Antigamente
era um tempo, lá distante, nos primórdios dos anos 70, onde a minha vida de
casado ainda não se estabilizara completamente. Os perrengues por falta do tutu
eram, como aliás sempre foram, são e serão, nossa maior preocupação.
Ora
muito bem, um belo dia prestes a ser despejado por “desequilíbrio financeiro na
quitação mensal de alugueres”, depois de muito batalhar, consegui locar um novo
imóvel. Era um apartamento no último pavimento de um prédio que havia sido construído
de cima para baixo, ou seja, o último pavimento era, lógico, o primeiro,
contando do final do barranco para cima. Apartamento novo, bem construído, na
medida certa para um casal que não se importasse em ter o berço da primeira
filha no próprio quarto.
Então,
depois de longas entrevistas com o proprietário, satisfeitas as formalidades de
locação, mudamos para a Rua Professor Pirajá da Silva, 141- apartamento 01.
Eram poucas as nossas tralhas e não tivemos dificuldades em transportá-las até
nosso apartamento. A vida seguiu em frente, ou seja, entre trancos e barrancos,
fomos empurrando com a barriga e vivendo cada momento.
Como
já informei, o prédio era construção nova, e, assim, poucas unidades das 8
existentes (contadas as duas erigidas nos fundos do terreno) estavam ocupadas.
Um
dia, sentado em minha sala de cuja janela eu podia desfrutar da vista total da
escada de acesso às vi que uma mudança
estava sendo processada para o apartamento contiguo ao meu.
Não
tive contato com meus novos vizinhos, mas
através da “radio vizinhança” fiquei sabendo que ela trabalhava em salão de
beleza, como manicure e ele era corretor de imóveis, soube também que tinham,
como eu, uma única filha.
Passados
os primeiros dias, nossos relacionamentos tiveram inicio, primeiro com pequenos
cumprimentos, depois com algumas poucas palavras até se transformarem em
verdadeiras amizades, as quais até hoje cultivo com imenso carinho, tendo me
transformado, inclusive, no padrinho da terceira filha deles, muito embora já
fosse pai virtual da primeira e padrinho reserva da segunda.
Agora
entramos no verdadeiro âmago da minha narrativa. A primeira filha desse casal, de nome Tereza Cristina e
de apelido Pituca.
Entre
nós, desde o primeiro contato aconteceu uma empatia fantástica, e em contra
partida minha filha Renata, única também na época, se apaixonou pela Benilde, mãe da
Pituca.
As
duas meninas brincavam muito e brigavam demais. A troca de carinhos e de
mordidas era fora do comum. No entanto uma não conseguia ficar longe das outra,
e assim viviam, entre brigas e carinhos, ora na minha casa, ora na casa ao lado.
A
Pituca era tão enrabichada comigo que muitas vezes, depois de umas palmadas ou
bronca de sua mãe, corria para perto de mim e declarava em alto e bom som que
preferia ser minha filha.
E
assim as coisas iam caminhando e nós, os pais, cada vez mais consolidávamos
nossa amizade.
Certa
vez, por motivo da visita de nossa prima Maria Elisa e de seu noivo o Wladimir,
preparamos uma feijoada. Nossos vizinhos foram também convidados. O Rovilson,
por motivo de trabalho, não poderia participar, mas a Benilde iria sim. Todos
reunidos, antes da bóia, foram preparadas as caipirinhas de costume, que
servidas começaram a ser consumidas.
O
Wladimir, não sei dizer por que, num certo momento, descansou seu copo quase
que totalmente cheio no beiral da janela da sala e foi para cozinha lá permanecendo por um bom espaço de tempo.
Eu
que também estava na cozinha, não sei por que, me dirigi à sala e lá chegando
me deparei com a Pituca deitada no sofá, com o rosto muito pálido.
Choramingando
ela pedia a presença da mãe que, por mim alertada, atendeu prontamente.
Começaram,
então os palpites para tentar descobrir o que havia acontecido com a Pituca, “é
fome”, “não, acho que o leite não lhe fez bem”, “foi isso” ou “será que foi
aquilo?”
Eis
que, senão, quando o Wladimir pergunta:
Quem bebeu toda a minha caipirinha?
Pronto,
estava descoberta a causa do mal estar da Pituca. Uma tremenda bebedeira.
Corre-corre
da mãe e das visitas para levá-la ao PS onde foi medicada e voltou para casa
curtindo tremenda ressaca.
Para
concluir a aventura, nos os adultos fizemos um pacto moral de nada contar ao
Rovilson para evitarmos problemas maiores e estresses demasiados.
Ele,
que posteriormente viria a ser meu querido compadre, só veio tomar conhecimento
dessa aventura “Pituqueana” muito tempo depois.
O
fato até hoje é lembrado com um misto de susto e pilhéria, e se tornou parte
efetiva de minhas Memórias de Antigamente.
Por
Miguel Chammas
3 comentários:
Essas coisas acontecem, Miguel. Certa feita, qdo nossos filhos eram pequeninos servimos vinho do porto às visitas. Minha filha interessou-se- Que é isso, papai?
- Vc não pode tomar. É ruim...
Ela bebeu o cálice à escondidas e comentou
-Papai, o RUIM é BOM...
Com meu filho Marcello, 10 anos, na época, aconteceu a mesma coisa, Miguel. Enquanto conversava com amigos na sala, o Marcello foi 'secando' todos os copos de wisky que estavam sobre a mesa. De repente começou a rodar na sala até aterrisar. Ainda bem que o wiske era escocês, legítimo. Sua recordação é muito boa. Parabéns, Miguel.
Laru
Miguel!
Que gostoso ler as suas crônicas! Deixa a impressão de ter vivido a situação por você retratada, tantos são os detalhes e tão real é o clima que consegue criar!
Essas situações, até comuns em grande parte das famílias, acaba ganhando um sabor especial quando descritas pelo grande contador de histórias que você é.
Abração.
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