domingo, 11 de dezembro de 2011

Relembrando meu primeiro Natal


Aproximava-se o natal de 1955.
Eu morava na zona norte de São Paulo, no bairro da Parada Inglesa, Tucuruvi.
Acabara de completar 5 aninhos e estava empolgado com tudo sobre o Papai Noel.
Em casa e na escolinha esse era o assunto que dominava.
Na rua este tema também acabou entrando na roda.
Eram tempos de simplicidade e de lutas. Mas, nada impedia crianças de sonharem. Cada guri sonhava o seu sonho mais impossível.
Um, queria ganhar um trenzinho, outro, uma bola de futebol, outro um patinete... E eu queria ganhar uma bicicleta.
Na roda, cada um contava a sua vantagem. A imaginação corria solta.
A cada dia aumentava, dobrava o tamanho dos presentes, conforme o desejo de cada um.
Naquela época, a gente não tinha idéia do tamanho da pobreza da maior parte da população.
Não passava pela nossa cabeça que aquilo tudo era um mero exercício imaginativo. Desconhecíamos a real situação de nossos pais e a possibilidade de bancarem nossos sonhos infantis.
O natal estava mais próximo.
Toda manha a gente se reunia para acrescentar um novo item sobre nossos presentes.
A festa da véspera de natal seria na casa de minha avó, que tinha uma casa bem grande.
Dois dias que antecediam o natal, minha avó e suas filhas já estavam nos preparativos para a comilança natalina.
Minha mãe, com certeza, estava preparando um cordeiro temperado com hortelã, comida predileta de meu pai. Minha tia traria um pequeno leitão. Minha avó, com fama de boa cozinheira, ia preparar um pato assado, que ela vinha engordando durante o ano. Fora isso, haveria pavês, rabanadas, pudins e todas as castanhas típicas.
Com a chegada do natal, dava pra perceber que as pessoas pareciam mudadas, mais alegres, com vontade ajudar uns aos outros. Era fácil notar essa alegria.
Não me lembro de ter pedido nada de natal pra ninguém. Mas, me lembro de ter começado um desenho na sala de aula do prézinho.
Era o desenho do meu pedido ao Papai Noel e não sei por que não consegui acabá-lo na escola. Ao pensar nele, me deu certo medo, por que o velhinho poderia ficar sem saber qual seria minha intenção.
Enfim, chegou o dia.
Durante boa parte desse dia, o vento trazia os mais diversos cheiros vindos da vizinhança. Era uma mistura danada que fazia a gente salivar.
Ao cair da noite, foram chegando meus primos e os tios.
Era um falatório e algazarra da criançada.
Comida e bebida à vontade, com o pessoal querendo comer de tudo como se o mundo fosse acabar.
Houve farta trocas de presentes.
Acabei ganhando um pijama, dois pares de meias e uma camiseta. Isso fora tudo que ganhei.
Meio chateado, fui para um canto relembrando que minha vontade era ganhar uma bicicleta. Ninguém falou nada a respeito.
Fui brincar com a turminha e acabei me esquecendo do assunto.
Bem mais tarde, fomos para casa e cai no sono de cansado.
Acordei tarde, quase meio dia, quase pronto pra cair na rua, quando me lembrei dos presentes que ganhara... Fiquei miúdo.
Perdi a vontade de ir pra rua por não ter o que explicar.
Fiquei rodando pelo quintal meio sem rumo e querendo infernizar a vida de meu cachorro.
Minha mãe estava de saída para ajudar no almoço na casa de minha avó, para onde eu iria depois.
Minha mãe estava de saída para ajudar no almoço na casa de minha avó, para onde eu iria depois.
Do portão, minha mãe gritou: por favor, meu filho, recolha para mim uns cobertores que estão aí, no chão do meu quarto. São cobertores que saíram do varal, queria que os guardasse no armário. Depois, você pode ir para a casa da sua avó.
Não gostei nem pouco daquele pedido. Sai resmungando, chutando baldes, pedras e tudo que via pela frente.
Ao chegar ao quarto de minha mãe, notei que havia um monte de cobertores jogados um em cima do outro, que pareciam uma montanha.
Pensei que era muito trabalho para mim...
Não gostei.
Colocando toda minha bronca para fora acabei dando um chutão naquela montanha como se quisesse destruir tudo.
Chutei forte e com raiva... E um grito alto saiu de dentro de mim.
Achei que tinha quebrado o pé, pois acertara alguma coisa bem dura que estava por baixo dos cobertores.
Chorei de dor e de raiva.
Minha mãe voltara rapidinho, pois sabia o que estava acontecendo...
Quando a vi, chorei mais ainda como se minha dor tivesse aumentado.
Disfarçando, ela perguntava o que havia acontecido?
Expliquei a ela o ocorrido e ela disse que eu deveria ver o que havia embaixo...
Correndo tirei um por um dos cobertores. Quando consegui tirar o último, surgiu uma bicicleta, toda azul e com campainha.
Chorei de novo de alegria e de vergonha.
Ria e chorava ao mesmo tempo.
Depois de muitas compressas no local, pude afinal ir pra casa da minha avó levando junto a bicicleta, mas sem ainda poder andar pois a dor estava forte. Somente no outro dia pude felizmente levá-la na rua para mostrar aos meus amiguinhos.
Ah! Com receio que tudo aquilo fosse um sonho, meu pai disse que dormi com as mãos agarradas ao guidão.
No outro dia, percebi que meu sonho sobre o Papai Noel, havia se acabado...
Mas o espírito natalino permanece dentro de mim, com a renovação da vida, da paz e do aniversariante, o Cristo.

Por Luigy Marks

8 comentários:

Arthur Miranda disse...

Luigy, que bela e singela historia, adorei e bem o retrato de cada um de nós quando menino e os pais nos pedem algum favor e a gente faz cheio de uma santa preguiça infantil, parabéns. Dizem que o castigo vem a cavalo, no seu caso veio de bicicleta azul e campainha para mexer e te acordar a consciência. (Risos. Parabéns

Miguel S. G. Chammas disse...

Luigy, que lindo conto de Natal, extraido da vida real.
Teu sonho azul se tornou realidade e você quase não acreditou.
No final, apesar da dor, você pode desfrutar do presente que teu pai, o verdeiro Pàpai Noel te deu. Parabéns!

Soninha disse...

Olá, Luigy!

Bonita história de Natal!
As mães e pais, sempre com a preocupação de atender aos desejos de seus filhos, na medida do possivel... que bacana!
Bons tempos aqueles quando os pais determinavam tarefas para os filhos, mesmo os pequeninos e estes faziam, reclamando ou não, mas, faziam.
Você teve sua recompensa, o seu presente tão desejado, mesmo com dor no pé, para que tivesse um Natal muito querido e lembrado com todo o carinho.
Valeu, Luigy!
Feliz Natal a você e a todos os seus!
Boas Festas!
Muita paz!

Wilson Natale disse...

Luigy,
Lendo os textos aqui publicados percebo que todos esses natais idos e vividos são os meus melhores presentes!
Ai está, no seu e nos outros textos, a ponte que me remete ao universo de todos os natais que que vivemos. As mesmas esperanças, as mesmas desesperançãs; as alegrias dos sejos realiazdos. Enfim, o Natal foi o mesmo para todos nós.
Mas o Natal é feito de espera e esperança. Um dia o presente chega! Se não chega a gente se dá, um dia, o presente.
Você teve a sua bicicleta!... Eu tive aos 23 anos o meu tão sonhado e esperado presente que nunca veio: Um trenzinho elétrico "LYONEL"!
Com o trenzinho na mão percebí que ele foi um presente de Papai Noel. Pois, a cada ano ele me dava forças para que eu realizasse os meus sonhos.
Delícia de Texto!
Abração,
Natale

Zeca disse...

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Luigy!

Consegui me ver dentro da sua história! Toda a ansiedade que nos envolvia nos dias que antecedem o Natal, as incertezas de que nossos sonhos e desejos pudessem ser atendidos e, finalmente, as surpresas! Agradáveis ou não, elas embalavam os nossos Natais e formavam nosso caráter e nossa personalidade.
Eu esperei uma bicicleta por muitos anos. Ganhava belos brinquedos, como um lindo trenzinho elétrico, com estação, casinhas e outros detalhes: maleta de médico, com estetoscópio e outros instrumentos, além de vidrinhos com comprimidos feitos de açúcar que acabaram rapidamente; mas a bicicleta não vinha! Um dia, num daqueles albuns de figurinhas, ganhei minha tão sonhada bicicleta! Mas um acidente feio, com um braço na tipóia por muito tempo, fez com que meu pai a vendesse e, dessa forma, me mostrasse porque eu não ganhava uma! Morávamos numa casa próxima a uma grande avenida, onde o movimento era alto e o risco maior ainda!
Enfim, falando do seu Natal, acabei também falando dos meus...
Escreva mais! Gostei de lê-lo!
E aproveito para desejar a você e a todos os seus entes queridos um

FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO!

Abraço

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margarida disse...

Luigy, que graça de historia, viu só como Papai Noel te atendeu!Lá na rua em que eu morava, no dia seguinte da noite de Natal, todos saiam com seus presentes exibindo aos amigos, era uma farra só.Adorei sua historia, um abraço e um Feliz Natal pra você e toda sua família.

Modesto disse...

Pois é, Luigy, nunca se deve julgar sem ouvir outra parte. Se não fosse a bic, só cobertores, vc deveria agradecer seus pais pois o amor por vc valia (e vale)centenas de bicicletas. Um feliz Natal e Bom Ano Novo. Parabéns, Luigy. Modesto

suely aparecida schraner disse...

Muito bonito e belas recordações infantis. Parabéns.