terça-feira, 19 de setembro de 2017

Memórias Gestuais


Há muito tempo que não me sinto propenso a sentar diante desta maquininha eletrônica e digitar fragmentos da minha memória. Tinha receio de que minha caixa de lembranças estava exaurida. Nada vinha aguçar minha vontade de formalizar um registro histórico.
Então, tentei aceitar a situação como normal e abstraí a vontade de escrever.
O tempo passava e de quando em vez me pegava pensando na possibilidade de retornar aos meus rabiscos. Concentrava-me na busca de um tema e...nada acontecia.
Resignado voltava ao meu “ponto zero” e, consequentemente, ao fazer nada de sempre.
Hoje, ainda sem nada interessante para fazer, sozinho, uma vez que, por conta de uma vontade enorme e um merecimento incomum, minha companheira iniciava um curso acadêmico, restou o cotidiano, assistir TV ou ouvir a irradiação do jogo do meu time que, por ser uma segunda-feira, não seria sequer televisionado. Não tive dúvidas, optei por ouvir o rádio.
O jogo estava seguindo seu curso normal, meu time jogava bem e me dava a certeza que de um momento para outro abriria o placar. Certeza confirmada, o verdão abria 1 x 0 contra o, também verde, Coritiba. A tranquilidade tomou conta de meu ser até o final do primeiro tempo e me dava a certeza que no segundo tempo de jogo o placar se ampliaria e a vitória seria definitiva.
A segunda etapa teve início, algumas alterações foram realizadas pelas duas equipes e, nosso adversário mudava um pouco sua estratégia de jogo, nosso time não se encontrava em campo.
As dificuldades eram evidentes. O verdão de Curitiba ia se encontrando cada vez mais e ameaçava nossa mísera vitória. A bola ia e vinha, os ataques seguiam muito mais perigosos contra o Palmeiras e eu, como todo torcedor consciente, torcia, tentava mandar fluidos positivos para minha equipe na determinação de, pelo menos, manter a apertada vitória.
Foi então que, num momento de muita tensão, me percebi fazendo um gestual que era marca registrada dos Duques de Piu-Piu nos anos “entas” da minha juventude, no meu amado Bixiga, bairro famoso de Sampa, para amarrar o time adversário.
Esse gesto, introduzido em nosso grupo pelo amigo e irmão Xiribi era simples, em ambas as mãos, devidamente postadas, estirávamos para a frente os dedos indicador e mínimo como se fossem um par de chifres e, os dedos restantes, anelar, médio e polegar, se contraiam e formavam uma figa.
Pura crendice nos permitia a certeza que estávamos amarrando o adversário e impedindo-o de concluir com eficiência suas jogadas.
Lógico que, em muitas ocasiões, nem esse gesto cabalístico nos ajudou, mas quando a coisa acontecia a nosso favor, a ele (gesto), eram concedidas todas as glórias.
Hoje, mais uma vez, devo render ao velho ritual as glórias da vitória. Vencemos com um suado 1x0 e ao término da irradiação, minhas velhas mãos, já padecentes de artroses e artrites, estavam bastante doloridas pelo uso desse gesto durante a maior parte do segundo tempo.
Eis que, na paz da vitória, consciente da lembrança gestual, voltei para meu notebook, abri o Word e registrei mais um rabisco.
Será que voltei em definitivo? Não sei, mas aguardem por favor.  

Por Miguel Chammas

4 comentários:

Memórias de Sampa disse...

Olá, Miguel!

Gostei de ler e aprender mais um gesto que eu desconhecia.
Vocês foram bem criativos, né?
Traga-nos mais, ok?
Muita paz!

Sonia Astrauskas

Unknown disse...

Que legal Miguel! Muito bom ler mais texto seu. Este então sobre o Verdão, claro que chamou minha atenção, eu também estava ouvindo a transmissão do jogo e na torcida de que muitos gola iriam acontecer, mas tive que me contentar com 1x0.

leonello tesser (nelinho) disse...

Caríssimo Miguel, eu pude ver o jogo na TV, minha filha gentilmente fez a assinatura no Canal Premier para os jogos do campeonato brasileiro, assim como você eu também fiquei na torcida, só não fiz a figa à moda italiana mas a tensão era enorme a cada bola levantada na área do verdão, felizmente o time saiu vencedor, mas foi suado!

Teresa disse...

Essa sua figa é uma mistura de "proteção contra a má sorte" (como uma figa de guiné) e um "sai capeta". Era para proteger mesmo contra o "mau olhado". E não é que às vezes funciona... Independente de significados, o que valeu é ver você de volta. E que seja a primeira de muitas crônicas. Continuo aguardando.