domingo, 27 de maio de 2012

Parabéns, Miguel!

Revitalização do Parque Dom Pedro II

imagem: Projeto Revitalização Parque Dom Pedro II

Os pequenos detalhes da vida diária são invisíveis... Até que tem de ser mudados! É isso que vai acontecer com o processo de revitalização do Parque Dom Pedro II, aqui em São Paulo.

A proposta deste projeto é reintegrar a área verde ao entorno, melhorar o sistema viário e ocupar com equipamentos de educação e serviços os espaços que antes pertenciam aos edifícios São Vito e Mercúrio (que foram demolidos para o início desta revitalização). Seu entorno compreenderá o Mercado Municipal, as ruas 25 de Março, da Figueira, do Gasômetro, Maria Domitila e os Bairros do Brás, Pari e Cambuci. Será construído um pontilhão sobre o rio Tamanduateí que interligará esses 3 bairros ao centro da cidade. Haverá um maior número de estacionamentos para abrigar os veículos de pessoas que frequentam o Mercado Municipal que é, já, um tradicional "ponto gourmet" desta cidade.

Onde hoje é o terminal de ônibus do Parque Dom Pedro II, haverá uma lagoa - cercada de vegetação - e foi projetada para, além de embelezar a paisagem, absorver as águas das chuvas e pôr fim às inundações naquele lugar. Também foi projetado um terminal de ônibus para atender a Feirinha da Madrugada, que é realizada de segunda a sábado, das 3.00 h as 10.00 h, no Brás, onde são comercializadas roupas, tênis, perfumes, bolsas, acessórios etc.

Este é um projeto de uso misto! Como entendê-lo? É como reconstruir um bairro ou cidade, sem, no processo, destruí-los. Serão projetados prédios, residências urbanas (algumas restauradas), outras novas, com escritórios, lojas, jardins, cinemas... Haverá uma unidade do SESC e outra do SENAC. A ideia toda centraliza-se em torno de gente: gente a pé, não dentro de automóveis, não fugindo de carros para poder circular!

Em todos os atos possíveis, será conservado o passado... O passado da nossa cidade e, em particular,  do meu chão ; não só porque é um lembrete de nossos começos mas, também, por questão de comodidade e variedade. Ele terá tantas formas, tamanhos, estilos e faixas de preços que atrairá todos os tipos de moradores: jovens casais, famílias grandes, solteiros, aposentados.
Esperamos que seja íntimo, cálido, iluminado, aberto, com lugares para sentar dentro e fora dos prédios, residências e, principalmente, lugares onde as crianças possam brincar!

Será uma pequena cidade ou comunidade e, se der certo, será construído um número suficiente delas, interligadas, como elos numa corrente, criando um novo tipo de cidade grande dentro desta metrópole imensa. Espero que tudo dê certo.
Enquanto pudermos sonhar haverá a alegria de raspar, silenciosamente, a superfície do mundo entre o céu e a terra, mas, também, controlando, voando, embora curvando-nos ao sabor do vento (e da vontade de nossos políticos)!
Por Lia Bia Ferrero

Uma atitude pouco recomendável

imagem: bairro do Ipiranga

Lá pelos idos dos anos 40 eu e meus amigos frequentávamos o clube no Sacomã, nossos programas de diversão eram muito limitados devido à idade, um cinema, passeio na quermesse, parque de diversões e eventualmente um bailinho na casa de alguma garota, assim, durante um dia da semana íamos ao clube para assistir aos treinos do pessoal do basquete e do vôlei para ter uma distração à noite.
No mês de junho o clube realizava as tradicionais "festas juninas", já em maio alguns sócios ensaiavam no salão a dança da "Quadrilha" para se apresentarem afinal na festa, o grupo era composto por rapazes e garotas que se reuniam 1 vez por semana para o ensaio e nós ficávamos de fora, assistindo, lá no salão o mestre ia dando as ordens: "Balancê", "Caminho da Roça", "Trocar de Parceiro" e assim a coisa funcionava com o pessoal dançando ao som de músicas próprias das época.
Certa noite um dos meus amigos, cujo nome peço licença para não mencionar, trouxe uma garrafa do vinho Castelo embrulhada num saco de papel pardo, fomos ao bar e adquirimos algumas garrafas de soda limonada da Antarctica e lá fora, no pátio, fomos tomando o vinho misturado com soda (os copos foram emprestados pelo dono do bar pensando que só íamos tomar o refrigerante), não preciso dizer que a maioria dos meninos ficou "alta" após tomarmos aquela mistura, pois ninguém ali era dado ao consumo de bebida alcoólica; devolvemos os copos e as garrafas vazias da soda limonada, a garrafa de vinho deixamos num canto do pátio, em seguida fomos ao salão para assistir o ensaio da tal quadrilha.
Mas, vejam vocês o que a bebida pode causar; devido ao nosso estado de euforia começamos a tumultuar o ensaio fazendo piadas com o movimento dos dançarinos. O mestre do grupo continuava marcando a dança: "Balancê", "Caminho da Roça", etc. Eis que, de repente, o meu amigo que trouxe a bebida disse-nos que estava "cheio" de ouvir aquelas mesmas palavras em todos os ensaios e, surpreendentemente, após o mestre dar a ordem de "trocar de parceiro" ele gritou: "Todo Mundo Pelado".
Foi um protesto geral, a música parou e o ensaio também, alguns até ameaçaram a nos agredir. No final, fomos conduzidos à sala da diretoria e lá queriam saber quem de nós havia gritado. Alegamos que não sabíamos, pois eram muitos garotos (não queríamos acusar o amigo); assim, os diretores resolveram nos aplicar uma suspensão de 90 dias por falta de decoro. Ficamos proibidos de frequentar o clube por todo esse tempo e, o que foi pior: sem mais uma fonte de diversão.
Foi sem dúvida uma atitude pouco recomendável, coisas da mocidade. Ainda bem que meu pai não ficou sabendo!
Por Leonello Tesser (Nelinho)

domingo, 20 de maio de 2012

Mais 3 belos textos

Olá, amigos!

Abaixo, 3 belíssimos textos de nossos queridos Arthur Miranda, Miguel Chammas e Teresa Fiore.
Entrego-lhes, com meu carinho de sempre.
Muita paz!
Beijo!

A minha escola


imagem: Instituto Feminino de Educação Padre Anchieta
Naquela época, sete anos era a idade para entrar no 1º ano primário e eu já estava matriculada no Grupo Escolar do bairro, quando a família soube que, naquele ano, iriam abrir o Jardim da Infância na Padre Anchieta e as vagas seriam preenchidas por sorteio. Fui inscrita e depois, sorteada; e então, eu 60 anos atrás, orgulhosamente, ingressava no Instituto Feminino de Educação Padre Anchieta! A melhor escola do bairro e uma das melhores do Estado.
Aquele prédio imponente ficava no final da Av. Rangel Pestana, protegido por muros baixos guarnecidos por grades de ferro, provavelmente feitas pelos artistas do Liceu de Artes e Ofícios. Na frente havia um jardim com palmeiras e salgueiros-chorões. Atrás do prédio, um pátio imenso e era lá que passávamos a hora do recreio, brincando e correndo à sombra dos jacarandás-mimosos, que faziam com que nosso chão ficasse como que coberto por um tapete de pequenas flores roxas, das esguias palmeiras e um lindo ipê amarelo ao pé de uma das escadas externas.
As escadarias davam para esse pátio e em frente a elas é que as meninas do Primário formavam as filas quando era dado o sinal anunciando que já era hora de entrar para as salas, nunca antes de cantarmos o Hino Nacional e, nas datas cívicas, os hinos correspondentes. O que eu mais gostava era o Hino à Bandeira, com letra de Olavo Bilac: “Salve lindo pendão da esperança...”
Perdemos um bom pedaço do recreio, depois que construíram o “prédio novo”, assim chamado por todos. Ali ficavam, pela manhã, as meninas do Ginasial e, à tarde, as do Normal.
Fui aprovada no exame de admissão e tive o privilégio de fazer o ginásio naquele “templo do saber”, como dizia o hino daquele instituto de educação. Cada matéria, um professor: era o máximo para uma menina como eu. E, menina como eu era, fiquei perdida com tantas matérias e tantos professores. Uns adoráveis, outros nem tanto; os bonzinhos e os bravos; os que dominavam a classe com mão de ferro e outros que eram dominados pela classe.
Jamais esquecerei a minha professora de Latim – Dona Linda – brava que só ela. Em todas as aulas havia chamada oral e o tema variava entre os neutros da terceira declinação e os adjetivos de segunda classe, passando pelas conjugações verbais e os pronomes relativos. Tudo na ponta da língua, pois na primeira vacilada, vinha um zero redondinho. Apesar do regime de terro, tenho saudade dela, pois aprendi Português via Latim.
Por outro lado, nosso professor de Francês – Monsieur Zezinho – era uma tristeza: não tinha didática, não dominava a classe, ninguém prestava atenção à aula e fazia o que queria. Tanto é que uma vez, a inspetora de alunos viu que eu estava lendo na aula. Era “O Diário de Uma Jovem”, de Anne Frank, que havia tomado emprestado da Biblioteca Mário de Andrade, mas ela o apreendeu e disse que só devolveria depois de falar com a bibliotecária da escola para saber se era adequado para a minha idade. Nunca mais li um livro em sala de aula.
Entre a Dona Linda e o Monsieur Zezinho, havia outros tantos professores inesquecíveis que ficarão eternamente gravados na minha lembrança.
Entre uma aula e outra, havia um rápido intervalo para a troca de professores, mas no meio do período, tínhamos trinta minutos de recreio que serviam para comer um lanche rapidamente e aproveitar para jogar queimada ou brincar de pegador, que era proibido. Algazarra no pátio não era permitida; só na aula de Francês.
Era bom também ficar no grêmio, onde havia uma mesa de pingue-pongue, uma vitrola, alguns LPs e era lá que aprendíamos a dançar rock’n’roll. As mais velhas ensinavam as menores e nossos ídolos eram Elvis Presley, Pat Boone, Cely Campello, mas já apreciávamos Maysa, Dóris Monteiro e João Gilberto.
A minha escola, onde fiquei até terminar o ginásio, deu-me bases sólidas de educação, disciplina e civismo. Saí de lá porque só formava professoras e não era exatamente isto que eu queria para mim. Eu sonhava mais alto: queria ser secretária executiva como aquelas que eu via nos filmes românticos americanos: eficientíssima e com um chefe maravilhoso, é claro! Aí então, tive que procurar outros caminhos e conhecer novos professores e novas matérias e mostrar tudo o que havia aprendido na velha Padre Anchieta, inclusive o rock’n’roll.
Por Teresa Fiore

Memórias de um rapto amigável


imagem: Instituto Biológico de São Paulo

Sempre fui adepto de brincadeiras com noivos e noiva, meus leitores já devem conhecer esta característica mercê de textos anteriores.
Muito bem, sexta feira passada fui à São Paulo para buscar umas receitas médicas que haviam sido deixadas para mim no Convênio. Como meu filho, Alfredo, aniversariou dia 08 de maio, combinamos, então, de nos encontrarmos para por as conversas em dia e molhar as goelas, um tanto quanto secas pelo papo, com copos de Itaipavas prá lá de geladas.
Quando estávamos marcando o encontro perguntei ao Alfredo onde seria o encontro e ele, de pronto me disse: - Pai, vamos nos encontrar em frente às catracas da Estação Vila Mariana do Metrô. Conheço um barzinho “da hora” ali perto!
Local decidido, horário combinado, nada mais havia a fazer do que esperar a data aprazada.
Dia 08/05 pontualmente às 17h00, cheguei ao ponto do encontro. Meu filho, como soe acontecer, chegou um pouco (desta vez, pouco mesmo) atrasado. Depois dos beijos normais encetamos a caminhada até o tal barzinho.
Quando chegamos ao local, “surpresa!”, era um bar muito meu conhecido anos atrás. Contei isso a ele e ouvi dele: - Pô pai, onde você não conhece?
Entramos e sentamos a uma mesinha. Pedimos a primeira birra e começamos a tagarelar.
No meio da conversa comecei a me lembrar da última vez que ali estive e, depois de algumas gargalhadas, decidi contar ao Alfredo o que aconteceu naquele dia.
Foi assim: Estávamos nos anos 70, não me lembro exatamente a data, sei apenas que iríamos participar do casamento de um casal de grandes amigos, Valfrido e Léo.
Ele morava naquela época na Vila Mariana em uma casa no final de uma vila residencial e a festa do casório seria realizada na sua casa.
No dia, finda a cerimônia religiosa, nos dirigimos ao local do rega bofe. Lá chegando, me deparei com o Vado, primo do noivo e também muito meu amigo.
Então, conversa vai, conversa vem, resolvemos fazer uma brincadeira com o noivo. Qual seria a brincadeira? Roubar a noiva por uns momentos de boas gargalhadas.
Resolvidos, esperamos a noiva aparecer no início do corredor da Vila, fomos abraçá-la e com nossos abraços amigáveis fomos empurrando-a para dentro do meu carro.
A Leo, baiana arretada, percebeu e aceitou a brincadeira. Entrou no carro. Entramos também e sem dizer nada a mais ninguém, raptamos a noiva e a levamos para o bar onde eu estava agora sentado junto com meu filho. A brincadeira não terminou ali, eu ainda deixei o Vado e a Leo no bar tomando uma caipirinha oferecida pelo dono do bar pelo inusitado da visita e fui até minha casa no Bixiga Busscar uma câmera fotográfica para registrar a ocorrência.
Na minha volta, depois de algumas fotos, entramos no carro e nos dirigimos até o Instituto Biológico no final da Avenida Conselheiro Rodrigues Alves. Lá chegando assustamos a Leo pedindo que ela entrasse de sapatos e tudo no laguinho artificial, mas logo em seguida desmentimos e entrando no carro voltamos para a casa do noivo que, naquela altura, espumava de raiva e prometia quebras a minha cara e a cara do Vado. Depois de uns poucos momentos de suspense o clima desanuviou, o casamento prossegui no meio de muitas gargalhadas regadas a cervejas e salgados diversos.
Mais uma vez o bom senso havia prevalecido aos dissabores de uma boa e amigável brincadeira.
Por Miguel Chammas

Laura, uma esposa norte americana

imagem: Cine Cliper

Flavio Luiz foi sempre um dos meus melhores amigos de infância e juventude, a muito se formou engenheiro vivendo desde então nos USA, em 1960 adquiriu cidadania americana.
Trabalhamos na mesma empresa, quando deixei a firma em 1953 onde eu era Office-boy e ingressei no Seminário Diocesano São José em São Vicente – SP, deixei então, Flavio Luiz em meu lugar.
Estávamos sempre juntos e só distantes no futebol, (por incrível que pareça em nossa adolescência acontecida entre 1949 e 1956, o paulistano respirava futebol, eram times e campos de futebol por todos os lados, quase todos os candidatos políticos, estavam ligados a times varzeanos, distribuindo camisas e bolas como brindes a caça dos votos). Flavio não queria nada com o futebol não jogava e não torcia por nenhum time profissional como também não frequentava ou assistia, nem mesmo nossas peladas. Eu acho que foi o único amigo que nem tomou conhecimento ou ficou chateado quando o Uruguai nos enfiou pela goela abaixo aqueles 2 a 1 no Maracanã na copa de 1950.
No mais éramos parceiros em quase tudo, bailes pelas redondezas da Freguesia do Ó, cinemas do mesmo pedaço paulistano, Cine Clipper, Cine Piqueri, Cines Tropical, Recreio e Carlos Gomes na Lapa, Cine São Carlos na Água Branca, como também quase todos os antigos do centro velho de Sampa.
Depois como sempre acontece cada um seguiu o seu caminho, ele foi para a America do Norte, e eu mudei para outra rua, mas todo final de ano me encontrava com ele, que nos Natais sempre visitava sua família, foi numa dessas vezes que eu acabei conhecendo a Laura sua futura esposa, uma Americana muito bonita e que falava português muito bem, mas com aquele famoso e conhecido sotaque americano.
Acontece que Flavio e Laura logo depois do nascimento de sua Filha, acabaram se divorciando de forma não muito amigável e Flavio obrigado a dar um pagamento mensal a sua filha até a mesma completar 21 anos, (pagamento esse que Flavio sempre julgou exagerado e bem acima do necessário).
Mas como com a corte americana não se brinca Flavio Luiz, mesmo contrariado e sempre reclamando foi pagando religiosamente a quantia exigida.
O tempo passou a filha completou 21 anos, Flavio então muito feliz por emitir o último cheque da pensão que paga à sua ex-mulher há exatamente 20 anos e 11 meses.
Pede então para essa sua filha levar o cheque para sua mãe pedindo para a mesma ao entregar o cheque para a mãe dizer, que este é o ultimo cheque que ela verá da parte dele, e que depois voltasse rapidinho e contasse pra ele como ficou a cara de idiota da mãe.
A filha entrega o cheque à mãe, ouve o que ela diz e volta para a casa do pai, para dar-lhe a tão esperada resposta.
- Diga-me, filha, qual foi à reação da Babaca de sua mãe ao receber o cheque?
- Ela mandou lhe dizer que você não é o meu pai!

Por Arthur Miranda (tutu)

domingo, 13 de maio de 2012

Não esquentem a cabeça de minha mãe, Dona Zezé

Dia das Mães chegou, época em que as pessoas homenageiam aquelas senhoras especiais, diferenciadas, responsáveis pelo surgimento de alguns gênios e também pelo surgimento de milhões de energúmenos, entre os quais me incluo, corporativismo puro!... O dia chegou mas não precisava ter chegado ou sido inventado sei lá por quem, talvez por alguém com nome e sobrenome anglo-saxônico, algum John Doe, ou Joe Smith, ou Harry Johnson, algum marketeiro da Harrods ou Macy's da vida! A verdade é que MÃE É MÃE 24 HORAS POR DIA, 365 DIAS AO ANO E UM DIA A MAIS NOS BISEXTOS! E tenho dito e todas, todas elas, não conseguem chegar na estação Ana Rosa do Metrô, porque "SER MÃE É "PA" DESCER NO PARAISO!!!
Aqui em casa eu preciso lidar com duas mães: a D. Zezé (que vcs devem conhecer de outras narrativas ) e que me colocou no mundo e a d. Odete, esposa e mãe de meus filhos (que vcs devem conhecer, etc, etc...)
As duas não dão moleza; são duas guerreiras (esse negócio de chamar às mulheres de 'guerreiras' já se tornou clichê, mas por enquanto vou usando a frase ou o "fraseado", como diria Noel Rosa, em seu samba "Arranjei um fraseado")...
Conto rapidamente uma hitorieta:
Em 1943 eu era um "lindo garotinho" já bastante modesto (e continuo modesto, como podem depreender...!), mas os "olhos grandes" eram tão poderosos que eu caí doente, com um problema renal muito sério, de acordo com minha mãe. Naquele tempo morávamos em Bauru, interior de São Paulo e fui transferido para a Santa Casa da Capital. Meu pai ficou trabalhando e minha mãe veio junto, claro! Caipira de São Manoel, de repente ela se vê na cidade grande, totalmente perdida. Familias de colegas de profissão de meu pai, telegrafistas, souberam do problema, via rádio, e se ofereceram para abrigar minha mãe enquanto eu estivesse em tratamento. Prá ferrar com tudo, de vez, meu pai foi transferido mais uma vez de cidade. Foi a gota d'água. Minha mãe "surtou"! Perguntando aqui e ali, chegou aos Campos Elísios: - Quero falar com o Interventor!!!
- Minha senhora, ninguém chega aqui e fala com o Interventor! Não é qualquer um que vai chegando e falando com o interventor! " Eu não sou qualquer uma! Eu sou mãe, meu filho está doente na Santa Casa e essa merda de governo transferiu a gente novamente de cidade... não aguentamos mais isso! É um desrespeito... " Sinto muito senhora...
- Sente muito o ca.............!!!!!!
Enquanto o bate-boca continuava, alguém avisou o telegrafista que estava de serviço, e este por sua vez, chamou o mordomo do palácio e explicou o que estava acontecendo, pois uma pequena multidão estava se formando na Glete com a Rio Branco e a soldadesca estava ficando inquieta com aquela mulherzinha de óculos e sotaque caipira...
(Uma parte dessa narrativa foi-me contada às gargalhadas pelo sr. Benê, que se aposentou ainda no cargo, bem velhinho, já no palacio dos Bandeirantes, no Morumbi; "sua mãe quase começou outra revolução!!!, e ria")
Evidente que minha mãe conseguiu o que queria; dentro de um palácio ninguém é mais poderoso que o mordomo!, elementary, my dear Watson! E foi assim que minha mãe teve uma audiência, na marra, com o interventor federal Fernando Costa; ela explicou a situação toda, que não tínhamos roupas, móveis, não tínhamos nada, em função das remoções quase que trimestrais, tudo se perdendo, se estragando nos trens de carga, nas mudanças, eu internado...- Eu não sabia, d. Zezé. Não leve a mal, mas a intervenoria não pode se ocupar com miudezas; o Secretário de Segurança é quem...
- Seu Secretário de Segurança é uma besta incompetente, insensível, que só pensa em manter seu nome nas manchetes e enfiar dinheiro no bolso...
Fernando Costa não sabia onde meter a cara. Então, fez uma proposta à minha mãe:
- D. Zezé, a senhora aceita vir prá São Paulo?
- Se for prá ficar, se vocês não mexerem mais com a gente, claro que aceito, e, além do mais eu quero total atenção para com meu filho! Ele está doente por culpa de vocês!
- Mil perdões, minha senhora. Já vou encaminhar a última transferência do 'Seu" Alcides. Publica no Diário Oficial de amanhã! Vou passar um rádio prá Bauru, seu marido termina o expediente de hoje e logo-logo ele está em São Paulo. A Sorocabana vai expedir a passagem...
De primeira?
- Não, melhor!, ele vem no Pullman, com leito, restaurante e tudo mais! Ah, sim! Ele vem prá trabalhar comigo, aqui no palácio. Êle entra de férias imediatamente prá vocês se arrumar aqui em São Paulo. Qualquer coisa, qualquer "atrapalho", seu marido deve falar diretamente comigo...
NB: Minha mãe deve ter acrescentado alguma coisa aqui e ali, mas foi mais ou menos assim que tudo transcorreu durante a entrevista com o homem mais poderoso da ditadura Vargas em São Paulo; hoje, quando ela se lembra, comenta comigo, com a Odete e com os netos e bisnetos:
- Quando saí do escritório do homem 'tava' quase 'mijando' nas calças. Podia ter sido presa, falei o diabo pro interventor, pro chefe da Casa Civil... Podia ter ido parar na ilha das Cobras que nem o Francisco.
(Francisco Borges, nosso parente, foi capturado em 1932 na Revolução Constitucionalista, preso e torturado na Ilha das Cobras mesmo após o término da refrega. Teve fraturas nos ossos da face e assim ficou até sua morte em 1990; nunca quis cirurgia de reconstrução, teve dores a vida toda, "minhas condecorações estão em meu rosto", dizia...)!
- Mãe, não exagera...!
- Tá dizendo que eu 'tou mentindo?
- Eu não! Não sou louco!
...'tão vendo, pessoal? Tem mãe que não é mole, ...
E a Odete? Não tem historinha da Odete?


Da Odete eu falo qualquer dia desses! Essa é outra praga... adorável!
Por Joaquim Ignacio

Sessenta e dois anos sem Monteiro Lobato


Pela porta desse prédio passou o corpo do escritor que foi levado a ser velado na Biblioteca Municipal (Mário de Andrade). De lá, seu féretro seguiu rumo ao Cemitério da Consolação.
Em um túmulo de granito negro repousa aquele que viveu, vive e viverá para SEMPRE no coração e mente das crianças e dos adultos que, como eu, teimo ainda em ser criança.
Vez ou outra, eu vou lá, na Consolação, diante do seu túmulo, eternizar a minha admiração, amor e respeito.
Tento sempre fazer uma prece, mas não consigo. Ainda há muito pó de pirlim-pim-pim envolvendo seu local de repouso. A prece não sai. Mas abre-se um portal onde eu “faço de conta que as contas fazem”  e ultrapasso o umbral. E lá vou eu para o Sitio, viajo ao céu, ajudo Hércules nos seus doze trabalhos, vou entrando em cada livro e vou incorporado, um a um, cada personagem.
Diluo-me entre a fantasia e a realidade...
De repente um risinho maroto me traz à realidade do momento. Incomodado, meu pensamento pergunta: Quem se esconde atrás dos túmulos e interrompe meu sonhar acordado?
Novamente o risinho maroto. Logo uma voz responde: “Sou eu, meu caro leitor, que continuo vivo em cada criança que me ama e me lê. Criança grande ou não”.
O portal se fecha e eu volto ao mundo real, com a sensação de já ter ouvido aquelas palavras, aquele risinho maroto...
Será que eu ouvi na primeira vez que estive aqui? Nas tantas vezes que estive aqui?
Ou ouço essas palavras desde sempre no meu coração?... Será?!
Impossível pensar nisso agora! Estou tão em paz. Tão cheio de alegria a vida!...
E ainda há tanto pirlim-pim-pim nesse ar...
Wilson Natale

Uma nova experiência, a Morte – Velório


Ao ler a história de Jose Camargo Beira no site São Paulo Minha Cidade com o titulo “Um velório nos anos 50” saltou lá de dentro uma passagem paralela  ocorrida nos tempos de infância.
Meu primo e eu caminhávamos pelas ruas do nosso bairro Vila Nova Conceição, mais precisamente pela Rua Natividade, do longe notamos uma aglomeração próximo a casa de um conhecido. Na frente da casa, um amontoado de gente todas com semblantes sérios.
Movido pela curiosidade natural das crianças, resolvemos nos aproximar mas  afinal acabamos entrando para ver o que acontecia. .
Sem chamar muito a atenção fomos entrando tentando não esbarrar em ninguém. O local mal dava pra entrar. Mas com jeitinho, ultrapassamos uma muralha de gente.
Estávamos curiosos para saber do que se tratava.
Ao romper o ultimo obstáculo, demos de cara com um caixão aberto no meio da sala com velas e flores. E dentro dele um homem magro e morto.
Se desse teríamos corrido. Mas não o fizemos.
Tentamos disfarçar ao máximo o nosso engano tentando fazer cara de paisagem como exigia a ocasião.
Este era o meu primeiro encontro com a morte. Até então nunca havia me deparado com aquele tipo de situação.
Como a situação era nova, ficamos observando como as pessoas se movimentavam. As pessoas iam ao encontro de familiares postados ao lado do caixão para receber as condolências.
Como já estávamos na chuva resolvemos nos molhar e lá fomos oferecer nossos sentimentos.
Depois de fazê-lo demos meia volta em direção a porta para nos retirarmos.
Próximo ao portão havia uma mesinha para que os visitantes deixassem ali seu nome e endereço.
Claro que colocamos deixamos ali o nossos dados.
Naquele tempo era comum a realização de velório na própria casa onde a pessoa havia falecido.
Passado alguns dias, surpreso recebo uma cartinha.
Era uma cartinha da família do falecido agradecendo a presença ao velório.
Acabei achando aquilo uma “curtição” com relação ao fato de receber cartas. Pois nunca havia recebido qualquer tipo de carta. 
Um mês depois, passando numa outra rua, percebemos uma nova aglomeração. Sem pensar duas vezes, entramos.
As pessoas nos olhavam com curiosidade, meninos tão jovens, ali participando, compenetrados no que estava ocorrendo.
Ficamos a observar tudo que acontecia. Eram choros, lágrimas, pessoas tristes que há muito não se viam. Abraços fortes.
De repente uma bandeja atravessa a sala, repleta de sanduíches e sucos. Notamos que os adultos eram chamados para uma sala ao lado onde serviram  licores.
Observamos que havia um tratamento diferente que não havíamos percebido no velório anterior.
Para quebrar um pouco a monotonia do ambiente iam surgindo anedotas e causos engraçados que ajudavam a espairecer a tristeza do ambiente.
Ao final deixamos nossos nomes no registro.
Neste mesmo ano, mais quatro ocorrências como as descritas acima aconteceram no bairro e lá estávamos nós para levar nosso abraço.
O lanche também era algo que já era esperado.
Ao final de um ano recebemos quase sete cartinhas de agradecimento.
Isso de alguma forma me trazia algum conforto.
Os adultos pouco explicavam a respeito. Não entendia bem o que significava a morte, mas de certa maneira me ajudou a aceitar o assunto de forma tranqüila.
Mesmo com pouco entendimento sobre o assunto, de maneira ingênua levávamos o nosso conforto “meio maroto”, a essas famílias com respeito.
Mesmo sendo crianças, aprendíamos de certa forma a encarar o sofrimento alheio.
Hoje em dia, pelos menos nas grandes cidades, os costumes são outros  raramente se faz um velório em casa.
Anos depois, estive muito perto da morte em um afogamento e de certa forma pude encarar o assunto com alguma naturalidade.    
Por Luigy Marques

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Parabéns, Mário e Denise!

Mais 3 textos... Uhuuuuu!

Olá, amigos!
Ainda na correria aqui... Com minhas viagens a trabalho (muito trabalho) e pouco tempo para outras atividades.
Perdoem-me. Mais um mês e tudo voltará ao normal, assim espero.
Abaixo, 3 textos maravilhosos de nossos queridos amigos, Mário Lopomo, Miguel Chammas e Modesto Laruccia.
Entrego-lhes, com meu carinho de sempre.
Muita paz! BeijosssAUDADEsssss!

Sonia Astrauskas

Super heróis

Dias atrás, folheando o “Estadão” dei, de cara na primeira página, uma foto dos “4 heróis”, Capitão América, Bat-Man Super Homem e Tocha Humana, pra citar os mais “recentes” como o Hulk, (parecendo uma broa de milho saindo do forno) , o esqueite Platinado, (que corre nos fios da rede elétrica, absurdo dos absurdo, porém, vendo bem todos são absurdos), consagrados no cinema, nas histórias em quadrinho e TV. Olhando aquilo, fiquei matutando, será que estamos progredindo ou regredindo? Senão, vejamos, quando tinha meus 7 ou 8 anos me “amarrava” num gibi qualquer e via nele a maior distração que o homem já produziu. Começava a ir ao cine Gloria mas, O Globo Juvenil, o Gibi, (diários e mensais) o Guri, o Lobinho e outras que foram aparecendo, eram, ainda minhas grandes atrações. Na hora do almoço ou janta, todos se reuniam em volta da mesa, menos eu. Minha querida mãe chamava, mas, fingia que não escutava, ficava na outra mesa, na saleta em que minhas irmãs trabalhavam, com o prato na frente, um dia macarronada, outros, arroz-e-feijão, carne, salada, brodo, verduras, batata cozida ou fritas, “molignana” (berinjela) e os mais variados pratos da semana, todos feitos com perfeição e carinho. O número de pratos podia não ser muito grande mas, o que ela fazia, era perfeito. A Myrtes, minha esposa, aprendeu com, ela só com as visitas esporádicas que ela fazia. Depois de casada, aí ela deslanchou, comecei a engordar e não parei mais. Mas, nosso papo era sobre gibis, e não vamos fugir do assunto, por favor, (é só lembrar das comidas da mama que a vontade de falar de outra coisa fica por fora).
Como dizia, com o prato na frente, o gibi escorado por qualquer objeto que estivesse por perto, (uma caixa vazia, um ferro de passar, uma peça de roupa, uma folha de jornal amarrotado) enfim, pra escorar a revista não precisa de muita coisa, é só mantê-la em diagonal, permitindo eu comer e ler ao mesmo tempo.
Era criticado a todo o momento, meus irmãos diziam que fazia mal a digestão, minhas irmãs, não diziam muita coisa, mas davam graças a Deus por morarmos em casa térrea senão, eu poderia me jogar de uma sacada de apartamento, imitando o Super Homem. Puro exagero. Mas, uma coisa se fazia presença: eram os preconceitos contra a leitura em quadrinhos. Começaram a surgir revistas com desenhos italianos, numa publicação do Adolfo Aizem, (não lembro o nome da revista), trabalhos artísticos de valor insuperáveis, não eram simples gibis. Quando vejo na primeira página dos jornais estas promoções, fico com vontade de gritar: “Já passei por isso, é do meu tempo, não do vosso.”
Quem diria que um dia, minhas preferências em leitura, execradas por todos, servem, hoje pra embalar no berço crianças e fazer milionários os adultos. Os nossos heróis, na época, mocinhos, não envelheceram, fizeram questão de se manterem na mesma faixa afim de continuarem sua missão de voar, viver de baixo d’água, pegar fogo, corpo a prova de balas, gritar um termo de origem hebraica e se transformar em um musculoso homem de aço, fazer mágicas em nome da justiça, viver sempre nas selvas por anos e anos, vestir roupas que parece morcego e por aí a fora. Que tempo bom, gostoso de se viver, mas...., “pêra aí”, eles estão ainda aqui, não desapareceram, por que tenho que me lastimar sobre o tempo que passou? Sabe por que? Porque eles continuam jovens, vigorosos, fortes, imbatíveis, justiceiros e invencíveis. Estão, até mais bonitos, enquanto eu, o principal defensor deles, teimosamente agarrado aos seus feitos, ENVELHECI, porca miséria.
Por Modesto Laruccia

Memórias acrobáticas

imagem: Prédios da Light e Matarazzo - 1554

Corria o ano de 1957. Este escrevedor de memórias vivia seus 17 anos de idade e torcia para chegada do ano de 1958 quando então, com a maioridade completada, poderia ingressar em cinemas que tinham na programação filmes proibidos a menores de 18 anos, frequentar ambientes noturnos mais sofisticados, exibir seus dotes de dançarino párea uma nova plateia. Enfim, ver-se liberto dos tabus da menoridade.
Certa noite, reunido com os demais membros dos Duques de Piu-Piu, foi decidida a saída para o jantar em uma churrascaria no centro de Sampa. A escolha recaiu na Churrascaria Guacyara, estabelecida no primeiro quarteirão da Avenida Rio Branco, na calçada do lado direito de quem ia do Largo Paissandu em sentido à Avenida Ipiranga.
Escolha feita, nos dirigimos para a referida casa de pasto. Saímos da Rua Manoel Dutra (nosso ponto de reunião era o Bilhar Rex), descemos a Rua Santo Antonio entramos no Viaduto Major Quedinho, atravessamos no cruzamento da Rua São Luiz com a Rua da Consolação e Rua Martins Fontes, e entramos na Rua Xavier de Toledo. Alcançamos a Praça Ramos de Azevedo e nos preparamos para entrar na Rua Conselheiro Crispiniano quando percebemos uma movimentação fora dos padrões daquela região.
Pesquisando um pouco mais percebemos que algumas pessoas desenvolviam um trabalho manual inusitado para o horário.
Lógico, jovens e curiosos, fomos averiguar, de perto, o que de fato estava acontecendo. Vimos que a causa de toda a movimentação era o trabalho de alguns artistas estrangeiros que preparavam a cena para algumas apresentações acrobáticas que seriam realizadas nas noites seguintes. Eles estavam promovendo a instalação de cabos de aço que iriam atravessar o Vale do Anhangabaú no topo do Edifício Matarazzo (Praça do Patriarca) até o prédio da Light (hoje Shopping Center Light).
Desnecessário dizer que nossa curiosidade adiou por algumas horas o alvo de nossa jornada, o jantar da noite. Ali nos quedamos apreciando, junto com mais uma centena de transeuntes noturnos, as peripécias que se fizeram necessárias para por a termo a missão daqueles artistas.
Ao mesmo tempo em que assistíamos a instalação dos cabos de aço, obtínhamos informações a respeito do espetáculo. Soubemos então que o espetáculo seria de acrobacia sobre os cabos de aço e, consequentemente, a travessia da trupe “Zugspitzartisten”, em espetáculo único de equilibrismo.
Soubemos mais ainda, os artistas iriam precisar de colaboradores para a venda de flâmulas, lembranças, fotos e outras bugigangas e sustentá-los com a renda auferida.
Eu, mais descolado e habituado a tais expedientes j[a me propus a fazer parte desses colaboradores e, enquanto arrecadava contribuições, além de ganhar uns trocados, veria o espetáculo de locais privilegiados. Ledo engano, não existiam locais privilegiados. A afluência de publico foi tão grande, chegou a ultrapassar a case do milhar a cada noite, que nós, os colaboradores, tínhamos de fazer várias acrobacias para assistir aos números artísticos e cumprir com nossa obrigação de vender as tais bugigangas.
A cada apresentação, nós nos transformávamos, também, em acrobatas do solo, para não sermos esmagados pela turba, ou e3nganados por espertinhos.
Os ganhos daquela empreita foram bastante pequenos se comparados aos riscos que corremos, mesmo por que tínhamos que, ao final de cada apresentação, darmos conta de todas as quinquilharias que nos haviam sido entregues sido confiadas ou do valor das mesmas quando vendidas.
Dinheirinho ganho com suor acrobático

Por Miguel Chammas