sábado, 18 de novembro de 2017

A visita de Sua Eminência


Somos pessoas modestas, não se importando muito com a pompa e a circunstância. Também nunca fui muito chegado a religiões, portanto muito me surpreendeu- e a todos nós- a visita de Sua Eminência ao nosso jardim, de nossa casa no Brooklin.

Um Cardeal, a cabecinha vermelha contrastando com o branco do corpo e o escuro das asas. Estamos acostumados com a visita diária de pássaros. Como deixamos sempre uma tigela de frutas suspensa no ipê, e uma travessa de quirera no chão para as rolinhas, temos sempre um festival matinal de aves disputando a comida. Cambacicas, sabiás- agora mesmo apareceu uma mãe sabiá com dois filhotes-sanhaços, bentevís, rolinhas, periquitos em grande número.

Uma vez apareceu até um canário belga. Escrevi sobre ele. Mansinho, fugido de alguma gaiola, deixou-se apanhar e soltou por dias seu deslumbrante trinado pela casa toda, antes que o doássemos para uma instituição protetora.

Nosso Cardeal- acho que já posso chamá-lo assim, pois há dois dias que nos dá a honra de sua augusta  presença no jardim, disputando pacificamente a comida com os outros pássaros- também parece ter fugido de gaiola, pois nunca havia visto um neste bairro, pródigo em espécimes voadores, incluindo joãos de barro, pica paus e outros. Mas de bobo nada tem, e tem se virado muito bem sozinho.


Pois que seja abençoada- e que ele também possa nos abençoar, com sua autoridade clerical- sua estadia nesta casa, à qual parece ter se afeiçoado. Como o sabiá Plínio, o Jovem-pois era só um filhote grudado às penas da mãe, quando apareceu aqui pela primeira vez, e creio, nunca deixou de frequentar nosso ipê. Olhai as aves do céu, que não plantam nem colhem, mas com sua presença vêm trazer um pouco mais de alegria e esperança em nossas vidas.

Por Luiz Saidenberg