído um teatro.
O Teatro de Alumínio tinha sido construído como se fosse um galpão de estrutura metálica, tão comum nos dias de hoje.
De forma abobadada, cobertura em folhas de alumínio, tinha uma figura externa bastante simplória, mas, por dentro, era um teatro com todas as dependências necessárias e com boa acústica.
Muitos espetáculos foram ali encenados e a vários eu assisti.
Como fato marcante na minha memória, está uma temporada ali realizada pela companhia do comediante Costinha.
O espetáculo, como a maioria do comediante de quem eu era fã, era uma revista com números musicais e pequenos esquetes. Os números musicais eram defendidos por um grande e inesquecível amigo, Paulo Domingues, que muito cedo passou para o andar de cima.
Por ser fã de Costinha e ter o Mingo no elenco, eu ia a quase todas as sessões.
Eram tempos negros, a censura atuava com veemência infatigável, o espetáculo do Costinha era bastante visado pelos “guardiões da moral e da família” e ele sabia disso. Na platéia, na primeira fila, a primeira cadeira da esquerda tinha cor diferente das demais, era de cor vermelha e ficava reservada para acomodar o traseiro de um censor de plantão.
Costinha, antes do início do espetáculo, olhava por um furo que normalmente existe no pano de boca dos teatros, para se certificar que o “amigo censor” já havia chegado. Esse gesto era feito diversas vezes a cada noite antes do pano se abrir, pois a presença ou não do censor é que iria medir o grau das bobagens e críticas que seriam juntadas como “cacos” na sequência da revista.
Lembro-me uma noite em que, depois do terceiro sinal e antes da abertura das cortinas, Costinha olhou pelo furo e não vendo a cadeira ocupada, colocou de imediato, a cabeça para fora das cortinas e deu uma abertura diferente ao espetáculo.
Falou para platéia se preparar, para quem tivesse bexiga solta colocar fraldas, para quem fosse recatado sair e trocar o bilhete para um dia mais tranquilo, para quem fosse deficiente da audição se aproximar mais, para as solteironas buscarem assentos mais distanciados que evitariam constrangimentos maiores, tudo isso por que o “FILHO DA P... do censor tinha ido dar o C... e não estava presente para levá-lo em cana”.
Eu, que tinha resolvido assistir o espetáculo das coxias naquela noite, tive mesmo de trançar as pernas, por diversas vezes, para não me molhar todo.
Hoje, o Teatro de Alumínio está vivo apenas na memória de alguns mais idosos. Os jovens dificilmente saberão o que foi este teatro.
É uma pena!
Por Miguel Chammas
10 comentários:
Belas lembranças, Miguel.O bom Teatro de Alumínio e seus espetáculos. Boa história a do Costinha, realmente um barato. Hoje tudo isto desapareceu, sem vestígios, e até a gente duvida se realmente existiu algum dia. Abraços.
Beleza Miguel! O velho Teatro de Alumínio era por si só, um espetáculo e tanto, visto do Viaduto do Chá. Vi muita coisa boa lá. E muita coisa com a Nicette Bruno e o Paulo Goulart. Além de muita coisa boa, vi muita vedette "BOOOUAAA" "dando sopa na praça", tomando um solzinho... Ahahahaaaaaa!
Valeu!!!
Abração,
Natale
Seu texto, (eu já o conhecia)mostra, sem nenhum retoque, as diferenças dos espetáculos teatrais de outrora com as novelas que passam nos horários que qualquer criança assiste. Naquela época, até cençores eram deslocados pra policiar as falas de um artista. Hoje, só por cima, é um tal de agarra-agarra, garotas anciosas em perder a virgindade e quando se defrontam com os pais, aquela verbosidade grosseira pra defender sua posição, verdadeira apologia de gays dos dois sexos, não há uma cena que não tenha amassos na cama, de pé, por traz pela frente, na boca. Vou dizer o que todo mundo fala depois destas críticas mas, a verdade mesmo é esta, não sou contra a liberdade e as conveniências sexuais. Não sou, também, a favor de se propagar de tal forma que, chego a conclusão de que o autor do texto tem um dos predicados e quer mostrar a todos, numa desenfreada manipulação da opinião pública que chego a ter vergonha dessa minha posição. Desculpe, Miguel de ocupar seu espaço, quero ser sincero, sempre gostei do Costinha, ele divertia as plateias de todo o Brasil. Tinha uns amigos, (amigos, mesmo) que eram gays, sempre me respeitaram e não precisavam dar maiores esplicações, eu entendia tudo. Um deles, Paulo, trabalhou comigo na Pan Brasil, morreu jovem de AIDS. Sempre respeitei opções. Miguel, seu texto é, no mínimo, FORMIDÁVEL. Parabéns.
Laruccia
Desculpem, o certo é CENSURA e não cençura. Obrigado.
Modesto
O aluminio fui um marco do rebolado Paulistano. aprendi muito de revista assistindo os espetaculos no Aluminio a ultima revista que eu vi lá foi CUS-CUS A BAIANA com Simplicio e Margo Morel encabeçando o Elenco. Infelizmente eu nunca tive oportunidade de trabalhar no mesmo.
Muito bom, Miguel!
Eu não conheci o Teatro de Aluminio, pois no curto período em que esteve ativo, eu era ainda moleque e nem morava no centro de São Paulo. Mas gosto demais de saber dessas histórias! Para mim são como viagens no tempo.
Abração.
Oie...
Assim como o Zeca, não conheci o teatro de alumínio...
Mas, fico feliz por poder conhecer um pouco da história de cada autor,aqui neste espaço.
Entendo que os espetáculos de outrora eram mais autênticos e recheados de improviso, por conta da própria censura...Mas, tb entendo que hoje, mais livres dos censores, os artistas não medem palavras para expressar sua arte.
Valeu!
Muita paz! Beijosssssss
Miguel, em sua batalha contra a censura, censurou-se a si mesmo! Não precisava, amigo, sempre escapa alguma coisa. Para mim, péssimo digitador, são sempre muitas!
Chammas, o teatralista bixiguento, como bom morador do bairro historico do centro artistico da cidade de São Paulo, Proponho você grande historiador, falar do teatro de Aluminio, da Praça da Bandeira.Se lembra dela?
Miguel,Muito bem lembrado. O Costinha teve ótima presença de espírito ao ver a cadeira vazia.Fora a censura! Ótima lembrança. Abraço, Suely
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