sábado, 31 de dezembro de 2011

Memórias Natalinas


Estamos em Dezembro, mês de festas, de confraternizações, de religiosidade. Mês das árvores enfeitadas de bolas e luzes. Mês dos presépios representativos do nascimento de Jesus Cristo, desde os mais simples com as figuras de José e Maria, uma manjedoura abrigando Menino Jesus e, ao fundo, um burrico e uma vaquinha, até os enormes e detalhados presépios que abrangem desde a época do nascimento de Jesus Cristo até os dias atuais, numa miscelânea de tempos e objetos.
Pois muito bem, Natal, para mim, é vida, é alegria. Mesmo quando nos momentos mais íntimos, nas horas mais contemplativas, quando a lembrança chega de mansinho e lembro-me da minha velha mãezinha que me deu adeus num final de tarde de 25 de Dezembro e foi ter com a Luz em outro plano, não consigo ficar triste.
Fui criado numa família que respeitava essa data e fazia questão de comemorá-la reunida.
Comemorávamos a Ceia Natalina, servida, impreterivelmente após a alegria das doze badaladas que anunciavam o nascimento de Cristo. Nesse momento nos abraçávamos, brindávamos a data com uma taça de champagne e trocávamos presentes (momento esperado com ansiedade por nós, as crianças).
A ceia era farta, pernil suíno, frangos assados (às vezes um peru), maionese, farofa, arroz, frutas frescas e frutas secas e, lógico, o panetone. No dia 25, ao almoço, tínhamos farta e generosa lasanha, feita por minha mãe e todas as sobras da ceia. Lembro bem,os adultos ficavam à mesa, por muito tempo após o termino da refeição, jogando conversa fora, enquanto nós, crianças, curtíamos nossos presentes e mordiscávamos frutas secas, frutas frescas e doces.
Falar de Dona Thereza é lembrar de vários natais, e lembrar de meus natais é reviver um rosário de emoções. Muitas são as lembranças, entre elas, uma se apresenta e, pululando entre as minhas idéias, busca ser escolhida como a principal. Não conseguindo me desvencilhar dessa inquieta memória, me rendo a ela e a elejo como minha principal lembrança natalina, então cabe agora caprichar no relato, vamos tentar:
O ano não tenho certeza, mas vamos situar-nos como se fora entre os anos de 1948/1950, o local, com absoluta certeza é a minha casa na Rua Augusta, 291.
O Sr. Alfredo (meu pai) numa de suas viagens profissionais comprou um leitão e mandou despachá-lo para nossa casa.
Assim, um belo dia de Setembro, chega em nossa cassa,o alegre e espalhafatoso bacurinho, que deveria ficar solto em nosso quintal e muito bem alimentado para, já gordinho, enriquecer nossa ceia natalina.
Solto no quintal, juntou-se logo com os de igual idade, nós as crianças da casa, eu, meu irmão, minha prima e meu primo. Foi então batizado, ganhou o nome de Pepeu.
Os dias passavam e Pepeu ficava cada vez mais gordinho e cada vez mais amigo, nosso companheiro. Abríamos a porta da cozinha para ganhar o quintal, gritávamos por seu nome e ele atendia ao nosso chamado e conosco brincava.
Eis que, senão, quando adentramos no mês de Dezembro, época do Natal, um belo dia, a sentença foi decretada, Pepeu estava com os dias contados. Iria ser sacrificado para ser copiosamente devorado na Ceia de Natal.
Nós, os companheiros de arruaças do pequeno suíno, iniciamos uma campanha contra sua morte. Choros, rogos, teimosias, desobediências, tudo que era infantilmente possível foi tentado. Mas, de nada adiantou e, no dia aprazado, um vizinho experiente nesse tipo de sacrifício e de olho num bocado de carnes do Pepeu, chegou em casa para cumprir a sentença.
Foi terrível. Ainda hoje tenho em meus ouvidos os guinchos do coitado do Pepeu. Depois de algum tempo, os guinchos pararam de machucar nossos ouvidos e eu tive a certeza, “consumado est”, Pepeu estava morto, assassinado brutalmente.
Foi um Natal meio triste, as crianças, Dona Thereza, Dona Neide e Dona Zazá, tomaram uma decisão, não iriam sequer, experimentar aquela “iguaria”, passariam, se preciso fosse, a pão e água naquele Natal.
Como diz o velho ditado: “Felicidade de uns, infelicidade de outros” a mesa da vizinhança, naquele oportunidade, ficou mais rica, muitos tiveram pedaços do Pepeu para se alimentar.
Nós? Ora, nós passamos muito bem, como sempre passamos, comemos as comidas tradicionais de todos os natais.
Estávamos, apenas, um pouco tristes pois já não tínhamos a companhia de nosso amiguinho, mas, a vida seguiu em frente e novos Natais vieram para ser comemorados.
Por Miguel Chammas

10 comentários:

Memórias de Sampa disse...

Oieeee...

Em nossa casa também tínhamos que passar por esta tortura dramática, pois todos os anos meu amado pai criava os bichinhos para engorda e depois abate para a ceia de Natal e Ano Novo.
Nossa! Como sofríamos, vendo os leitõesinhos e cabritinhos, que já eram nossos amiguinhos, serem sacrificados para enriquecerem nossa mesa!
Era um chororo só, da criançada.
Eu, particularmente, nem comida estas iguarias...quando muito experimentava o frango e com reservas...
Ô dó!
Bacanas suas lembranças dos Natais, amor.
Valeu!
Muita paz! Beijosssssssss

Arthur Miranda disse...

Agora eu sei suas razões para ser palmeirense: Foi o Pepeu.
E passei a compreender seu ódio pelo Corinthians: Foi inspirado nesse seu vizinho corintiano, que como bom corintiano estava acostumado a matar porquinhos.kkkkkk. Bela historia Miguel e muito reveladora. Feliz 2012 a você e a todos os seus. Isso se 2012 não acabar logo de inicio.

Luiz Saidenberg disse...

Pobre Pepeu, caro Miguel. Sua descrição dos Natais de antanho é ótima, mas aí entra o Pepeu para entristecer a festa.
Eu teria perdido todo o apetite, e vejo que o fato marcou tb você até hoje.
Por sorte, nosso brazado de leitão foi comprado, morto e congelado, no supermercado, e assim nem lembramos de que foi um belo ser vivo.
Abraços e feliz 2012!

Luiz Saidenberg disse...

Por falar em final dos tempos, vi uma ótima no Facebook: um maia entra com o calendário de pedra na mão e comunica a seu rei- Não dá para escrever mais. Só coube até 2012!
E o outro-Tem muita gente que vai ficar louca por causa disso, um dia!

Cida disse...

Olá, Miguel, gostei do seu texto, fiquei pensando: "Bem na Rua Augusta?" Quem diria!Bons tempos, né?
E é assim mesmso a reação das crianças, que se apegam aos animais.
Espero que tenha passado um ótimo Natal e a virada na praia (foi assim?). Feliz 2012 a vocês.
Abraços
Cida

margarida disse...

Miguel, sua ceia de Natal era bem semelhante com a que mamãe fazia lá em casa. Quanto ao bichinho que virou companheiro, eu também não o comeria. Mão posso nem pensar como morrem estes bichinhos, aí que não como carne mesmo, já que não é meu prato favorito. Espero que seu Natal tenha sido ótimo! Um grande beijo.

Wilson Natale disse...

MIGUEL: Pela mesma razão, como você, não como porquinho até hoje. o nosso porquinho foi salvo! Mas ao custo de muitas lágrimas ,que eu meu irmão e primos tivemos que derramar e implorar de joelhos.
Como você, não sei se isso é trauma ou lembrança, abstive-me das carnes e atacava a maionese no Natal e Ano Novo. Leitãozinho à pururuca, pernil, presunto, passo batido.
Abração,
Natale

Laruccia disse...

Miguel, um leitãozinho preparado sobre a mesa de Natal, chega a ser até simpático diante de "sorriso" malogrado do pequeno animal transformado em apetitoso prato principal. Isto por que vc não teve intimidades com o bichinho antes de ele ser sacrificado. Mas, o inverso é por demais pesaroso. Ainda mais tratando-se de crianças, que tem no bacuri um brinquedo, sem precisar dar corda nem empurra-lo, só correr pelo quintal e ele seguindo os garotos, querendo participar dos folguedos. E, de repente, acaba a brincadeira, não por que o brinquedo quebrou mas sim porque ele vai desaparecer, vai ser devorado... Numa dessa, pode até criar ogeriza pela carne de porco (que não é seu caso,né Miguel?). Um forte abraço a vc, Miguel com os votos de um feliz e próspero ano novo de 2012, extencivo a Sonia e a todos os membros de sua família.
Laruccia

Zeca disse...

.

Miguel!

Não tínhamos, em casa, o costume de criar porcos, mas tínhamos um enorme galinheiro onde, durante o ano, eu e meu irmão, acabavamos adotando e batizando alguma galinha... risos. E quando chegava o momento de sacrificá-la em prol de uma refeição mais caprichada, sofriamos a mesma tortura, fazíamos as mesmas pirraças e nos recusavamos a comer aquela carne...
Acabo de ler seu texto, pois voltei para casa apenas ontem.
E por coincidência, ou ironia do destino, hoje cedo comprei - no açougue - um lombinho que assei no forno, com batatas coradas que ficou - hmmmmmmmmmmmmm - uma delícia!

FELIZ 2012!


Abração.

suely aparecida schraner disse...

Miguel,
Ai que dó! Como presunto "de boa", porque não associo a coisa à pessoa. Agora, aqueles leitões inteiros à mesa, nem pensar... Bela crônica!