quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Corpo e Alma



Acordei hoje com um pensamento.
Há um prédio deteriorando-se na cidade   
Uma pequena construção agregada ao grande colégio alemão cai aos pedaços e eu acordei pensando nele.
Volto no tempo.
Vivíamos todos na busca do melhor. Humildes, deixávamos nosso trabalho e íamos em busca do conhecimento. Éramos ricos, não obstante a escassez de recursos e as finanças sempre combalidas.
Éramos ricos pois tínhamos a todos, diariamente. Ternos e gravatas, nós; alinhados vestidos ou saias elas, mas juntos convivíamos nossa busca  do sonho de cada um.
Velho Ozanam da Roosevelt e da Augusta. 
Ah nossos sonhos. Éramos a busca e também os próprios sonhos. Aulas intensas, completas e muito mais.
Atividades extracurriculares, como seria possível tantos profissionais agregando a atividade Ozanam aos seus dias
A fanfarra entoando nos desfiles; o jogral desfilando na cultura, o desenho do blusão da escola, o centro de mesa da formatura, o teatro, o vôlei entre as aulas ajustado ao pequeno espaço que tínhamos  naquele modesto prédio agregado ao grande colégio alemão.
Os alunos mais jovens -  tal como eu – quase criançolas, (às vezes invejando os mais velhos), buscávamos imitá-los, estes por sua vez  compartilhando livros, aulas, provas  e grandes negócios profissionais (e às vezes dando uma olhadinha nas nossas provas).  As moças em seu labor diário, seus fichários impecáveis, suas aulas bem marcadas. Tudo se constituía num conjunto harmônico de companheirismo e vida.
Mestres nos tratavam como iguais, como se iguais fossemos; nós os tratávamos como deuses, como se deuses fossem.  Éramos nós e eles a alma daquele corpo que nos abrigava. Propositadamente deixo em falta nomes. A mea culpa seria maior se esquecesse algum, de tantos que me encantaram na minha passagem por lá.
 Não esqueço dos bilhetes das moças pela manhã; a resposta dos moços pela noite, geraram amizades, namoros, casamentos.
Velho Ozanam da Roosevelt e da Augusta, gera em mim apenas boas lembranças.
Há um prédio deteriorando-se na cidade.
Afloram em meu pensamento sentimentos únicos de gratidão e jubilo. Sete anos passei naquela construção e, perdoe-me Camões, outros sete anos mais passaria se pudesse revive-los e sonhar o que naquele tempo sonhei, repasso por toda vida o que naqueles sete anos aprendi.
Não tenho saudades, tenho apenas boas recordações.
Durmo hoje com um pensamento o que sempre aprendi e que me faz ter sempre vivo.
O corpo é frágil, deteriora-se, morre, mas a alma, esta é imortal.



Por José Carlos Munhoz Navarro

4 comentários:

Soninha disse...

Olá José Carlos!

Colocando o blog em dia novamente...
Agradeço por este belo texto de suas lembranças. Tenho certeza que muitos dos leitores irão se emocionar.
Escreva mais. Uhuuu!

Sonia Astrauskas

Miguel Chammas disse...

Zé, este texto foi mágico. Me fez sair do ostracismo dos meus quase 80 invernos e voltar ao jovem que fui um dia com todas as lembranças daqueles anos vividos na companhia de meus irmãos ozanenses. Pura magia para alentar um coração agora um tanto combalido.
Espero que essas memórias possam ser um forte sopro e consigam reascender meu gosto de escrever.
Obrigado amigo irmão pelo calor que devolveu ao meu coração, estava precisando muito.
Escreva mais, por favor.

Leonello Tesser (Nelinho) disse...

Que belo texto caro Navarro! ne transportou também aos meus tempos da Escola Técnica de Comércio São Carlos aquí no Ipiranga! parabéns caro amigo por mais essa narrativa!

Teresa disse...

E lá se vão mais de 50 anos, mas a lembrança permanece intacta. E você soube retratá-la sem ser piegas. Continue nos brindando com seus textos, Munhoz. Faz bem para todo mundo.