terça-feira, 6 de dezembro de 2011

A Vigília De Natal – (2010)

imagens, abaixo, retiradas da internet:  Igreja San Carlo Borromeu (Vila Prudente) e Igreja San Genaro (Mooca); presépio

Pela boca de uma criança, o despertar das lembranças...
Mea Culpa!
Pois é. Eu que venho dizendo que na festa do Natal tudo é importante, menos o Aniversariante fui pego de surpresa pela pergunta de minha sobrinha-neta. Não fosse ela, eu não teria voltado no tempo e resgatado este fragmento de memória.

Neste sábado, dia 18 de dezembro, casou-se o meu sobrinho mais novo, na Igreja de San Carlo Borromeo (São Carlos Borromeu, paróquia da Mooca e Vila Prudente, não a do Belenzinho). Eu, à entrada da igreja, estava entretido em regular a máquina digital. Queria fazer as minhas próprias fotos do casamento.
Junto a mim, minha sobrinha-neta, filha do meu sobrinho mais velho, quieta e pensativa, olhava para o presépio. De repente ela volta-se para mim e pergunta:
- Por que não tem Jesus no “presépio”?
Olho para ela e depois para o presépio e digo:
- Como não tem Jesus? Tem sim. Está lá, na manjedoura!
- Tem não, tio! Vem “vê”...
Faço-lhe a vontade. Olho para o presépio, vejo todo o conjunto e penso: “Mas, que “cazzo”! Onde estará o menino Jesus”?! Minha sobrinha tinha razão. Ele não estava lá. Será que o roubaram? Como é que pode? Pode sim!
De repente, sou criança de novo. Estou todo arrumado e perfumado, de mãos dadas com vovô e vovó entrando na Igreja de San Gennaro, onde eu, pela primeira vez, ia participar da Missa do Galo – a Vigília de Natal.
Nunca eu vira a “San Gennà” tão linda, tão iluminada pela luz e pelas velas. Rosas brancas e lírios em profusão enfeitavam o altar mor e os nichos laterais. Aos pés de Santa Luzia, braçadas de rosas vermelhas contrastavam com as rosas e lírios brancos; San Gennaro estava envolvido por rosas brancas e palmas.
O Padre estava paramentado com toda a pompa exigida pela ocasião e os sacristãos, paramentados com batas brancas de renda e saião vermelho e, com os incensórios de prata na mão, incensavam o altar e a Igreja.
O incenso era diferente daqueles dos domingos. Mais intenso, exalando um perfume delicioso.
No mezanino, os cantores do coral, vestidos com batas brancas de gola azul e o grande órgão enchiam a igreja com a música “Jesus, alegria dos homens”.
Encantado, eu circulava pela igreja toda. Ora estava em frente à imagem de San Gennaro, ora em frente ao altar lateral de Santa Lucia (Luzia). Nesse passa passa, descobri o Presépio! Tão grande comparado ao nosso, lá de casa. E, mais encantado ainda, deixo-me ficar admirando as figuras. Puro encanto! Mas, notei, faltava algo. O quê seria? Vasculho com a visão o presépio todo. E descubro.
Estava desolado. “Mancava il Gesù bambino”! (Faltava o Menino Jesus!) Desolado, fui contar à minha avó. Mas, nesse momento, o padre vai para a frente do altar, pedindo silêncio. Todos se levantam. E minha “nonna” diz baixinho: “Depois eu explico porque é que Jesus não está lá. Aliás, você vai ver com seus olhos”.
O padre nos convida a sentar e volta-se para o altar, beija a ara e concentra-se. Do mezanino, a voz da soprano inicia o ato da Anunciação, cantando o Magnificat:
Ave, Maria!
Gratia plena.
Dominus te cum.
Et benedicta tu in mulieribus.
Et benedictus frutus ventres tue Iesus!...
A Missa, com toda a sua pompa e circunstância, segue em frente. E, quase meia-noite, durante a distribuição das hóstias, o órgão soa forte e o coral canta “Glória”! (Gloria in excelsis Deo!), para logo em seguida, junto com o badalar dos sinos, batendo a meia-noite, cantarem “Jesus, alegria dos homens”.
Em meio aos sons da música e do badalar dos sinos, da Sacristia surgem acompanhadas pelas irmãs do Sagrado Coração de Jesus - que traziam o pergaminho com a frase “Gloria in excelsis Deo” - as Filhas de Maria em procissão, carregando a imagem do “Gesú bambino” e o levando até a manjedoura.
Então, sem que vovó me explicasse, eu compreendi que: Se Jesus não estava antes na manjedoura era porque não havia ainda nascido. Nascera sim, agorinha há pouco e fora levado para lá, para os seus pais.
Em casa, a “nonna” me explicou toda essa representação do Natal, que há mais de mil anos se fazia, era para homenagear Jesus no dia do seu aniversário...
Ensinou-me que, na véspera do dia 25 íamos à igreja fazer a Vigília, ou seja, numa linguagem mais simples, íamos esperar que Jesus nascesse.
Deixando de lado as lembranças, voltando ao mundo real, sorri e ironizei a mim mesmo, dizendo novamente em pensamento: “No Natal tudo é importante, menos o Aniversariante”...
E, lá estava eu na igreja, no casamento do meu sobrinho. Agora um tio avô, esquecido da máquina digital, sentado ao lado do Presépio, explicando à minha sobrinha neta o porquê daquela ausência de Jesus na manjedoura.
Intimamente agradecendo a ela por me fazer lembrar os doces momentos do meu passado. Não fosse ela, eu teria passado por aquele presépio sem sequer notar a ausência do Gesù bambino. Sem lembrar a significação moral e espiritual que emana dele.
E, por assimilação, vendo este nosso tempo de violência e incertezas, vou filosofando sobre a frase do pergaminho que o anjo abre sobre a manjedoura:
“Glória a Deus nas alturas e Paz na terra aos homens de boa vontade”!
Glória!

UM FELIZ NATAL A TODOS!!!

Por Wilson Natale

21 comentários:

Arthur Miranda - tutu disse...

Bela historia Natale, acho que todos nós leitores voltamos também a nossa infância, e revivemos essa alegria de olhar os presépios, como fazíamos no passado, hoje em dia praticamente o costume de presépios nas casas desapareceu.Papai Noel e o materialismo tomaram conta dos seres humanos mesmo com a crise do capitalismo europeu, parabéns e um ótimo Natale.

Luiz Saidenberg disse...

Muito bonito, caro Natale, e portuna lembrança.
Aprendi, curiosamente sobre este fato- a ausência de Jesus- num filme de Mario Monicelli, Parente é Serpente. Num abela procissão, sob a neve italiana, o Menino é colocado ad posteriori em seu bercinho. Muito lindo, e bem acertado: É natto Jesú Bambino! Boas Festas e um abração.

Miguel S. G. Chammas disse...

Natale amigo, não tenho nenhum sobrinho se casando,
mas o espírito de Natal, provocado pelo pedido da minha Soninha, me fez voltar à infância e eu escrevi dois textos.
Num deles, por mera coincidência, falo das tradições natalinas e relato a minha montagem do presépio.
Escrevemos sobre o mesmo assunto, com palavras bem diferentes.
Aproveitando o ensejo, Bom Natale per te!

Laru disse...

Natale, vc sugere um particular que apenas nós, da longícua primeira metade do século XX, (pelo menos, eu), somos arremessados aos doces anos de nossa infancia, quando tudo era respeitado, horário, hinos, presépio, a missa do galo era mesmo a meia noite etc. Nos remete aos doces anos de nossa infância, mesmo os descrentes ficavam maravilhados com a obediência aos ritos consagrados. Agora "Jesu Bambino" nasce quando a Myrtes quiser e no peso ideal pra um recèm-nascido. Acabamos de montar o presépio e ela colocou o Menino Jesus na mangedoura. As imagens que eu tenho, há vários anos são de porcelana chinesa e bem grandes. Tudo está de conformidade com os tamanhos das imagens, nenhuma foge ao estabelecido, as proporções são respeitadas, menos o Jesu Bambino. Chamei minha mulher e disse:
-Myrtes, o menino Jesus não pode ser colocado no presépio antes do Natal. E tem outra coisa, vc colocou outra imagem do Jesus, por que?
- Porque o original era muito pequeno, todas as outras imagens são grandes e Gesus é o maior de todos, por isso não pode ter uma imagem tão pequena.
- Mas vc não percebe que distoa do tamanho do resto das imagens. A do Gesus é bem maior do que São José e Maria.
- Não tem importância, esse meu Gesus é o maior de todos e está acabado. Se puz antes é porque o meu Gesus nasceu um pouco antes, tem que ser um pouco maior.
Bonita sua mensagem e te agradeço pelas recordações que vc me mandou. Um baccio in testa, caro.
Laru

Wilson Natale disse...

ARTHUR: Eu disse nos texto: "No Natal tudo é importante, menos o aniversariante"!
Um amigo meu dizia que talvez, a importância e significação do Natal tenha se perdido porque deixamos de ser importantes e significantes para nós mesmos.
A lembrança da representação da Natividade nos remete a nós mesmos, ao nosso Eu que, de repente é impulsionado por uma força e esperança há muito esquecidas. Faz-nos lembrar que somos parte do coletivo e não o coletivo. Somos únicos!
Pena que essa força, essa luz que a cada ano emana da representação Jesus é logo esquecida.
Abração,
Feliz Natal!
Natale

Wilson Natale disse...

SAIDENBERG: Boa lembrança essa do "Parenti, Serpenti" Você aprendeu mais uma coisa sobre o "Gesù Bambino" -espero que tenha desaprendido o resto do filme (risos). Senão, eu mando a você um aquecedor a gás... Ahahahaaaa!
Na Itália, mesmo que você não tenha um ou não tenha o presépio inteiro, sempre terá o "letto" (caminha) muito linda à espera do menino Jesús.
Valeu!

Abração,
Feliz Natale!
Natale

Wilson Natale disse...

MIGUEL, que bom!
A idéia é essa,expor a lembrança do cada um. O mesmo assunto visto por vários prismas torna-se muito mais interesante.
Neste texto falo do presépio e do despertar de lembranças adormecidas. E como foi bom relembrar. Foi o melhor e maior presente recebido o ano passado: resgatar a memória!
Abração,
Feliz Natal!
Natale

Wilson Natale disse...

LARÙ, carissimo:
Infelizmente o espírito do Natal vai se perdendo. Não há mais pais, ou avós que expliquem às crianças a significação do presépio. Pena.
E a "signora Myrtes tem toda a razão! A estética padronizpou o presépio. Históricamente o menino Jesus é grande, maior que os outros personagens. Era a forma de representar a grandeza da sua significação.
Valeu o comentário.
Buon Natale pieno di luce!!!

Natale

margarida disse...

Natale,também vivi algo semelhante no passado. A Missa do Galo era uma tradição e toda família,à meia noite ia para a Igreja Nossa Senhora de Fátima e São João Batista, participar desta atividade religiosa. Presentes e ceia só depois de purificar o coração.Tenho um texto publicado no sãopaulominhacidade, chamado Missa do Galo.Seu texto, só para variar um pouquinho, tá lindo demais!Tenha um maravilhoso Natal... um grande abraço.

Soninha disse...

Olá, Wilson!

Sinto imensa saudade dos tempos felizes de minha infância, mesmo pobre, mantínhamos algumas tradições.
A missa do galo era uma delas e, para nós, crinaças, um momento de verdadeira emansipação, pois podíamos saír tarde da noite, mesmo que fosse para irmos à igreja.
Nos arrumávamos com nossas melhores roupas e lá íamos nós, para a Igreja de Santo Emídio, na Vila Prudente, assistirmos a missa do galo. Era glorioso poder voltar para casa, pela madrugada...nossa!
Depois, já em casa, além dos comes e bebes, tinha aquela confraternização simples entre os vizinhos...meu pai e minha mãe íam trocar cumprimentos com os vizinhos mais chegados...íamos também, ou, eram os vizinhos que vinahm nos cumprimentar...
Minha avó também colocava o Menino Jesus em sua manjedoura à meia noite e quando voltávamos da igreja era aquela alegria, que durava pouco para as crianças que tinham de ir para a cama logo depois da confraternização da vizinhança.
Ao amanhecer, nossos corações pulavam de emoção ao recebermos nossos presentes que estavam sob a árvore de natal...
Muitas brincadeiras ao longo do dia...família reunida...que saudade!
Valeu, Natale!
Obrigada.
Feliz Natal. Feliz 2012!
Muita paz!

Soninha disse...

emancipação*

Perdoe-me

Zeca disse...

.

Natale!

Mais um belo texto com o qual nos presenteia!
Mas permita-me discordar da sua frase que diz: "na festa do Natal tudo é importante, menos o Aniversariante".
É que, mesmo com os tempos modernos, onde impera a figura do Papai Noel, as luzes, árvores e enfeites, percebo que o presépio, mesmo resumido às três principais figuras, ainda reina entre os demais! Ele está presente nas decorações do comércio, dos bancos, das indústrias, nas praças públicas e em muitos lares também! Na minha casa é a primeira coisa a ser montada! E já com a imagem do Menino, para lembrar que logo estaremos comemorando o Seu Aniversário! A diferença é que hoje as seitas protestantes estão disputando a tapa os fiéis da igreja católica e os crentes não creem em imagens! Por outro lado, cerimônias como a Missa do Galo, por exemplo, já não podem ser realizadas à meia-noite devido aos novos tempos, dominados pela violência.
Mas o Aniversariante continua presente no coração da maioria das pessoas. Mesmo que esteja meio encoberto por todas as outras coisas que envolvem a data, Ele continua lá, bracinhos abertos, pronto para abençoar cada um de nós!
E é isso que lhe desejo, e a todos aqueles que lhe são caros: as bençãos do Deus Menino, com muita paz, saúde e alegrias. E que no próximo ano continue inspirado por Ele para nos presentear com textos tão belos quanto este.

Feliz Natal!

Abraço

.

ESTANISLAU disse...

Natale, perfeito sua história, principalmente quando diz "que na festa tudo é importante, menos o aniversariante", vejo isso todos os anos em todos os lugares que passo o Natal, mas particularmente , peço aos presente para fazer essa homenagem ao Criador e até rezar um pai nosso, pois da forma que as coisas estão caminhando, logo nem vão colocar a imagem de Cristo no presepio, Feliz Natal a todos com Cristo,Estan.

Wilson Natale disse...

SONINHA: Eram tempos mágicos aqueles!
Tempo em que sonhávamos com o brinquedo maravilhoso que queríamos e nos contentávamos com aquele que "o papai-noel podia nos dar". Era o tempo das famílias reunidas, das brincadeiras.
Hoje, outros tempos, outro modo de vida onde não há nem mesmo a espectativa do presente a receber. Escolhe-se antecipadamente.
Valeu! Abração,
Feliz Natal
Natale

Wilson Natale disse...

PERAMEZZA: Li o seu texto e lembro bem.
O bom de passar junto com a vida é essa bagagem de recordações que todos temos. E que elixir revigorante que são as lembranças, não é mesmo?!
Abração,
Feliz Natal!
Natale

Wilson Natale disse...

ZECA: A frase, no texto foi uma ironia a mim mesmo. Passei pelo presépio. Olhei o presépio e não me dei conta ou percebi se o Jesus estava lá!
E a frase no texto também é uma crítica aos tempos de hoje.
O presépio está em toda a parte. Mas a significação dele parece, perdeu-se.
Tudo antes do Natal exige tempo, trabalho e esforço de grande monta. Mas não se despende um minuto sequer para parar e dedica-lo ao aniversariante...
É bem como a história de um casamento, que me contaram:
Depois da festa, as comadres falavam sobre o casamento. A igreja, a decoração da igreja; a roupa da noiva, dos padrinhos,das damas de honra,dos pais dos noivos: sobre a música, o som do órgão; sobre o disurso do padre...
E uma das comadres pergunta:
E o noivo?
Quase em coro, as outras respondem:
O noivo? Estava lá, oras!...
Jesus está lá, oras! Em todos os presépios!...
Abração,
Feliz Natal!
Natale

Wilson Natale disse...

ESTANISLAU:
É o que sempre faço.Busco sempre entrar em contato com essa energia de fé, esperança e perdão e da certeza que também nosso "reino" não é desse mundo.
Felismente muitos param para ter esse momento com o sagrado da vida, antes de entregar-se ao profano.
Valeu!
Abraços,
Feliz Natal!
Natale

Wilson Natale disse...

ESTAN: Entre os meus erritos, cometí um erro brabo.Leia-se FELIZMENTE em vez de felismente.
Natale

Cida disse...

Natale,seu relato nos transporta a um tempo que só vive na memória dos que o vivenciaram. Uma pena que hoje seja tudo tão diferente (e esse é o preço do "progessso"), porém ainda nos restam as lembranças para dividirmos com os nossos entes queridos. Que Jesus Cristo se faça presente em cada um de nós no Natal e em todos os momentos de nossa vidas.
Feliz Natal.
Cida

Wilson Natale disse...

CIDA: As nossas Memorias são o maior legado que deixamos à posteridade nessa Internet da vida.
Um dia alguém de uma dessas redes sociais vai gostar do que leu e e insentivar os outros a reviver os lindos Natais do nosso passado.
Abração,
Feliz Natal!
Natale

suely aparecida schraner disse...

E Glória aos seus escritostão bem caprichados e que fazem emocionar! Palmas!