Estava hoje, como soer
acontecer, preenchendo o vazio dos meus dias praticando meu exercício
físico-visual, ou seja, assistindo o que a “telinha” me oferecia quando, num
dos múltiplos intervalos comerciais que nos enfiam goela abaixo, foi veiculado
um filmete de uma nova campanha publicitária de um antigripal famoso, o
“Benegrip infantil”.
.
A veiculação me
interessou pela forma com que foi abordado o assunto, mostra o desespero de um
filho para tentar se desvencilhar das tentativas de seus pais para lhe
administrarem o remédio, gritos, desculpas e mil artifícios... Depois do
surgimento da nova apresentação do remédio a rejeição, conforme campanha
publicitária, desaparece de imediato.
Assisti estarrecido
lembrando de uma realidade muito antiga vivida por este rabiscador de palavras.
Tudo veio claro em minha memória e, sem dúvidas, comecei a registrar os
pensamentos com toda a realidade com que se apresentavam. Aqui vai:
Minha segunda filha, a
Roberta, era um para-raios de doenças. Se alguém viesse a dar um espirro na Cochinchina
(atual Vietnam) por resultado de uma nova virose ou coisa que o valha, era ali,
na Rua Rocha, no miolo do velho e querido Bixiga, que se repicava o espirro e
se manifestava o novo mal. Era incrível.
Numa dessas oportunidades,
não sei como e nem por que, ela apresentou sintomas de abatimento da saúde. Uma
febre logo se fez presente, eu estava em uma ausência profissional e a mãe,
decididamente, a levou ao médico. Depois dos exames solicitados veio o
diagnóstico, Febre Reumática.
Voltei para casa o mais
depressa possível, mas minha presença já não se fazia tão necessária, a
pequerrucha já estava medicada e brincando serelepe como sempre.
Ledo engano! Os males
estavam por iniciar. O médico ao constatar a doença disse à minha esposa que o
tratamento daquela doença era longo e dolorido.
Ela teria que ser
medicada, pelo menos até os 14 anos com a aplicação mensal de um antibiótico
famoso pela dor que até hoje é provocada quando injetado no paciente, injeções
de Benzetacil eram e são, até hoje, o terror dos pacientes.
Inicialmente medicada
minha pequerrucha iria nos meses seguintes me provar que era, também, uma
grande atriz dramática além de uma fazedora de “auês” homéricos;
A cada mês, na época da
injeção ela promovia um espetáculo, choros, gritos, rogos, tentativas de fuga e
tudo mais que fosse possível ela usava e abusava, a vizinhança já sabia e não
ligava mais para o barraco.
Na Praça 14 Bis, bem
próxima de nosso apartamento existia uma farmácia que tinha, por sua vez, um
farmacêutico de origem nipônica, cujo nome, por culpa de minha idade avançada,
não consigo lembrar o nome, mas que era um “expert” em aplicar injeções, e
depois do primeiro escândalo na farmácia, considerou a possibilidade de ir, a
cada mês, aplicar a espetada lá em casa, no que foi, de imediato, entendido e
aceito.
Então, a cada mês,
aquele prédio se transformava no palco dos espetáculos da Robertinha, mas como
diz o velho ditado “não há mal que sempre dure...” um dia, nova consulta, uma
súplica emocionada dos pais já esgotados com tanta gritaria, veio a liberação
médica. Já não mais teríamos que forçar a aplicação de novas injeções.
Estávamos livres, nós e a Roberta, daquele suplício mensal.
A lembrança, porém, não
foi apagada e, ao assistir esse comercial, voltou de cabo a rabo em nossa
memória.
Graças a Deus só na
memória.
Por Miguel Chammas
3 comentários:
Olá, Miguel!
Suas memórias são bem engraçadas mesmo e esta tem o acréscimo da dramatização de sua filha, o que me fez lembrar de minha irmã mais velha que, vez outra também tinha que tomar esta famosa injeção na farmácia, e ela ficava correndo pelo estabelecimento para fujir da injeção, gritando socorro e com minha mãe e o farmacêutico correndo atrás.
Coisas de crianças, né?!
Muita paz!
Sonia Astrauskas
Benzetacil não era remédio, era um instrumento de tortura!!!
Mesmo com o sofrimento, a história é divertida (agora que já esquecemos a dor!)
Obrigado por mais esse "divertimento"!
Nos meus aureos tempos o farmacêutico era o "médico" da família, e resolvia!!
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