sábado, 17 de maio de 2014

Nostalgia - derradeira



Texto sem edição

De mãos dadas com minha mãe, iniciamos um ligeiro passeio. Ligeiro na concepção do tempo corrido na época... Hoje, com a nostalgia que esse momento me atinge, não foi nem simples nem tão rápido assim... Para minha querida mãe, a alegria muito, muito, mas muito natural para uma dona de casa muito esperta, zelosa, concisa em seus deveres de administradora de um lar com nove filhos, onde seu cansaço só se manifestaria nos últimos anos de vida... Doenças, então, ela não tinha tempo para estas coisas. Me digam vocês, queridas leitoras, que mulher, no mundo de ontem, de hoje e de amanhã, que não sentem, por pequeno que seja, um prazer em ir às compras, mesmo que não seja nada para ela?

Ex-tecelã, operária da fábrica de tecidos Matarazzo, localizada em frente a nossa casa, cuja estrutura de alvenaria se mantém até hoje, ocupando um quarteirão quase completo, flanqueada pelas ruas Fernandes Silva, Monsenhor Andrade, Assumpção e da Alfândega. Minha mãe trabalhou em tempo integral, em uma época de exploração férrea do operariado, sem as benesses de uma CLT a ser aplicada. Felícia sai com seu filho Modesto, dez anos, sétimo de uma prole de nove, da Rua da Alfândega, 197, no Brás, atinge a Rua do Gasômetro com a única preocupação sobre o que irá comprar.

O garoto Modesto vai olhando os edifícios da Rua do Gasômetro, gravando na memória, casa por casa, sobradões, um palacete encimando o antigo cinema Glória, com seus três arcos na entrada. Passando pelo palacete na esquina da Rua do Lucas, um pouco mais adiante, à esquerda, os muros facilmente identificáveis do gasômetro (muros que se mantêm em pé até hoje) onde eram despejados o carvão “coke”, trazidos pelo trenzinho liliputiano que vinha da estação do Pari, depois de passar por toda a Rua Sta. Rosa. O carvão coke, vindo da Inglaterra, era utilizado na transformação em gás. Nos portões escancarados pela entrada do “trenzinho”, a mamãe Felícia parava, um pouco, para o Tistininho (apelido do Modesto) poder apreciar a operação. A poesia inebriante estava no despejo do carvão do vagão, nas caldeiras fumegantes. Seguro nos trilhos, depois do desengate, o vagão, em uma posição estratégica, era entornado nas caldeiras, o que deixava o Modesto de boca aberta, retendo o andar de sua mãe, tal atração que a manobra exercia sobre ele. Era, realmente, um brinquedo encantador.

Essas informações eram armazenadas na memória do garoto, cheio de fantasias, vislumbrava invasões de foguetes interplanetários que, de imediato, sairiam dos fornos, movidos por retropropulsoras em busca do inimigo, no planeta Mong, reduto do vilão, Ming, desafeto do Flash Gordon. Para sua decepção, no meio de uma fumaceira estonteante, saia um homem, baixinho, de macacão, todo tingido do negro carvão, o rosto totalmente carvoeiro, onde só o branco dos olhos e dos dentes brilhavam na negritude do perfil. Mamãe Felícia, satisfazendo a curiosidade do garoto, puxava-o pelas mãos, pois, por vontade dele, ficariam ali, a manhã toda.

Seguindo em frente, atravessando a Rua das Figueiras, sempre na Gasômetro, a sua direita, contra um céu azul, límpido e prazeroso, erguido no início do século XX, o majestoso Palácio das Indústrias, construção exótica em estilo mourisca\ toscana, com vários, pequenos e médios monumentos, relevos motivados por cenas do desenvolvimento da indústria paulista. A entrada do palácio, a sua esquerda, um espelho d’água, com peixinhos coloridos, ladeados por monumentos alegóricos, uma alegria para os olhos dos que por ali passam.

Em frente às escadarias de entrada do Palácio, distando 70 a 100 metros, com corte da Rua do Gasômetro, separando as duas unidades, deslumbra-se o bucólico e verdejante Parque D. Pedro II, reduto dos passeios, lazeres, piqueniques, namoricos, futebol, crianças de todos os bairros circunvizinhos do nosso querido Brás. Quanta paz, quietude, tranquilidade, harmonia, cuja única violência que perigava na área era os galhos das palmeiras que, vez ou outra, despencavam nas alamedas arborizadas do nobre reduto. A visão do horizonte paulistano descortinava-se no perfil majestoso do primeiro e maior edifício do Brasil, o Prédio Martinelli.

Bem na entrada do parque, imponente e belo monumento enaltecendo o 1º Centenário da Independência do Brasil, em 1922, homenagem da colônia libanesa. Extraordinário trabalho artístico, com motivos da formação das primeiras levas da riquíssima colônia libanesa. (Esse monumento encontra-se na entrada da Rua 25 de Março, visual muito mais atraente do que um hot dog e o bucolismo do saudoso P. Dom Pedro II terminou quando o mesmo se transformou em canteiro de obras de outro grande progresso: o metrô).

No caminho para a Rua Gal. Carneiro, ou Ladeira Gal. Carneiro, como queiram, onde nosso destino era a Joalheria Casa Pastore, a Confiança, ao Empório Toscano e outras lojas de roupas brancas.

Todos estes trechos percorridos, como falei no início, resgatados, não na sua totalidade, porém nos principais tópicos, são recordados com ternura e devoção. Áreas que hoje, inconcebíveis de se permitir a existência de tais situações, são lenitivos, não saudosos, dos tempos que passam sem nos alentar da rispidez e rapidez da passagem dos anos.





Por Modesto Laruccia

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Nostalgias


Texto sem edição

Anos de 1938 a 1941, início da segunda guerra mundial, meus primeiros contatos com as atrocidades na Europa. Na escola Romão Puigari, lembro bem, além dos gibis, (que eu lia), tínhamos um livro sobre história universal em que, entre tópicos  históricos  dos países, o autor, em desenhos rústicos mas, bem acabados apresentava,  por meio destes esboços, (pelo menos o que ele, o desenhista, imaginava), as características físicas do perfil de cada cidadão, acompanhando o texto correspondente. Textos bem resumidos, é claro pois, se destinavam ao ensino básico, na época, denominado, escola de grupo. Os desenhos, elaborados em traços simples e diretos, numa visão rápida, tinha-se noção da relação com o texto. Sem entrar em demasiados detalhes, as divisões eram por continentes. Aparecia um busto de olhos puxados: asiáticos, um rosto moreno: sul americano, um perfil bem definido de um negro: africano e assim por diante. Virando as páginas, deparei com  um perfil de um homem barbudo, traços rústicos: europeu. A imagem me deixou um tanto ou quanto, preocupado. Meu pai, tios, e outros parentes e amigos, todos italianos, europeus, naturalmente, nenhum deles usava barba. Deduzi que os que estavam no Brasil, já eram civilizados e os do livro simplesmente viviam, ainda em estado de civilização bem atrasada, pobretões, o ilustrador baseou-se pelos que ainda vivíam lá e os que estavam no Brasil, já estavam num estágio de civilização bem mais adiantada. (sonho infantil)

Tudo isso pra chegar ao ponto da minha nostalgia, ouvindo os papos em casa, meu pai lendo jornais italianos, (Fanfula) para os amigos, (a maioria analfabetos), fui revendo meus conceitos sobre a guerra. Os inimigos são os alemães, (Hitler), italianos (Mussolini) e japoneses (Hiroito), o famoso “eixo”, apontados em todos os jornais, revistas, gibis e filmes que lia e  assistia. Os grandes heróis, os americanos, principalmente Capitão América, Príncipe Submarino, Tocha Humana, Bat-Man, Super Homem etc. Meu pai tinha no Mussolini, um grande estadista, (saiu da Itália com 11 anos) e meus tios, estavam fora desta contenda, não usavam barba!

Quando um casamento, no seio da família acontecia, a primeira preocupação era o presente a ser oferecido. Se o parente era o noivo, deveria ser algo de uso pessoal, como relógio, caneta, alfinete de gravata, porta-notas com iniciais gravadas  em ouro etc. Se fosse a noiva, uma jóia, roupas de elaboração esmerada, lençóis bordados a mão, colcha ou a famosa bacia com jarro porcelanizada, pra uso íntimo no aposento dos noivos.

Pra comprar o que ficara determinado pelas conversas mantidas com meu pai e, mediante a decisão,  minha mãe se preparava, me escolhia pra companhia e eu, todo alegre, agarrado nas mãos de minha querida mãe, Felícia, sabia que no caminho tinha pipocas ou amendoim, até mesmo, chocolate. Aí começa minha nostalgia... (parte 1)


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Por Modesto Laruccia


Odiosa realidade


Texto sem edição

Gostaria de falar sobre amenidades, sobre infância, escolas, bailes de formatura, sobre famílias, enfim como as redações enviadas por quase todos, nos últimos anos. Assuntos saborosos que encantam  todos e dão muito prazer a quem ler e comente. Gostaria, mas não posso. Não devo ter  e ser alegre, feliz,  testemunhando uma avassaladora onda de violências, misérias, abandono de crianças que “teimam” em nascer no mais odioso, ingrato e selvagem ambiente que se possa imaginar. Nós, moradores do parque Continental, zona oeste desta nossa querida cidade, eu, principalmente, somos quase que partícipes do que vem se formando no extremo final da av. Antonio de Souza Noschese, onde moro, um fato aparentemente corriqueiro, mas degradante: o aumento inimaginável de crianças pelos escaninhos e tortuosas vias de acesso aos casebres, na mais imunda, pobre, miserável das condições humanas que já pude assistir .

É de cortar o coração ver elas brincando, rente ao asfalto onde passam carros, caminhões, basculantes que descarregam entulhos, lixo, imundices, pondo em risco a vida destas criaturas;  de onde vieram esses pequenos seres? das barrigas de garotas de, no máximo 15 a 16 anos, em busca do enganoso e deprimente salário família.  Habitando casebres de baixo do viaduto, na divisa com o município de Osasco, surgiram do nada, ocupando áreas nas vizinhanças de um grande terminal de gigantes caminhões, sobrevivem em condições... , (que condições, que nada...) porque respiram! Isto por baixo do viaduto. Por cima, então, é outra visão antidiluviana: casebres montados rente ao asfalto, de uma pista de duas mãos, estreitas, tão apertada que, se alguma criança sair do casebre e der um passo, só UM PASSO DE CRIANÇA, é estraçalhado por qualquer carro ou caminhão que vem a toda pela via.

Pequerruchos, lânguidos, olhos tristes, as meninas sempre mais sensíveis, desde criança, o instinto materno se manifesta nessa criaturinha tão meiga, cuidando de outro menor.
Que quadro desolador, quanta tristeza, olhando e pensando, estas crianças poderiam ser meus filhos, netos, minhas sobrinhas, qual é a diferença? Por quê nascem  com tanto desencanto, tão desprotegidos... ? E depois, quando crescem, (se chegam a isso...) o que será da vida deles, quem lhes garante alguma proteção, alguma escola que ampare o futuro deles... ? mas eles vão reaparecer, o aprendizado nas ruas, nas aglomerações de marginalizados de tudo que se entende como vida decente e segura, vão reaparecer, vão querer cobrar de nós, seus direitos usurpados ao nascerem.  

Estas mesmas crianças, já crescidas, armadas por adultos, que também nasceram e cresceram  como eles, vão roubar, assaltar, estuprar, bater, matar,  violentar com ímpetos de elevadíssimo grau de crueldade, agindo  com rancor impenetrável.  Na busca de uma razão pra tal procedimento, por parte de estudiosos do comportamento humano, tem enorme dificuldade em estabelecer a razão desse hediondo perfil, chegam a conclusões de que não adianta  pesquisar porque não estão lidando com seres humanos.
De uma coisa podemos ter absoluta certeza, nossa parcela de culpa não é pequena. A ambição desenfreada da sociedade tem seus destemperos na desigualdade abissal dentro da própria sociedade.



Por Modesto Laruccia


sábado, 10 de maio de 2014

Parabéns à todas as mães do mundo




Da mãe negra, da mãe branca, 
da mãe que chora
Da mãe que implora, 
da mãe que pede esmola, 
da mãe que é rica e vive bem
da mãe que é pobre e nada tem. 
Da mãe da mãe que além de mãe, 
é avó também, mãe duas vezes, 
todos seus netos a querem bem.
Dia da mãe adotiva, que por toda sua vida 
Cuidou da vida do filho de alguém.
Cuidou muito e cuidou tão bem
que hoje o mesmo sente-se um filho dela também.
Da mãe que sofre pelo filho que já morreu, 
como Maria em um triste dia 
diante da cruz perdeu o seu.
Da mãe que hoje luta, 
da mãe prostituta, 
da mãe sem marido, 
da mãe sem abrigo, 
que vive jogada, 
sem nenhum filho amigo 
que lhe estenda a mão.
Da mãe que foi descartada, 
em um asilo deixada,
por que idosa um dia ficou 
e vive ali esquecida, 
o seu finzinho de vida 
vivendo assim quase de favor.
Da mãe do leiteiro, 
da mãe do padeiro, 
da "sofrida" mãe do Juiz 
da mãe de todo brasileiro, 
também de todo estrangeiro, 
que em nossa terra como imigrante
um dia chegou .
Da mãe que ainda é solteira, 
da mãe que por alguma razão 
um dia matou seu filho 
e hoje vive em uma prisão.
Da minha mãezinha querida 
que já não esta nessa vida 
e hoje espera por mim.
Pedindo a Deus mil desculpas, 
por tudo o que fiz de ruim.
Em maio tem um dia querido,
por todos nos sempre amado. 
O dia das mães das pessoas, 
não importa a sua idade. 
Das mães de todos os amigos. 
Solteiros, viúvos ou casados.

PARABÉNS À TODA AS MÃES DESSE MUNDO!



Por Arthur Miranda

segunda-feira, 5 de maio de 2014

O eterno conjunto de sons




Música, divina expressão do ser humano ao ser despertado em épocas distantes, desde um simples  ruído natural passando pelos relâmpagos e trovões, espicaçando a curiosidade dos habitantes das cavernas, os primeiros seres viventes. Aprendendo a falar, berrando feito um irracional, (de quem aprendeu muita coisa), da fala, ouvindo e copiando os pássaros,  vai para o canto, embelezando, melodiosamente,  seu relacionamento com outros seres.

Pensando nestes encantadores momentos de ternura e devoção, estou em casa, no Parque Continental, zona oeste de nossa querida cidade de São Paulo, sem me preocupar em  descobrir o nascimento de novos músicos e instrumentos musicais. Apenas ouço melodias compostas para mim... Sim, para mim, sempre direcionadas a mim. Ouço-as com respeito religioso, não permitindo que outros ruídos venham interferir na minha audição e contemplação, degustação espiritual que a música me satisfaz.

Se estou ligado à minha caixa de som, coloco um CD de concerto, uma ópera, ou a  execução solo de um grande artista do piano, violino, trompete, saxofone, violão ou guitarra ou,  senão, uma emissora que tenha uma programação voltada unicamente à música clássica; enquanto travo minha saborosa batalha com o computador, vou trazendo pra dentro de minha alma, alegrias, tristezas, nostalgias, saudades, melancolias enfim, um estado de torpor que certas melodias, na sua magia, no seu modo de ser, no seu poder de penetração, deixam sua marca indelevelmente registradas em nossa existência espiritual.

Gosto de música, minha predileção, como a leitura, em qualquer hora do dia ou da noite. Música ao vivo, assisti muitas vezes; é a realização de uma verdadeira ode instrumental, onde mais de cem professores se empenham em proporcionar a você, presente na plateia, um envolvente momento que se prolonga, a “di ‘nfinitun”, pra que você deguste os segredos acondicionados dentro de, desde um simples “triângulo” até o mais barulhento dos tímpanos a ribombar seu coração, numa ALEGRIA CONTAGIANTE. 
Se você ouve um trecho de Mendelson, no seu Concerto pra violino e orquestra, nº 4, é de uma extraordinária beleza. E o Mendelson morreu com, apenas, 48 anos...

Não querendo me estender e cansar meus amigos, só quero lembrar  “O Cisne de Tuonella” , o “andante” do concerto pra piano e orquestra nº 2, de Shostakowiski.




Por Modesto Laruccia

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Um anjo



(crônica/verdade)

Anos se passaram. À tarde de um frio intenso parecia debochar da gente. Frio violento, carrasco, impiedoso, nunca sentido, que eu me lembre.
Ao sair do Fórum João Mendes Jr. naquela tarde, me dirigi à livraria Saraiva na mesma Praça João Mendes, bem defronte ao fórum. Buscava, pela vitrine, algum livro jurídico relacionado com Filosofia do Direito. Depois de alguns minutos observando, viro-me para o lado e vejo, de cócoras, um senhor negro com uma mísera camiseta rasgada, "vestindo" um roto calção. Tremia todo o seu corpo que mais parecia estar em convulsão irreversível. O rosto, ah! Seu rosto. Além das vergadas que o tempo lhe infligiu, a barba branca do esquecimento humano cobria todo seu rosto. O olhar, ah! O olhar triste perdido nas desgraças sofridas tinha ainda assim vestígios de amor, e pedidos de socorro. Lá naquele canto, esquecido na vida, via passos apressados, passos largos, passos voltando, passos correndo, mas não via nenhum olhar, nem mãos amigas, estava tão só, um descartado da vida. De repente, do meio da multidão, surgiu um homem, um homem loiro e moço, bem apessoado, com um riso doce nos lábios, vestindo um riquíssimo casaco de couro parou em frente do mendigo negro, estendeu sua mão, pegou a mão do homem negro e o levantou. Tirou seu rico casaco e colocou naquele pobre ser. Ficou ele, então, só com uma rala camiseta, sorriu, apertou a mão do homem, e, como veio, no meio da multidão, sumiu naquela tarde fria.
Eu disse para mim mesmo, o cara era um anjo, sem dúvida. Caminhei pensativo, entrei na Catedral da Sé e orei. Era que tinha que ser feito.




Por Fábio Belviso