imagesn extraídas da internet
Assim escreve
Regina de Castro Pompeu, premiada na primeira edição dos Prêmios Longevidade –
Histórias de Vida, com os troféus entregues por Nicete Bruno, presidente de
horna do júri. Premiação que aconteceu em 4 de outubro durante o VI Fórum da
Longevidade, evento da Bradesco Seguros.
De forma
despretensiosa, inscrevi um texto no concurso Prêmios Longevidade Bradesco
Histórias de Vida.
Estou
chegando de São Paulo, onde fui participar da premiação.
Mandaram
um motorista me buscar e me trazer e fiquei num super-hotel nos Jardins,
acompanhada de meu príncipe consorte... rss.
Entre
quase 200 concorrentes, conquistei o 3o lugar, com direito a troféu e diploma.
Mas,
sinto como se tivesse recebido o Oscar, pois os primeiros colocados foram jovens
que trabalharam por alguns anos para escrever histórias que mereciam ser
contadas.
Meu texto
foi o único produzido pela própria protagonista.
O tema
central era o relacionamento intergeracional.
Quase caí
da cadeira quando Nicete Bruno, jurada especial me perguntou: "Você é a
Regina? Queria muito conhecê-la. Adorei seu texto!"
Tive,
ainda, o privilégio de ser fotografada ao lado da convidada especial, Shirley
MacLaine.
É muita
emoção, que gostaria de compartilhar com vocês.
Abaixo, o
texto premiado.
Beijos
Regina
DE REPENTE 60 (ou
2x30)
Ao
completar sessenta anos, lembrei do filme “De repente 30”, em que a
adolescente, em seu aniversário, ansiosa por chegar logo à idade adulta,
formula um desejo e se vê repentinamente com trinta anos, sem saber o que aconteceu
nesse intervalo. Meu sentimento é semelhante ao dela: perplexidade.
Pergunto
a mim mesma: onde foram parar todos esses anos?
Ainda sou
aquela menina assustada que entrou pela primeira vez na escola, aquela filha
desesperada pela perda precoce da mãe; ainda sou aquela professorinha ingênua
que enfrentou sua primeira turma, aquela virgem sonhadora que entrou na igreja,
vestida de branco, para um casamento que durou tão pouco!Ainda sou aquela mãe
aflita com a primeira febre do filho que hoje tem mais de trinta anos.
Acho que é por isso
que engordei, para caber tanta gente é preciso espaço!
Passei batido pela tal crise dos
trinta, pois estava ocupada demais lutando pela sobrevivência.
Os quarenta foram festejados com um
baile, enquanto eu ansiava pela aposentadoria na carreira do magistério, que
aconteceu quatro anos depois.
Os cinquenta me encontraram construindo
uma nova vida, numa nova cidade, num novo posto de trabalho.
Agora,
aos sessenta, me pergunto onde está a velhinha que eu esperava ser nesta idade
e onde se escondeu a jovem que me olhava do espelho todas as manhãs.
Tive o
privilégio de viver uma época de profundas e rápidas transformações em todas as
áreas: de Elvis Presley e Sinatra a Michael Jackson, de Beatles e Rolling
Stones a Madonna, de Chico e Caetano a Cazuza e Ana Carolina; dos anos de
chumbo da ditadura militar às passeatas pelas diretas e empeachment do
presidente a um novo país misto de decepções e esperanças; da invenção da
pílula e liberação sexual ao bebê de proveta e o pesadelo da AIDS. Testemunhei
a conquista dos cinco títulos mundiais do futebol brasileiro (e alguns vexames
históricos).
Nasci no
ano em que a televisão chegou ao Brasil, mas minha família só conseguiu comprar
um aparelho usado dez anos depois e, por meio de suas transmissões,vi a chegada
do homem à lua, a queda do muro de Berlim e algumas guerras modernas.
Passei
por três reformas ortográficas e tive de aprender a nova linguagem do
computador e da internet. Aprendi tanto que foi por meio desta que conheci, aos
cinquenta e dois anos, meu companheiro, com quem tenho, desde então,
compartilhado as aventuras do viver.
Não me
sinto diferente do que era há alguns anos, continuo tendo sonhos, projetos,
faço minhas caminhadas matinais com meu cachorro Kaká, pratico ioga, me alimento
e durmo bem (apesar das constantes visitas noturnas ao banheiro), gosto de
cinema, música, leio muito, viajo para os lugares que um dia sonhei conhecer.
Por dois
anos não exerci qualquer atividade profissional, mas voltei a orientar
trabalhos acadêmicos e a ministrar algumas disciplinas em turmas de
pós-graduação, o que me fez rejuvenescer em contato com os alunos, que têm se
beneficiado de minha experiência e com quem tenho aprendido muito mais que
ensinado.
Só agora
comecei a precisar de óculos para perto (para longe eu uso há muitos anos) e
não tinjo os cabelos, pois os brancos são tão poucos que nem se percebe
(privilégio que herdei de meu pai, que só começou a ficar grisalho após os
setenta anos).
Há marcas
do tempo, claro, e não somente rugas e os quilos a mais, mas também cicatrizes,
testemunhas de algumas aprendizagens: a do apêndice me traz recordações do
aniversário de nove anos passado no hospital; a da cesárea marca minha
iniciação como mãe e a mais recente, do câncer de mama (felizmente curado), me
lembra diariamente que a vida nos traz surpresas nem sempre agradáveis e que
não tenho tempo a perder.
A capacidade de fazer várias coisas ao
mesmo tempo diminuiu, lembro de coisas que aconteceram há mais de cinquenta
anos e esqueço as panelas no fogo.
Aliás, a
memória (ou sua falta) merece um capítulo à parte: constantemente procuro
determinada palavra ou quero lembrar o nome de alguém e começa a brincadeira de
esconde-esconde. Tento fórmulas mnemônicas, recito o alfabeto mentalmente e
nada! De repente, quando a conversa já mudou de rumo ou o interlocutor já se
foi, eis que surge o nome ou palavra, como que zombando de mim...
Mas, do que é que eu estava falando
mesmo?
Ah, sim,
dos meus sessenta.
Claro que
existem vantagens: pagar meia-entrada (idosos, crianças e estudantes têm essa
prerrogativa, talvez porque não são considerados pessoas inteiras), atendimento
prioritário em filas exclusivas, sentar sem culpa nos bancos reservados do
metrô e a TPM passou a significar “Tranquilidade Pós-Menopausa”.
Certamente o saldo é positivo, com
muitas dúvidas e apenas uma certeza: tenho mais passado que futuro e vivo o
presente intensamente, em minha nova condição de mulher muito sex...agenária!
Por
Regina de Castro Pompeu
4 comentários:
Lindo seu texto premiado, Regina, merecido por uma escrita bem acomodada, respeitando parágrafos bem distribuidos. Uma recordação em decênios que agradam ao mais exigente dos leitores. Parabéns, Regina.
Modesto
Regina, seu texto está maravilhoso e muito bem escrito.Você fala desta idade com tranquilidade mostrando a vida como ela é, linda!Meus parabéns, você mereceu o premio! Um grande abraço.
Bravo Regina!
As verdades de todos nós neste teu texto brilhante.
Temos passado e presente. E o presente importa mais que o futuro. Pois o futuro a Deus pertence. E o futuro se revela em cada dia no nosso presente. Então, que a vida nos leve.
Abração,
Natale
Regina, parabéns pelo merecido prêmio e pelo belo texto, abraços, Leonello Tesser (Nelinho).
Postar um comentário