Guanabara (1941) - A magnífica escultura de JOÃO BATISTA FERRI volta a enfeitar o Centro Histórico de São Paulo.
Guanabara foi "entronizada", nos anos 40, no ápice do jardim triangular formado pelos fundos do Edifício Matarazzo, Vale do Anhangabaú e Ladeira, hoje Rua Dr. Falcão. Eu a conheci menino, nos anos 50. Acho que foi amor à primeira vista. Nos anos 60, adorava vê-la, lá do alto do Viaduto do Chá. Muitas vezes descia a Ladeira para vê-la mais de perto e, romântico que sou, tentar entender aquele olhar que sempre me fascinou. Talvez aquele olhar estivesse à espreita, temendo que Anhangá* saísse do Vale e se aproximasse. Ou então, estivesse olhando ladeira acima, esperando por Tibiriçá*... Talvez seu olhar estivesse perdido na distância que a separa de Araribóia* - o seu grande amor...
Por décadas, ela no mesmo lugar, eu, no vai e vem no alto do Viaduto, vimos as transformações do Vale. Com o alargamento das pistas, da Praça da Bandeira, ela foi desalojada e recolocada no centro da Praça Dr. Falcão, onde nos anos 70 foi vandalizada e perdeu seu
nariz. Ficou ali, mutilada, esquecida por anos, até a construção da nova entrada do Metro que absorveu parte da Praça. Mais uma vez, Guanabara foi removida. Desta vez para o canto da Praça, junto aos fundos do então BANESPA. E lá ficou, mais de uma década, na mais completa indigência.
O edifício que foi Matarazzo, depois BANESPA, vira Prefeitura. A Praça que havia perdido espaço para o Metro, perde outro espaço: Vira estacionamento. E Guanabara mutilada, indigente, permanece em meio à folhagem fechada, a canos, transformadores e exaustores.
Não resisto. Boto a boca no mundo, mando e-mails para os jornais, para o Patrimônio... Nada! Guanabara, a indigente, estava destinada a deteriorar-se, esquecida de todos.
Um dia, passo pelo Viaduto e olho. Ela havia desaparecido... Um dos dias mais tristes da minha vida.
25 de Janeiro de 2009 - Saio da Rua Direita e desemboco na Praça Patriarca. Olho para o Viaduto e sou tomado pela euforia. Era ela! Um misto de amor, ternura, saudade, fez com que eu apressasse os passos. Não era sonho. Era ela, perfeita como no dia em que a conheci. Brilhava ao sol, harmonizando-se perfeitamente com o local e a fachada da Prefeitura. Olhava maravilhado para essa minha amiga de décadas... Eu envelheci, mas ela não. Irradiava vida em sua nudez que, ao mesmo tempo, era pudica e voluptuosa... E o olhar... O mesmo que sempre me fascinou. Por onde se perdia o seu olhar agora? Perdia-se em mim? (Ai vai o romântico outra vez)... Ou perdia-se pela Rua Direita, lastimando a decadência do Centro Histórico de São Paulo?
Pessoas passam e olham-na. Outras param e se aproximam. Aqui e ali ouço comentários sobre a sua beleza, sobre a sua nudez.
Sinto-me tomado por um estranho desconforto. Seria ciúme?
*ANHANGÁ – Diabo, ou Espírito do Mal que, segundo os indígenas, habitava o Vale. Daí Anhangabaú: lugar onde vive, ou habita o Espírito do Mal.
*TIBIRIÇÁ - Chefe indígena, considerado um dos fundadores da Cidade de São Paulo.
*ARARIBÓIA - Índio que, fugindo dos franceses, atravessou a nado a Baía de Guanabara. Fundador da Cidade de Niterói.
Por Wilson Natale
Guanabara foi "entronizada", nos anos 40, no ápice do jardim triangular formado pelos fundos do Edifício Matarazzo, Vale do Anhangabaú e Ladeira, hoje Rua Dr. Falcão. Eu a conheci menino, nos anos 50. Acho que foi amor à primeira vista. Nos anos 60, adorava vê-la, lá do alto do Viaduto do Chá. Muitas vezes descia a Ladeira para vê-la mais de perto e, romântico que sou, tentar entender aquele olhar que sempre me fascinou. Talvez aquele olhar estivesse à espreita, temendo que Anhangá* saísse do Vale e se aproximasse. Ou então, estivesse olhando ladeira acima, esperando por Tibiriçá*... Talvez seu olhar estivesse perdido na distância que a separa de Araribóia* - o seu grande amor...
Por décadas, ela no mesmo lugar, eu, no vai e vem no alto do Viaduto, vimos as transformações do Vale. Com o alargamento das pistas, da Praça da Bandeira, ela foi desalojada e recolocada no centro da Praça Dr. Falcão, onde nos anos 70 foi vandalizada e perdeu seu
nariz. Ficou ali, mutilada, esquecida por anos, até a construção da nova entrada do Metro que absorveu parte da Praça. Mais uma vez, Guanabara foi removida. Desta vez para o canto da Praça, junto aos fundos do então BANESPA. E lá ficou, mais de uma década, na mais completa indigência.
O edifício que foi Matarazzo, depois BANESPA, vira Prefeitura. A Praça que havia perdido espaço para o Metro, perde outro espaço: Vira estacionamento. E Guanabara mutilada, indigente, permanece em meio à folhagem fechada, a canos, transformadores e exaustores.
Não resisto. Boto a boca no mundo, mando e-mails para os jornais, para o Patrimônio... Nada! Guanabara, a indigente, estava destinada a deteriorar-se, esquecida de todos.
Um dia, passo pelo Viaduto e olho. Ela havia desaparecido... Um dos dias mais tristes da minha vida.
25 de Janeiro de 2009 - Saio da Rua Direita e desemboco na Praça Patriarca. Olho para o Viaduto e sou tomado pela euforia. Era ela! Um misto de amor, ternura, saudade, fez com que eu apressasse os passos. Não era sonho. Era ela, perfeita como no dia em que a conheci. Brilhava ao sol, harmonizando-se perfeitamente com o local e a fachada da Prefeitura. Olhava maravilhado para essa minha amiga de décadas... Eu envelheci, mas ela não. Irradiava vida em sua nudez que, ao mesmo tempo, era pudica e voluptuosa... E o olhar... O mesmo que sempre me fascinou. Por onde se perdia o seu olhar agora? Perdia-se em mim? (Ai vai o romântico outra vez)... Ou perdia-se pela Rua Direita, lastimando a decadência do Centro Histórico de São Paulo?
Pessoas passam e olham-na. Outras param e se aproximam. Aqui e ali ouço comentários sobre a sua beleza, sobre a sua nudez.
Sinto-me tomado por um estranho desconforto. Seria ciúme?
*ANHANGÁ – Diabo, ou Espírito do Mal que, segundo os indígenas, habitava o Vale. Daí Anhangabaú: lugar onde vive, ou habita o Espírito do Mal.
*TIBIRIÇÁ - Chefe indígena, considerado um dos fundadores da Cidade de São Paulo.
*ARARIBÓIA - Índio que, fugindo dos franceses, atravessou a nado a Baía de Guanabara. Fundador da Cidade de Niterói.
Por Wilson Natale
16 comentários:
Natale, eu tambem me deliciava em admirar essa obra de arte. Depois fiquei sem saber do destino que fora dado a ela.
Agora, lendo seu texto, tive notícias da linda india, agradeço mais essa aula de cultura.
Como são as coisas. Trabalhando 15 anos no Matarazzo, nem sabia da existência dessa estátua que vc, Natale venera com tanto ardor. É bem provável que vendo-a sempre, me desinteresei pela sua presença. Acho que essa paixão tem raizes na alma poética que vc possui, Wilson, vendo ela reaparecer, não perdeu a oportunidade de louva-la. Gostei de sua prosa, de seus conhecimentos e de seu gesto apaixonado e que ele, o gesto, encerra o perfil de uma pessoa altamente sentimental e sensível. Parabéns, Natale.
Modesto
Belo texto Natale, como sempre alias. Parabéns.
A bela Guanabara esta de volta
ao lugar que não devia ter saído
e eu que sempre ando distraido
isso tudo não havia percebido
Estaria a mesma sentindo-se muito mal
de se expor sem o nariz na praça principal.
Então encontrou um Pitanguy,
que deu um jeito e arrumou o seu nariz.
E ela mais bonita e vaidosa
voltou a freqüentar a mesma praça
agora mais bonita e mais formosa.
E a donzela mais sexy e mais bela
depois de enfrentar o bisturi
ficou na praça a esperar por ti.
Parabéns, Natale!
Pelo belo texto transformado em romântica homenagem a uma bela obra de arte. Lembro-me vagamente dela, sua imagem foi se clareando em minha memória à medida que lia o texto. Como somos "distraídos" com a arte e suas manifestações! Só mesmo um espírito sensível e romântico para "enamorar-se de uma linda escultura! Parabéns também por essa sensibilidade e esse romantismo que vamos, quase todos, perdendo ao longo da vida!
Abraço.
Que belo depoimento, Natale. Sou um amante da escultura, e quando estas estátuas nos trazem, então, lembranças de infância, viram ícones inesquecíveis. As estátuas errantes de São Paulo...que legal quando ressurgem, e em bom estado. Vc sabe de minha luta para tentar reconduzir Nostalgia, de Leopoldo e Silva ao seu originário Trianon. Tudo inútil. Eu, pecador, me confesso: não vi ainda, pessoalmente, Guanabara. E nem os meninos da Pça. João Mendes. Falhas que serão sanadas, na primeira oportunidade. Um abraço.
Aliás, parabéns tb pelas belas fotos!
Aproveito a oportunidade para parabenizar, de uma vez, meus três companheiros Peixes em Aquário, colhendo mais uma Primavera neste Verão: Lourdes, Modesto e Navarro.
Muitas felicidades a todos !
MIGUEL: Hoje ela está em frente a Prefeitura para ser admirada por todos.
LARÙ, mio caro:´Você não a via, porque ela estava atrás do Ed. Matarazzo.Um lugar que era contra-mão, pois a maioria seguia para a Barão e, os que iam para o Anhangabaú, desciam pela Galeria Prestes Maia. Alguns não se lenbram, ou pouco lembram dela. É que ela ficou anos esquecida naquele lugar.
ARTHUR: Adorei os teus versitos. Se ela está a me esperar, não sei. Mas, que ela me encanta todoa a vez que passo por lá, me encanta.
Valeu!
SAIDENBERG: Valeu! E com certeza, aos poucos você vai atrás de outras esculturas.
As fotos não ficaram tão boas.São mais emocionais. Mesmo assim, obrigado.
Abração,
A TODOS OS ANIVERSARIANTES DE FEVEREIRO, DEIXO OS MEUS PARABÉNS E O DESEJO DE QUE TENHAM MUITA PAZ E SAÚDE.
AO LARUCCIA: UN'ANNO DI PIÙ, ED UNA RACCOLTA D'UNA NUOVA ZUCCA NEL ORTO DELLA VITA. E CHIS'SIA UN'ANNO DI TANTE BELLE COSE, DI VINO E SALUTE!
ABRAÇÃO,
NATALE
Grazie, Natale tu sei un vero cavalieri, non ti scordato. Facciamo in 05\02, 79 anni.
Laruccia
Olá, Wilson!
Particularmente,sou péssima observadora...Nem sempre percebo as coisas, na rua, sobretudo quando estou apressada. è um defeito.
Mas, aqui neste espaço, fico conhecendo muitas coisas belas de Sampa e passo a prestar mais atenção quando vou pelas ruas de São Paulo.
Adorei seu trabalho de pesquisa e suas fotos.
Valeu!
Obrigada.
Muita paz!
Soninha: A cidade tem muito a revelar. E foi, nocorre-corre que eu fui descobrindo muita coisa. E S. Paulo ainda tem muito a revelar.
Hoje a maioria das estátuas estão fora do centro histórico ou na Pinacoteca. Outras, estão dentro de parques, distante dos olhos de que apressadamente se dirige ao seu trabalho. Estátuas, antes, era uma terapia contra o stress.
Abração,
Natale
Natale. Você sempre nos surpreendendo com seus maravilhosos textos.Confesso que para mim tudo novidade.
LOPOMO: Obrigado.
Gostar de estátuas, monumentos, eu sempre gostei. Mas o que me fez ter contato com muitos deles foi o fato de ter sido um officw-boy. Conhecia-se tudo e de tudo. Até o que não se queria. E andava-se por toda a parte.
Abração,
Natale
ZECA: Revisando as respostas dos comentários, ví que não constava a sua resposta. Acho que em vez de dar um enter, eu cliquei em outro lugar.
Então, a qui vai, de novo, a resposta:
Zeca: A Guanabara foi a primeira estátua a que eu realmente prestei atenção. A impressão vfoi boa! Gostei dela! É como a história do primeiro sutiã (risos), eu nunca me esqueci dela.
Abração,
Natale
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