Contar
um conto é acrescentar um ponto. O mesmo acontece com as lendas urbanas. Como
no conto, ou causos, as lendas urbanas podem aumentar o seu conteúdo sem que os
acréscimos interfiram no conteúdo original.
Outras
vezes a lenda urbana nasce de um fato inverídico, de uma situação fictícia que,
no efeito dominó que é a lenda, vai virando verdade e é acrescida de outras
verdades falsas...
Meu
sobrinho Alexandre contou-me o que lera em um desses blogs da vida. Blog
voltado ao insólito.
Alex
falava-me dos assombramentos do edifício da Fundação Cásper Líbero. Dizia-me
que, por lá, os fantasmas faziam das suas.
Eu,
ouvindo, não sabia se devia rir à beça, ou interromper. Deixei que ele
continuasse a narrativa. Queria ver aonde ia dar essa - para mim - novíssima
lenda urbana.
Contou-me
que, desde o Colégio Objetivo aos estúdios da Rádio e da TV Gazeta, os
fantasmas “faziam das suas” na Fundação. Falou-me mais: Que conversando com os
amigos soube de muitas histórias aterradoras acontecidas por lá. Disse-me que o
pai de um amigo, no tempo em que lá fazia o Cursinho, vira o fantasma de uma
estudante que se suicidara no banheiro. Outros contaram que muita gente entrava
no elevador, dizia à ascensorista o andar em que iria descer e, ao abrir-se a
porta no andar desejado, a ascensorista havia desaparecido... E eu sufocando de
tanto conter o riso...
Falou-me
de efeitos físicos. Que fantasmas escondiam coisas, batiam em portas, chamavam
as pessoas pelos nomes, etc., etc..
Alexandre
foi falando, descrevendo... Eu ouvindo e sufocando...
Complementou
dizendo que a causa, a razão do prédio ser tão assombrado era o fato de que ele
foi construído em solo amaldiçoado. Que naquele local, há muitos e muitos anos,
existiu um pelourinho, onde escravos foram chicoteados até a morte...
Não
deu para segurar mais. Explodi em ruidosa gargalhada.
Meu
sobrinho, abestalhado e com cara de interrogação, olhava para mim. Eu, findo o
ataque de riso, contei a ele a verdadeira história do assombramento da
Fundação:
Nunca
houve pelourinho no terreno da Fundação. Houve um pelourinho sim, ou melhor, um
“tronco”, lá na região do Paraíso, local onde existiu a Chácara do
Quebra-Bunda, lugar onde muito dono de escravos levava os seus infelizes para
serem chicoteados sem piedade, até ficarem descadeirados. Daí, vem o nome da
chácara que pertenceu a José Veloso de Oliveira.
Contemporâneo
do Cursinho, depois Colégio Objetivo, eu nunca ouvi falar, li, ouvi - nem no
rádio ou televisão - sobre morte natural ou suicídio no Colégio.
E,
do Objetivo aos estúdios da TV Gazeta, jamais alguém falou dos tais fantasmas.
E, também, nunca se falou, ou se noticiou algo sobre a tal ascensorista que
aparecia e desaparecia.
Esta
lenda urbana nasceu de uma piada e “pegadinha” que circulou por São Paulo
inteiro. E está ligada, não ao prédio da Fundação, mas à TV Gazeta.
A
TV Gazeta, canal 11 foi inaugurada em grande estilo. Tudo nela era de primeira
linha. O último grito em tecnologia televisiva! Afinal ela fora criada para fazer
parte da Faculdade de Comunicação da Fundação Cásper Libero. Porém, alguma
coisa acontecia com a transmissão. Nos aparelhos do estúdio, a imagem era
perfeita, mas nos receptores caseiros a imagem era ruim, distorcida, com
movimentos horizontais e verticais. Os apresentadores apareciam duplicados, ou
com uma aura a que chamávamos “fantasmas”. Não havia regulagem de antena,
interna ou externa que solucionasse o problema. Algumas pessoas instalavam uma
antena somente, para de forma sofrível, sintonizar a Gazeta.
Muitos
diziam que o problema era o local, onde havia outras antenas mais potentes,
tanto das rádios como de televisão. E a imagem só melhorou quando a TV Globo,
por concessão, instalou a sua antena de transmissão no prédio da Fundação e
nela adicionou os novos transmissores da TV Gazeta.
Naquele
tempo, eis a piada e a “pegadinha” circulavam pela cidade:
“Você
sabe qual é o lugar mais assombrado de São Paulo”?
“Sei,
não... Qual é”?
“É
a TV Gazeta! Ta assim de fantasmas lá”!
“Nossa!
Preciso ir até lá, para ver”!
“Precisa
não! É só ligar a TV e sintonizar a Gazeta”!...
“E
ai, Zé! Ce sabe qual o local mais assombrado de São Paulo”?
“Não”...
“É
a TV Gazeta”! Ta assim de fantasma, ó!...
Tai,
a piada e “pegadinha” que deu origem à lenda urbana do prédio da Gazeta.
por Wilson Natale
11 comentários:
Natale, o grande historiador tem que estar por dentro de tudo.
Você mais uma vez prova os seus conhecimentos e os descreve num texto delicioso.
Este comentarista confessa que também não achava crivel essa estória de fantasmas no pedio da Paulista. Se o causo tivesse ocorrido no antigo endereço da Gazeta, lá na região da Santa Efigênia, as possibilidades fantasmagóricas teriam maior sustentabilidade.
Aí está, Natale e sua verve maravilhosa contando mais uma história pra nos deliciar. Realmente, nunca ouvi falar desses fantasmas mas, como diz d. Paquito Rivera, ...no lo creo mas que existem es verdad". Caro Wilson, anche Nicola di Bari dicce "si non'e vero é ben trovato".
Un baccio, fratelo mio.
Laru
Natale, nem eu sabia da existência dos tais fantasmas da Gazeta, mas os "fantasmas" na imagem do canal de TV da emissora esses realmente existiram antigamente.-
Natale,
mais um belo texto escrito com maestria por você! Fui estudante do Objetivo e também da faculdade (embora, nesta, por apenas dois meses!) e jamais ouvi tais histórias. Nem testemunhei qualquer "aparição" assombrosa! Existiam, sim, as "assombrações" de sempre, mas eram de carne e osso, correndo atrás dos alunos, na tentativa de seduzí-los. É que, ali em frente, abaixo da escadaria, ficavam "mocinhas de vida não tão fácil"! É, amigo! Naquela época já havia as mulheres mais atiradas... kkkkkkk
Abraços.
Natale, para mim uma grande novidade a existência dos fantasmas da Gazeta e pelo que vi é serio o dito: quem conta um conto aumenta um ponto. Meu pai e meu tio já falavam desses "outros" e cresci em uma casa onde perambulavam alguns deles pois barulhos estranhos é que não faltavam, fora a sensação de que sempre tinha alguém por perto, dava arrepios.Este texto me fez lembrar coisas do passado,gostei muito. Um abraço.
Aproveitando esse domingo de "dolce far niente" aqui.em Antonina (PR), vou comentando.
MIGUEL:
O tempo passa e os causos recebem novos aditivos.Como este, da Gazeta.
Com certeza o velho prédio d'A Gazeta teria muito o que contar.Não somente causos insólitos, como causos e História dos jornalistas que fizeram a fama da A Gazeta e da A Gazeta Esportiva.Do fim dos anos 50 e anos 60,eu lia com avidez a Gazeta Esportiva, prá saber da vida do meu "Parmêra". Lembro que, qualquer botequim que se prezasse tinha a Gazeta Esportiva à disposição dos freguêzes.
Valeu!
Abração,
Natale
LARÙ, caro mio!
Anche io penso lostesso: Se non'è vero, è ben trovato.Ahahahahaaaa!
Un bacione in testa.
Natale
NELLO:
Pois é. E veja você, por causa da péssima imagem gerada pela TV Gazeta, o quanto se inventou, se criou, ao ponto de virar uma lenda urbana.
Valeu!
Abração,
Natale
ZECA:
Nem eu sabia. Tanto que me maravilhei com a criatividade da molecada sobre esse causo, que não era um causo, mas um simples problemas técnicos (risos).
E você tem razão,as "assombrações" ficavam fora do edifício da Gazeta. E entre essas assombrações havia aquelas assombrações do tipo "quanto mais eu rezo, mais assombração aparece".
Ahahahahaaaaa!
Abração,
Natale
PERAMEZZA:
Valeu!
Postei este texto para exemplificar como nasce e se desenvolve uma lenda urbana.
Esta que nasceu há mais de 40 anos vem recebendo acréscimos e misturando os dados de outras lendas urbanas.
E todos nós vivemos situações insólitas que, com certeza, valem fazer parte de nossas memórias.
Que tal contar a nós alguns desses episódios vivido por você?
Abração,
Natale
Olá, Wilson!
Um dia destes, de folga, fiquei zapeando pelos canais da TV e parei num programa da Gazeta, destes que passam à tarde, sobre variedades, etc...
E num dos quadros, a apresentadora (Katia Fonseca) e a partner (Mama Brusqueta)falavam justament sobre as coisas estranhas que acontecem pela Gazeta... barulhos estranhos, rangeres, sombras, efeitos estranhos, etc...
Elas disseram que morrem de medo de andar sozinhas pela emissora. kkkk
Lendas ou não, muita gente tem algo pra contar sobre os mistérios da Gazeta.
Valeu!
Muita paz!
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