“ Compadre, vengo sangrando desde los puertos de Cabra. Si yo pudiera,
mocito, ese trato se cerraba. Pero yo ya no soy yo, ni mi casa es ya mi casa”
[Federico García Lorca, Romance Sonámbulo, em Obra Poética Completa]
Explosão
de cores e buzinas, a pontilhar tarde invernal paulista com numerosos pontos de
luz. Acordes andinos. O grupo com suas vestimentas típicas, toma de assalto a
calçada da esquina da Praça Floriano, em SP. Munidos de suas quenas (flautas) e
zampoñas (flautas de Pã), rasqueados de violões, charangos, e marcações
rítmicas de bombos lagueros.
Pintar a
vida de imigrantes, com cores e acordes de sonhos mutantes. Eles estão por toda
parte. Por vezes, são confundidos com índios ou japoneses. Gente de pele
morena, cabelos lisos e olhos puxados. Movidos a sonhos de melhores
oportunidades. Fugindo da miséria em busca de oportunidade. Precariedade.
Segunda maior comunidade de migrantes na cidade. Atrás apenas de portugueses, e
superior a chineses e peruanos. São Paulo, cenário de passos e descompassos.
Cidade que abraça e também sufoca.
Expressões
sérias, solenes. Ainda pulsa a lembrança do menino assassinado por chorar e
também porque os pais não tinham mais dinheiro. Residência provisória em
cubículos. Tirar o RNE (Registro Nacional de Estrangeiro), só com emprego
regular e renda. Por trás das máquinas de costura muito suor e sangue. Na luta
contra o preconceito vencendo dificuldades. Um medo travado que paralisa a voz
e suga a crença na justiça. Violência a estancar a fé e motivar a meia volta. Volver
à terra natal. O que mais se deseja: “La paz”.
Dias de
angústia e silêncio. A violência que fascina e tange. Violência grátis sem
necessidade de passaporte. Em acordes dissonantes.
Por
Suely Schraner
16 comentários:
Suely, por incrível que possa parecer, você pintou em cores harmoniosas e de forma poética, a saga desses imigrantes em nossa querida São Paulo.
São eles, escravos brancos da nova era, presos aos grilhões das máquinas de costura para locupletar os
bolsos de seus exploradores.
Adorei te ler.
Olá, Suely!
Quanto estrangeiros vem para Sampa, com os corações cheios de esperança de vidas melhores e se deparam com a realidade dura das grandes cidades...
Um texto simples e lindo, mostrando nossa dura realidade.
Obrigada por voltar aqui. Obrigada pelo texto.
Muita paz! Beijosssssss
Oi, Suely!É bem verdade que a inspiração dessa poesia seja a tragédia do garoto assassinado por um selvagem, porém, os acordes dessa melodia em forma de texto, são de uma beleza extraordinária, uma ode mensageira de paz entre tanta carnificina. Vc emocionou-me, uma escrita extraída do fundo do coração, compatível com um perfil humano e cheio de bondade, ternura e caridade. Parabéns, Suely, vc merece.
Laruccia
Suely,eles chegam com a esperança de uma vida melhor, mas não sabem o que os espera. Aproveitadores usam e abusam deste povo simples que querem apenas viver melhor e em paz. As surpresas doloridas acontecem e aí voltar é preciso. Sinto pelo ocorrido, aliás não deveria ter acontecido...Lindo seu texto! Um grande abraço.
Muito bela a luta de mais este exôdo que se transferiu para São Paulo em busca de melhores dias. Humildes, à princípio, mas certamente logo progredindo. Você pode encontrar feira e reuniões deles na Pça. Cantuta, travessa da Cruzeiro do Sul. E ali comer uma bela empanada. Abraços.
Suely, belissimo texto, com pinceladas de luz no meio da luta, sangue e máquinas de costura. Parabéns. Receba o meu abraço, Vera Moratta.
SUELY:
Texto lindíssimo!
Sempre acreditei que São Paulo é o início da metamorfose, onde os oprimidos vão aprendendo e se rebelando contra tudo aquilo que lhes tiram a liberdade.
Abração,
Natale
Miguel: Adorei seu comentário.Muito obrigada! De fato, eles são os escravos da modernidade.
Soninha: De fato: migrantes e imigrantes chegam cheios de ilusões. A cidade grande nos seduz e nos traga com a mesma facilidade. Obrigadíssima pela acolhida."Tamo junto".Beijos.
Laruccia: Sua alta sensibilidade e amáveis palavras me comovem. Gratíssima. Abraço
Margarida: Aproveitadores há em todo lugar e aqui não é diferente. Sonhos também. “Assim caminha a humanidade”, né não? Beijos e grata pela visita.
Luiz Saidenberg: É verdade: alguns chegam e se desiludem entretanto, muitos progridem. É a cidade “frente e verso”. Grata pelo comentário e dica. Qualquer dia, vou lá na praça Cantuta.
Vera: Minha nossa, garota! Suas pinceladas me atraem e também adoro seus textos. Muito obrigada e grande abraço!
Vera: Minha nossa, garota! Suas pinceladas me atraem e também adoro seus textos. Muito obrigada e grande abraço!
Suely!
A violência escorre pelas paredes e se mistura ao asfalto da nossa cidade, assim como se dissemina por todos os lados e por todas as cidades deste enorme país. Nós, vitimados pelo medo que ela causa, viramos os olhos e parecemos não perceber a presença silenciosa de pessoas como eles, que também procuram aqui, o seu lugar ao sol. Você captou em imagens coloridas esse povo quase invisível que, em pleno século XXI é abusado, escravizado e ignorado. Foi preciso um crime bárbaro para que eles surgissem, com seus sons e suas cores, diante de todos!
Parabéns pelo belíssimo e poético texto!
Abraço.
Muito obrigada, Zeca! De fato, a invisibilidade dói. Muitas vezes nosso caminhar não percebe as diferentes nuances da face da violência e descaso.Seus textos também são belos e poéticos. Abraço.
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