È engraçado que sempre fui movido a cinema, desde a infância. E, ao contrário do que poderia ter acontecido, não me tornei um expert no assunto, nem mesmo fui
trabalhar em alguma área ligada à sétima arte. Se bem que, quando tinha por
volta de 14 anos, rodaram um filme com algumas locações no prédio do colégio
onde fazia o curso ginasial e fui o escolhido para ser o amigo do protagonista.
O filme se chamava, se não me engano, “Entre Deus e os Homens” e contava a
história de um rapaz (o protagonista) que estava dividido entre seguir sua
vocação religiosa, entrando para o seminário, exatamente no momento em que
conhecera e se apaixonara por uma colega de ginásio.
Foram horas e dias de preparação, maquiagem pesada (coisas da época) e
ensaio das (poucas) falas que tinha nos diálogos com o protagonista. O diretor
deixou um cartão com meu pai, dizendo que se eu quisesse tentar a carreira
cinematográfica, ele teria o maior prazer em me ajudar, já que acreditava que
eu tinha algum talento para a coisa. Mas, assim como o filme que nunca estreou,
em casa também, as coisas esfriaram e, a minha vida seguiu sem maiores
sobressaltos. Até minha experiência no teatro – no teatro do colégio, claro! – também
não vingou. Estavam ensaiando a peça “Morte e Vida Severina” e eu fui escolhido
para viver o Mestre Carpina. Começados os ensaios, eu peguei uma pneumonia
muito forte e fiquei uns dois meses em tratamento, o que motivou a diretora da
peça a colocar no meu lugar uma colega (uma
colega!) Me trocaram por uma menina, veja só! Mas aí também morreu minha
iniciativa como ator de teatro.
Já contei também que, quando criança, participava de um programa de
calouros numa rádio que funcionava ao lado do Cine Maringá, no Jabaquara. E
como cantor, essa também foi minha primeira e última experiência.
Mas fora essas esparsas experiências, sempre fui um fã do escurinho do
cinema, que me proporcionava vivenciar sonhos, desde os infantis, passando
pelos juvenis e, depois, sonhos de adulto mesmo. Não tenho a menor vergonha em
confessar que sempre fui e continuo sendo um sonhador! Lembro perfeitamente das
infinitas lágrimas que derramei assistindo (várias vezes) o filme “Marcelino
Pão e Vinho”! E também chorei muito no filme “Bambi”! E até hoje, já sessentão,
continuo chorando quando assisto filmes, seriados, novelas e até alguns
programas de auditório.
Assisti muitos filmes nesses mais de sessenta anos de vida. Tantos que
me sinto incapaz de fazer uma lista dos que mais gostei ou que mais me
marcaram. Mas existe um que é uma espécie de marco em minha vida!
Talvez até mesmo um ritual de passagem! É um filme de 1964, que deve
ter estreado por aqui, talvez dois anos depois, que era mais ou menos o tempo
que as produções estrangeiras demoravam para chegar ao nosso país. Eu deveria
estar próximo dos dezoito anos quando o assisti, e posso dizer que não conhecia
os atores e atrizes, muito menos diretor ou autor. Fui vê-lo pela curiosidade
de assistir um filme Greco-americano, que havia sido premiado em várias partes
do mundo, mas não conseguiu nenhuma indicação ao Oscar, embora os críticos e o
público o tivessem adorado. E eu fui imediatamente seduzido pelos encantos
todos desse filme tão peculiar quanto diferente de tudo que havia visto até
então no cinema!
A dobradinha Anthony Quinn e Alan Bates foi cativante. Bates é Basil,
um jovem escritor inglês que chega à Grécia com a finalidade de tomar posse de
uma mina deixada como herança por seu pai. Ele está passando por uma crise de
criatividade e acaba embarcando nessa viagem em busca de suas origens mais por
inércia do que por idealismo. Enquanto
espera para embarcar no navio que o levará a Creta, conhece um grego simples e
muito entusiasmado que o convence a levá-lo consigo como intérprete e
cozinheiro. Esse grego é Zorba e, a partir dessa amizade, várias experiências
inusitadas levarão a vida pacata de Basil a uma reviravolta total. Ele vai
passando de observador passivo do mundo a participante ativo de sua própria
vida. Em contato direto com uma cultura totalmente diferente da sua, ele é
chamado por Zorba à vida e aos seus prazeres e aprende que é o único
responsável por suas escolhas e ações.
Esse filme mostrou a cativante representação de uma amizade
improvável, colocando lado a lado maneiras opostas de encarar a vida: a de um
veterano homem do povo, cheio de sede de viver e a de um jovem recatado e
burguês, que se contentava em observar a vida através de uma janela. O
desenrolar de conflitos através dos caracteres específicos de cada personagem
foram explorados com gosto pelo elenco e se converteram em autodescobrimento e
em louvor à vida em toda sua plenitude.
As presenças marcantes de Lila Kedrova (Madame Hortense) e de Irene
Papas (a viúva que se comunicava mais com a fisionomia e com o silêncio do que
com palavras) foram importantíssimas para o total entendimento desse filme.
E coroando tudo isso, a fabulosa
“dança de Zorba”, que até hoje faz sucesso em todas as partes do mundo. O tema,
“Sirtaki”, de Mikis Theodorakis, foi interpretado magistralmente por Anthony
Quinn que, dançando na praia, chama o personagem de Alan Bates à vida,
culminando em uma explosão de alegria e determinação. Não posso deixar de dizer
que “Zorba o Grego” foi dirigido competentemente por Michael Cacoyannis, que
soube extrair o melhor do reduzido elenco, criando um grande e inesquecível
filme.
Saí do cinema num estado de
encantamento pela vida que me deixou leve, como se estivesse flutuando. E esse
encantamento me transformou num apaixonado divulgador, motivando muitas outras
pessoas a assistirem o filme. E sempre que podia, lá ia eu, novamente, me
deliciar com essa obra de arte.
Eu era um jovem moderno. Também era
moderado. Talvez pelo passado católico e pela passagem pelo seminário, era
discreto, estudioso e já gostava de escrever. Usava óculos, roupas sóbrias e,
talvez por tudo isso, os colegas logo me identificaram com Basil, o jovem
escritor do filme. Mas... como eu já usava - uma das novidades recém lançadas
no mercado – as cuecas Zorba, acabei ganhando o apelido de “Zorba”, que me
acompanhou ginásio afora.
Vieram outros (muitos outros)
filmes, outros personagens, outras histórias. Mas de todos, o que jamais saiu
da minha memória, o que mais mexeu comigo, o que mais me influenciou diante da
vida, sem sombra de dúvida, foi esse: “Zorba o Grego)!
Se alguém quiser assistir à dança do
Zorba, basta clicar sobre o link a seguir: http://youtu.be/6LmQtlPNcLA
4 comentários:
Zecamigaço, ler teu texto relembrando Anthony Quinn e Zorba o Grego me levaram ao passado e me fizeram rever a beleza da dança.
Obrigado!
Zeca, (Zorba), também assisti a esse belo filme e fiquei tão entusiasmado como vc. E olha que o Anthony Quinn era mexicano, não tinha nada de grego. Mas ele sempre foi um grande ator, mesmo quando interpretou filmes italianos. Começou com "Sangue e Areia", junto a Tyrone Power. Depois estorou nas telas com grandes fimes. Gostei muito de sua narrativa a respeito, Zeca, parabéns.
Modesto
Zeca, muito bom conhecer um pouco de sua historia de vida, com certeza ela foi privilegiada. Sou da teoria que nunca é tarde para transformar nossos sonhos e desejos em realidade, não desista e continue em busca dos seus sonhos: um interprete ou um cantor....já tem uma fã.Parabéns pelo texto.
ZECA:
Boa Lembrança!
O filme nos ensina a tirar bons momentos da vida, das coisas mais simples.
E, acredito,seja qual fosse o ator, não conseguiria dar vida ao personagem como o fez Anthony Quinn.
Abração,
Natale
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