segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Memórias de um Silêncio


Música: Ave Maria, de Gounod - com Jessye Norman (para ouvir, clique no play)

Domingo chuvoso. Estou sozinho.
A TV ligada mostra o burlesco programa do Faustão, e o som dela emanado preenche  os espaços vazios do ambiente.
De repente, não mais que de repente, as notas de uma melodia chegam aos meus ouvidos desatentos.
Procuro prestar mais atenção e reconheço os acordes. É a Ave Maria de Gounod.
Meu coração, tão cansado de apanhar, começa a bater em ritmo de triste lembrança.
Adoro essa Ave Maria. Ela me traz uma calma triste, ou será uma agitação melancólica?
Não sei explicar,  apenas  sei sentir; e sinto.
Será que o clima natalino propiciou essa nostalgia exagerada? Não sei. Só sei que, ouvindo os acordes dessa Ave Maria, senti meus olhos marejados.
Forcei uma piscada mais prolongada para, quem sabe, derrubar o excesso lacrimal em meus olhos, foi em vão, as lágrimas teimaram em minar uma a uma e, lógico, rolarem dessa mesma forma por sobre minha barba já acumulada por dias sem um efetivo escanhoamento.
Busco, lá no âmago do peito, encontrar uma justificativa plausível para esse surto de nostalgia.
Será o excesso de decepções acumuladas nos últimos dias?
Será a falta absoluta de uma reserva de fundos para fazer frente às necessidades básicas?
Será a ausência de entes amados que, por falta de possibilidades ou interesse, cada vez mais se distanciam?
Será o peso inevitável dos anos que a cada dia maltrata meu corpo?
Será que a cada dia aumenta mais a minha decepção com a vida?
Que será? Que será?
Estanco o pensamento e busco ouvir, no silêncio, a resposta dessa indesejada angústia.
Nada...
Apenas  e tão somente a suavidade das notas musicais da peça de Gounod paira no ar e sufoca meu coração.
As lágrimas continuam a brotar, as lembranças, boas e ruins, surgem em borbotões (ou serão golfadas?), a tristeza se acomoda cada vez mais em minh‘alma.
Desisto. Abro mão de buscar justificativas ou soluções.
Calo-me!
Fecho os olhos e aguardo a dissipação desse momento indesejado.
Sei que ele irá passar  e apenas sobrarão os rastros dessa sensação estranha e angustiante.
Aguardemos, pois.
Silêncio!




Por Miguel Chammas

sábado, 14 de dezembro de 2013

Memórias Noelistas



Outro dia exatamente igual a tantos outros, nade de novo, nada de diferente, rotina cansativa e desinteressante.
Assim pensava eu sentado, ou melhor, esparramado, no sofá aqui na sala.
-Boa Tarde!
Levanto a cabeça assustado, tinha certeza de que ninguém me fazia companhia. De onde aparecera aquela voz rouca e empostada?
 No canto da sala, bem ao lado da TV, uma sombra foi se fazendo notar e ficando cada vez mais  reconhecível. O que no primeiro instante parecera um borrão vermelho, agora, melhor delineado, se mostrava como o contorno de um imenso e balofo corpo. Dirijo meu olhar um pouco mais para cima e distingo um rosto rosado e bonachão escondido atrás de uma intensa e alva barba e imensos bigodes. Dois olhos azuis e iluminados, quase que escondidos na barra de um gorro vermelho, me olham e transmitem uma ternura jamais vista antes.
Feito o reconhecimento, ainda bastante emocionado com a surpresa, respondi ao cumprimento.
-Boa tarde, Papai Noel, quanta honra! A que devo tamanha gentileza?
-Ho Ho Ho – sorriu fazendo o gesto característico de segurar a barriga com as duas mãos – ora pois.
Se você foi um dos meus representantes durante vários anos, por que não haveria eu de te fazer uma visita de cortesia e, juntos, lembrarmos antigas e pitorescas aventuras?
Refeito da surpreendente surpresa, agradeci a deferência e emendei ao agradecimento um novo comentário:
- Adoro lembrar de coisas passadas, principalmente daquelas que podem nos deixar alegres. Nem sei por que resolvi representá-lo em vários Natais.
- Não sabe? Então não percebeu nunca que tinhas o gene de Papai Noel em sua existência?
- Gene de Papai Noel? Que raio de gene é esse?
- Você herdou esse gene do Alfredo Chammas (seu pai) que, mesmo magrelo, me representava em todos os Natais da ACF-SP, distribuindo presentes em meu nome para todas as crianças. Lembrou agora?
- Lembrei sim; e lembrei também que um dia comentei com ele que, quando fosse maior, iria fazer a mesma coisa.
- Isso mesmo! Assim pensou e assim executou!   Durante muitos anos. Começou com pequenas  participações sem muita evidência, depois atendendo convites foi Papai Noel  do Clube Prada, do Rubro Negro da Bela Vista, depois, para alegrar as crianças, aceitava todo e qualquer convite.
Foi o Papai Noel oficial de todos os Natais das famílias Chammas, Santos Lima, e Avelino.
Puxa vida, é verdade! Quantas vezes eu vesti tua farda vermelha e fui me emocionar com aqueles olhinhos pedintes das criancinhas ávidas por um presentinho.
Nas festas da família, chegava ao romper das 12 badaladas, cumprimentava a todos, distribuía alguns presentes, buscava não ser reconhecido (como era difícil!). A criançada era páreo duro para ser convencida! Cada ano mais esperta. Que sufoco!
- Teve um ano que você, por problemas particulares, decidiu não ser meu representante e colocou seu filho no lugar. Coitado,  mesmo com toda a boa vontade apresentada ele não conseguiu um bom desempenho e abandonou a causa no fim da festa.
- Pois é, Papai Noel, e eu, mesmo querendo me afastar, ainda representei-o por alguns Natais.
- Hoje já não existe ninguém para fazer minha imagem se perpetrar. Para mim, ficou bem mais complicado e difícil.
- Vou confessar uma coisa, velho Noel, eu na verdade sinto muita saudade daqueles dias de Papai Noel, ficaria muito feliz se pudesse voltar a representá-lo e acarinhar os corações infantis.
- É uma pena mesmo, mas você está participando de grupos de mais idade, não tem à sua volta crianças famintas por carinho e atenção... Em todo caso, fica o convite, se quiser voltar, é só buscar quem te queira e recomeçar a brincadeira... Eu ficaria muito feliz!
- E eu também, Santo Velhinho!
- Bem meu velho, missão cumprida! Visita realizada e lembranças reavivadas. Fiquei feliz e sei que também te fiz feliz. Até uma próxima vez.
- Feliz e Santo Natal!
- Amém Papai Noel,  amém!
O vulto se desfez. Foi tão rápido seu sumiço que dos meus olhos rolaram lágrimas de inconformismo.
Emoção à flor da pele, resolvi escrever esta crônica.
Quem sabe, qualquer hora dessas, eu a leia novamente e, num surto de extrema coragem, volte a envergar certa roupa vermelha, jogue por sobre os ombros um saco cheio de pacotes e vá visitar antigas crianças que, hoje, já são jovens rapazes e moças.



Por Miguel Chammas


segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Um conto de Natal



Para assistir, basta clicar no play

Olá, queridos autores e leitores!
Trago algo diferente para iniciar as histórias sobre Natal e festas de fim de ano, aqui em nosso blog, este cantinho que conta as mais incríveis e encatadoras histórias sobre nossa querida cidade de São Paulo.
Começo, lhe entregando o trabalho de Flávio Brabo, um jovem autor, residente em Guarulhos e que é apaixonado por filmes e histórias de terror. Dedica seu tempo livre escrevendo contos de suspense, terror e humor negro.
Este conto que vocês irão ouvir, pode parecer estarrecedor, mas achei incrível a mensagem subliminar que traz, ou seja, "ninguém deve esquecer o verdadeiro espírito de Natal". Um jeito diferente e inteligente de mostrar esta mensagem tão importante.
Mais histórias de Flávio Brabo podemos encontrar em seu blog:


Flávio Brabo

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Uma Ode a Miguel S. G. Chammas



Nos idos de 2007, por conta de uma indicação de meu irmão Vicente Laruccia, 88 anos, tomei conhecimento da existência do SPMC. Mandei meu primeiro texto, sobre minha tia Carmela, vítima da revolução de 1924. Em seguida, fui convidado a comparecer na sede da “São Paulo Turismo” para dar um depoimento. Éramos os quatro colaboradores, eu, Mario Lopomo,  professora   Neuza Carvalho, Luiz Saidenberg e Miguel S. G. Chammas.
De cara, fiquei conhecendo todos, menos a profª. Neuza, que já a conhecia da USP. O Luiz, muito simpático, o Mario, taciturno e o volumoso e bondoso Miguel. Conversamos longamente, gravamos o depoimento e o Miguel se mostrou de uma bondade tão volumosa ou mais que seu físico propunha. A mim, parecia que o conhecia há muitos anos, tamanha acolhida que ele me deu; nunca vou esquecer aquele dia. Conversou sobre meu texto, animou minha iniciativa, contou que estava no site desde seu início, em 2005. Tivemos várias trocas de e-mails, conversamos várias vezes por telefone, o Miguel demonstrou logo ser um perfeito incentivador de novos colaboradores, sendo ele, já um grande, respeitoso e muito bom colaborador do site, Teve, um dia, a ideia de criar o que seria uma reunião de todos numa pizzaria de São Paulo, batizando-a simpaticamente de “RODADAS DE REDONDAS COM AUTORES REDONDOS OU NÃO”. Pelos anos seguintes, sempre com o espinhoso trabalho de escolha da pizzaria, locais que poderiam agradar ou não alguns dos colaboradores enfim, o Miguel, sempre levou a bom termo essa iniciativa, com a boa vontade e disposição do casal, sem esquecer que ele mora na Praia Grande,  deslocando-se à capital, sem nunca se queixar.
Pois, como ele confessa em uma mensagem enviada a todos que sempre emprestaram seu apoio ao ágape, tudo tem seu princípio e um fim. Discordo de você, Miguel. O que ocorreu na despedida do ano, em 30\11\2013, não é o fim,  meu grande amigo Miguel que, por problemas de saúde e outras ocorrências, não vai mais poder continuar a organizar novas rodadas. Vamos todos nos reunir, dando ao Miguel aplausos e agradecimentos, por tudo que ele fez em 5 anos, com aquela bondade e simpatia, repito, em prol união fraterna de todos os colaboradores e suas famílias.

Miguel, você nunca será esquecido, temos dentro de nossos corações uma imagem fraterna de um irmão com um coração que vale ouro. Em geral, somos da faixa de idosos, por isso devemos honrar nossa condição de colaboradores, continuar o trabalho do Miguel, se alguém se manifestar em receber o cetro dessa missão, que se manifeste.


Como último parágrafo desta ode, peço, em nome de meus colegas que você, Miguel, continue a tarefa iniciada por você, nós te amamos, Miguelão; você mora em nossos corações. Um abração.



Por Modesto Laruccia

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Nem te conto...



Imagem: Biblioteca Malba Tahan

Estamos todos assanhados para aprender informática. 

A sala cheinha de gente. Gente cheinha de experiência. O local: Telecentro Malba Tahan, na Biblioteca do mesmo nome, em Veleiros, Capela do Socorro. 

O duro que é uns estão com pouca acuidade visual. Outros com a audição um tanto avariada e todos com alto colesterol e algumas câimbras inexplicáveis que acabam surgindo no meio das explicações. 

E por falar em explicações, após tantos: - 'hein(?) e não tô vendo'- a professora Gisele ensinou logo a clicar em ' Ver e Ampliar', uma lição imprescindível.

Algumas vezes, perdemos o fôlego porque clicamos mal e apaga tudo. Não queremos passar vergonha. Pressão a mil.

Leques, garrafinhas de água e muita sudorese pra ninguém botar defeito. Olhos estatelados na tela e mão descontrolada que teima em apresentar mal de Parkinson bem na hora de arrastar o tal do mouse e clicar. Êta nóis! Devia ter desfibrilador nesta sala! Má circulação, taquicardia e uma ânsia de saber. Não temos tempo a perder.

Para aulas de HTML avançado, a presença do cardiologista devia ser obrigatória. Ser um internauta é muito perigoso.

A Gisele passou semana inteira se esgoelando: Cliquem em Ver e Ampliar. 

Na sexta-feira seguinte, não é que tinha um cara na porta do Telecentro entregando panfletos: "Exame de vista grátis e óculos em suaves prestações".

Nem te conto!



Por Suely Schraner

Obs: Se quiserem ouvir esta história em áudio, acessem o link: 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Um príncipe na Mooca - 2ª parte



Noto que o Waldemar se esforça pra se fazer acreditar, eu acho que ele não mente, gosta de falar comigo, (nossas secções são bem próximas) e sempre conversamos sobre vários assuntos.
Mas, uma pequena e maldosa suspeita alimenta minha eterna curiosidade: ele chega a esse emprego, respondendo a um anúncio ou alguém sugeriu ao sr. Henry?  Não fico sabendo, pois ele procura desconversar quando indagado. Não me incomodo e nem me interessa, se  ele é escolhido, dentre vários candidatos, é porque é um bom gravador.
Porem, a coincidência de ele ser negro, também, não haveria um “dedo” do sr. Henry na opção? Mas, ele, o Waldemar, pessoa de fino trato, não se daria a estas intimidades sexuais, não pode ser, essa desconfiança minha é pura imaginação.

Uma tarde, durante  nossos  afazeres, o Waldemar me convida pra tomar um café no bar próximo. Temos essa liberdade, por sermos do setor artístico (sic) da empresa. No bar, pergunta se eu já tinha experimentado lasanha. Respondi que já tinha ouvido falar, mas ainda não havia saboreado. (só alguns anos depois do termino da guerra é que começaram a se popularizar as  delícias italianas). “Ah, neste caso, convido vc pra uma lasanha no “Gato que ri”, do largo do Arouche. Vc aceita, não é?”
“Sim”, respondi.
“Hoje é sexta-feira, vamos amanhã, sábado,  jantar”
“Nada me impede de aceitar seu convite, Waldemar, só se for almoço, minha noiva, a Myrtes me espera, a noitnha, sou noivo, vc sabe”
“Muito bem, Modesto, então vamos almoçar, sabe onde é, no largo do Arouche”

Algo perturba minhas “pequenas células cinzentas”, como diria Herculet Poirot, de Ágata Crhistie. Conheço a fama do “Gato que ri”, almoçando com um negro (não me move nenhum preconceito, fica bem claro, naquela época, porém, as coisas não eram assim, tão liberais como hoje).
Guloso como poucos, chego lá as 13 horas, conforme o combinado.  Essa é a primeira lasanha que como.  E gosto. Durante o almoço conta-me mais detalhes sobre seus parentes, sua falecida mãe, que era muito querida pela vizinhança da Mooca, entre seus predicados, era  pianista , formada em universidade africana, seus bens que irá recuperar quando a África tiver um governo democrático. Promete-me presentear com uma pedra preciosa, pois, sua fortuna está toda ela em pedras,  jóias e propriedades.

Passados alguns meses, uma tarde ouço um tremendo barulho vindo da gravação. O Waldemar sai da secção todo rasgado, gritando com o sr, Henry e um dos aprendizes, o Edson, com quem havia se atracado numa luta desesperada, com  xingamentos e ofensas pesadas de ambos os lados. Acalmados os ânimos, Waldemar tenta, em rápidas palavras, me contar o ocorrido: “Esse negrinho sem vergonha e “sua companheira”, (referindo-se ao sr. Henry) querem me solapar, fazem de tudo pra me prejudicar, sabotam meu serviço mas, não vão conseguir nada.”
Conseguem, sim, os dois são despedidos, o sr. Henry é mantido e, por ordem superior, nada mais foi comentado, o fato fica proibido de ser debatido, dentro da área industrial.

Fico com pena do Waldemar, logo depois, fora da fábrica o Joaquim, o imediato do sr. Henry, me conta algumas particularidades dos acontecimentos.
“Modesto, - começa o Joaquim – vc nunca percebeu nada? Nunca ficou sabendo das sacanagens que eles aprontavam?” - não, - respondi,-  sabia apenas que eles tinham “casos” , mas só entre o sr. Henry e os outros dois.
“ O que acontecia, lá dentro, (referindo-se a secção de gravação) é coisa de louco. O Edson, enciumado pelo sr. Henry, imaginava um “caso” com o Waldemar e o sr. Henry, supunha um caso do Waldemar com o outro, o Ademir. E o pior de tudo, vc não sabe, o Waldemar é, também, homossexual.

Trabalho na Shellmar mais um ano, caso com a Myrtes, arrumo emprego no Matarazzo, onde fico 15 Anos, os melhores de minha vida profissional.
Saio do Matarazzo, vou pra Pan Brasil, já como vendedor. Quem  encontro lá? O sr. Henry, muito alegre e contente, disse ter trabalhado na gráfica da revista Manchete, no Rio de Janeiro, que tinha saído de lá porque a revista fechou.
Casou, (?) com uma negra, tinha dois filhos e era feliz.  Poucos meses se passaram, adivinhem quem apareceu na Pan,  pra trabalhar.? O Waldemar, abatido, doente mal vestido, acabado. Converso com ele, me conta que nada deu certo na vida dele, se puder, vai trabalhar muito pra se recuperar. Não fica mais do que alguns meses, vai embora e o sr. Henry, também.

Termino aqui minha narrativa, com uma dúvida, até hoje, um mistério pra mim: a coincidência que, depois de mais de quinze anos, reencontro os dois personagens de minha história e onde foram parar, o Sr. Henry e o Waldemar, príncipe da Mooca. Espero que tenham encontrado um caminho ou, um destino melhor,

Diante da onda avassaladora de fatos relacionados com homofobismo, homossexualismo, pederatismo, com as múltiplas apresentações de peças, shows, telenovelas, radiofonizações de caráter atrativo e pedagógico, explorando estes segmentos, lembrei-me de fatos que, na época não dei a importância devida, mesmo por que, não era muito apropriado a menção  desses fatores em qualquer redação ou menção em papos de esquinas.

Pelos jornais e revistas, pode-se sentir a enorme diferença  nas publicações entre aquela época,  (1940\50\60), e atual, a recorrência de termos que, outrora, por tabus ou receios da opinião pública,  não havia abuso. Simplesmente o redator recorria a um sinônimo ou, eufemisticamente mencionava, num texto qualquer,  rebuscava toda a seqüência da crônica afim de fugir da palavra correta mas, ofensiva aos leitores alheios a esta “ousadia”.

Com a permissão dos amigos leitores, vou  recorrer ao tempo verbal, presente, o que pretendo contar.
Todos os nomes citados são fictícios, por motivos óbvios e pra que eu tenha um pouco mais de liberdade. 

Pois bem, por volta dos anos da década de 1950, na eminência de casar, trabalho numa empresa de embalagens, Shellmar, empresa americana, que esta localizada na rua Pres. Batista Pereira, travessa da av. Presidente Wilson, entre a Moóca e Vila Prudente, conhecida como “ilha do sapo”,  na função de  desenhista. Como vizinhos, temos  uma industria relativamente nova, a Kibon, fabricante e distribuidores de picolés, popularizando a venda em carrinhos, como fazem, atualmente os ambulantes de guloseimas destinadas as crianças.
Temos, também,  a Lorenzetti, Arno, Cia Antártica e outras empresas de porte.

Na Shellmar, no setor de desenho, somos três funcionários, com a grande artista Anna, alemã  que relata a nós, as atrocidade sofridas na Alemanha, perseguida que foi por ser judia. Muito simpática, mas enérgica nas atividades correlatas, como  chefe da seção. O setor de gravação de cilindros, tem, como chefe, o gravador suíço, sr. Henri, altamente técnico, favorecido pelo empirismo,  adquiridos em seu pais.
Os auxiliares do sr Henry, são três, o Joaquim, com mais experiência é o imediato do chefe e os outros dois rapazes,  aprendizes. Os dois aprendizes, Edson e Ademir, são negros, o Joaquim, não. Poucos meses se passam pra eu ficar sabendo que o sr. Henry é homossexual, tem visceral preferência por negros, como parceiros e os dois aprendizes, Edson e Ademir,  são tratados com todo cuidado, respeito, carinho e paparicados por ele, sr. Henry. Os dois membros do pequeno harém do sr. Henry, são simpaticíssimos, educados e muito bem asseados, com vestimentas muito bem selecionadas, só da “A Exposição”.

O ambiente é sempre bem amistoso, há bons papos e boas situações irônicas, como o que aconteceu com um porteiro, Benedito, negro, alto, quase dois metros de altura mas, de uma simpatia quase infantil, tanto é sua inexperiência dos fatos da vida atual. Um dia, passo por ele e noto que está com uma lámina apontando o que parecia ser um lápis. Ele me pergunta: “Seu Mudesto, meu lápis num escreve mais, acabou a ponta e não encontro mais o grafite, por mais que tento cortar essa madeira tão dura... o sr. pode ver se consegue?”  Logo vi que o que ele tem em mãos é a recem-lançada caneta esferográfica, sem gozação, conto a ele e ele fica admirado.

Um dia desses, soubemos que foi contratado mais um gravador, de nome Waldemar Costa, moço de uns 27 ou 28 anos, também negro.
Fomos apresentados, o Waldemar é muito simpático, educado tem, nas palavras proferidas, algo que foge um pouco do português comum. Exprime bem termos poucos usuais, delicada e corretamente, sem fugir de uma conversa sobre qualquer assunto.  É delicado nos gestos, nobre nas atitudes, de uma bondade sem igual, sempre pronto a servir quem dele precisasse.

Como fanático leitor de contos policiais e de mistério,  minhas eternas suspeitas de haver algo de, não errado, mas diferente nos dias que seguem, vou a fundo. Converso com Waldemar e ele se abre comigo.  “Modesto, não sou brasileiro, sou africano, meu nome, Waldemar, é o que recebi na pia batismal da igreja católica da Moóca, onde moro. Meu nome é Faissal, sou um... príncipe, descendo de  família imperial. Meu pai, preso pelo rei Farouk, está sendo julgado por posse indevida do protetorado de sua responsabilidade.
Meu tio, irmão do meu pai, foi fuzilado, perdemos nossos bens e fugimos, eu e minha mãe, viemos para Brasil. Minha mãe, não resistiu a separação, faleceu algum tempo atraz. Estou sozinho aqui, aprendi a gravação graças a minha mãe que gozava de boas amizades, não quis ser mais muçulmana, pra mudar meu nome, fui batizado com o nome cristão, Waldemar.”




Por Modesto Laruccia

sábado, 12 de outubro de 2013

Um príncipe na Mooca



Diante da onda avassaladora de fatos relacionados com homofobismo, homossexualismo, pederatismo, com as múltiplas apresentações de peças, shows, telenovelas, radiofonizações de caráter atrativo e pedagógico, explorando estes segmentos, lembrei-me de fatos que, na época não dei a importância devida, mesmo por que, não era muito apropriado a menção  desses fatores em qualquer redação ou menção em papos de esquinas.

Pelos jornais e revistas, pode-se sentir a enorme diferença  nas publicações entre aquela época,  (1940\50\60), e atual, a recorrência de termos que, outrora, por tabus ou receios da opinião pública,  não havia abuso. Simplesmente o redator recorria a um sinônimo ou, eufemisticamente mencionava, num texto qualquer,  rebuscava toda a seqüência da crônica afim de fugir da palavra correta mas, ofensiva aos leitores alheios a esta “ousadia”.

Com a permissão dos amigos leitores, vou  recorrer ao tempo verbal, presente, o que pretendo contar.
Todos os nomes citados são fictícios, por motivos óbvios e pra que eu tenha um pouco mais de liberdade. 

Pois bem, por volta dos anos da década de 1950, na eminência de casar, trabalho numa empresa de embalagens, Shellmar, empresa americana, que esta localizada na rua Pres. Batista Pereira, travessa da av. Presidente Wilson, entre a Moóca e Vila Prudente, conhecida como “ilha do sapo”,  na função de  desenhista. Como vizinhos, temos  uma indústria relativamente nova, a Kibon, fabricante e distribuidores de picolés, popularizando a venda em carrinhos, como fazem atualmente os ambulantes de guloseimas destinadas às crianças.
Temos, também,  a Lorenzetti, Arno, Cia Antártica e outras empresas de porte.

Na Shellmar, no setor de desenho, somos três funcionários, com a grande artista Anna, alemã  que relata a nós, as atrocidades sofridas na Alemanha, perseguida que foi por ser judia. Muito simpática, mas enérgica nas atividades correlatas, como  chefe da seção. O setor de gravação de cilindros, tem, como chefe, o gravador suíço, Sr. Henri, altamente técnico, favorecido pelo empirismo,  adquiridos em seu pais.
Os auxiliares do Sr Henry, são três, o Joaquim, com mais experiência é o imediato do chefe e os outros dois rapazes,  aprendizes. Os dois aprendizes, Edson e Ademir, são negros, o Joaquim, não. Poucos meses se passam pra eu ficar sabendo que o Sr. Henry é homossexual, tem visceral preferência por negros, como parceiros e os dois aprendizes, Edson e Ademir,  são tratados com todo cuidado, respeito, carinho e paparicados por ele, sr. Henry. Os dois membros do pequeno harém do Sr. Henry, são simpaticíssimos, educados e muito bem asseados, com vestimentas muito bem selecionadas, só da “A Exposição”.

O ambiente é sempre bem amistoso, há bons papos e boas situações irônicas, como o que aconteceu com um porteiro, Benedito, negro, alto, quase dois metros de altura, mas de uma simpatia quase infantil, tanto é sua inexperiência dos fatos da vida atual. Um dia, passo por ele e noto que está com uma lâmina apontando o que parecia ser um lápis. Ele me pergunta: “Seu Mudesto, meu lápis num escreve mais, acabou a ponta e não encontro mais o grafite, por mais que tento cortar essa madeira tão dura... o Sr. pode ver se consegue?”  Logo vi que o que ele tem em mãos é a recém lançada caneta esferográfica, sem gozação, conto a ele e ele fica admirado.

Um dia desses, soubemos que foi contratado mais um gravador, de nome Waldemar Costa, moço de uns 27 ou 28 anos, também negro.
Fomos apresentados, o Waldemar é muito simpático, educado tem, nas palavras proferidas, algo que foge um pouco do português comum. Exprime bem termos poucos usuais, delicada e corretamente, sem fugir de uma conversa sobre qualquer assunto.  É delicado nos gestos, nobre nas atitudes, de uma bondade sem igual, sempre pronto a servir quem dele precisasse.

Como fanático leitor de contos policiais e de mistério,  minhas eternas suspeitas de haver algo de, não errado, mas diferente nos dias que seguem, vou a fundo. Converso com Waldemar e ele se abre comigo.  “Modesto, não sou brasileiro, sou africano, meu nome, Waldemar, é o que recebi na pia batismal da igreja católica da Moóca, onde moro. Meu nome é Faissal, sou um... príncipe, descendo de  família imperial. Meu pai, preso pelo rei Farouk, está sendo julgado por posse indevida do protetorado de sua responsabilidade.
Meu tio, irmão do meu pai, foi fuzilado, perdemos nossos bens e fugimos, eu e minha mãe, viemos para Brasil. Minha mãe, não resistiu a separação, faleceu algum tempo atrás. Estou sozinho aqui, aprendi a gravação graças a minha mãe que gozava de boas amizades, não quis ser mais muçulmana, pra mudar meu nome, fui batizado com o nome cristão, Waldemar.”




Por Modesto Laruccia

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Retornando

Olá, amigos autores e leitores deste blog!
Estamos voltando com as postagens dos textos preciosos de todos os autores e colaboradores deste humilde espaço, que tem como objetivo divulgar as belezas e peculiaridades de Sampa, sob a ótica dos próprios autores.
Nossa ausência se deu por excesso de trabalho profissional que nos levou a muitas viagens fora de Sampa. Mas, agora, já mais tranquila pela finalização de todos os projetos de 2013, posso atualizar o blog.

Conto com a valorosa colaboração de todos vocês e, também, com a presença e comentários em todos os textos.
Estou aguardando a foto da pequena Helena, filha de Marcos Aurélio e Isabel, nascida recentemente.

No mais, deixo-lhes com o texto de nosso querido Arthur, logo abaixo.
Com meu carinho de sempre.
Muita paz! Beijosssssss

Sonia Astrauskas

É Campeão!



Ser corintiano é ser consciente
Que sempre ter-se-á pela frente
Muitos radicais opositores,
Que são também como nós
Fanáticos torcedores
De outros times rivais.
Que sempre estarão unidos,
Para  torcer contra nós.

É também estar consciente
Que teremos muitas alegrias
E até algumas tristezas,
E por fim, tal e qual acontece agora.
Chegaremos a grandes vitórias,
De um titulo Mundial.
E então como melhores do Mundo
Sentir que aqui nesse planeta
Não existe nenhum esquadrão
Melhor que o nosso TIMÃO.

Ganhamos o Brasileirão
Invictos a Libertadores
E também esse Mundial,
E se um dia houver um campeonato
Na lua ou em outro planeta qualquer.
A fiel vai estar lá presente
Seja lá onde for
Haverá invasão corintiana
Com uma bandeira na mão
Esse enorme Bando de Loucos
Irão gritar como poucos
Em frente! Oh, poderoso Timão.

Depois desses anos seguidos
De magoas e desilusões,
Muitos horríveis apelidos
Tivemos que suportar.
Faz-me rir, arroz brejeiro,
Tou limado, e até o tal Gambás.
Mais o castigo dessa tal segundona,
Fazendo a Fiel toda chorar.
Então veio essa volta por cima.
A libertadores, e também o Mundial

Nosso time rodou a baiana
A atual Nação Corintiana
Verdadeiro Bando de Loucos
Tomou de assalto o Japão
Trazendo lá do estrangeiro
Para o nosso torrão brasileiro
Esse titulo de Campeão.

E agora essa festa nas ruas
de nossa bela capital
é o Corinthians nos braços do Povo
com o titulo de Campeão Mundial,
nessa bela manhã paulistana
o preto e branco domina a cidade,
são crianças, jovens e adultos
alegria jamais teve idade.
todos querem saldar o Corinthians
e gozar essa felicidade.
Gritando bem no meio da rua!

È !!!  CAMPEÃO.




Por Arthur Miranda (tutu)

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Viaducto Santa Ephigenia - 100 anos 26/07/1913 - 26/07/013


imagem: Viaduto Santa Efigênia 1913 e 2013

Alguém, Paulista e Paulistano pode me dizer, em número de quilômetros, o quanto andou, percorrendo, indo e vindo, pelo Viaduto de Santa Efigênia?
Duvido que alguém saiba... Nem eu mesmo o sei. Com certeza foram muitos!
Quem, Paulista e Paulistano, hoje, ainda se lembra dele? Quero acreditar que, muitos ainda se lembram... Que não o esqueceram.
Mas, ao que parece, a Prefeitura, a Regional da Sé, a São Paulo Turismo, esqueceram dele.
Amanhã, ao que me parece, o Viaduto de Santa Efigênia completará  os seus 100 anos, sem bolo e sem festa. E sem convidados...
Sem festa, O MAIS ANTIGO VIADUTO EM USO DE SÃO PAULO está, como um velho hóspede de um desses depósitos, pomposamente chamados de Casa de Repouso, à espera de parentes que não virão.
_ “NATALE, VOCÊ SE ENGANOU! O MAIS ANTIGO VIADUTO DE SÃO PAULO É O DO CHÁ”!
_ “NÃO ME ENGANEI, NÃO! O PRIMEIRO VIADUTO DO CHÁ (inaugurado em 1892) FOI DESMONTADO Entre 1938-1939, QUANDO O SEGUNDO VIADUTO, EM CONCRETO, FOI INAUGURADO (1938). E O SEGUNDO VIADUTO AINDA NÃO CHEGOU AOS 80 ANOS”.
Penso com ironia no ano de 1992, quando se fez com toda a pompa e circunstância, as “festas de 100 anos” de um viaduto que tinha pouco mais de 50 anos...
Voltemos ao Santa Efigênia.
Ao contrário do antigo Viaduto do Chá, o Viaduto de Santa Efigênia é uma obra de arte.
Projeto de Júlio Micheli, parte metálica importada da Bélgica e montagem a cargo da Firma Lidgerwood Manufaturing Co. Ltd.
O peso do aço dissolve-se, na beleza do projeto, passando a impressão de leveza.  Arcos apoiados em pedra de cantaria finamente recortada. Os parapeitos da pista  é um fino trabalho de serralheria, estilo “Art Nouveau”. E neles, de espaço em espaço, afixadas luminárias no mesmo estilo. Nas calçadas, postes em forma de tridentes sustentando a rede elétrica dos bondes. E, do lado esquerdo de quem vai do Largo São Bento ao Largo de Santa Efigênia, uma escada levava ao sanitário público (local onde hoje está o mezanino da estação São Bento do metro). Um dos primeiros sanitários a ser cuidado, sanitizado e vigiado pela prefeitura.
Viaduto de Santa Efigênia. 100 anos embelezando a Cidade, poupando a ´população das agruras da Ladeira de São João e, mais que isso, 100 anos como testemunha da História de São Paulo, como as Revoluções de 1924 e 1932.
E 100 anos -  um século, de sua história pessoal:
No começo, os bondes eram “os senhores do viaduto”. Então vieram os automóveis. Velhos “landaus”, “coches” e suas parelhas foram aposentados. Bondes e automóveis! Bondes,  automóveis e – Meu Deus! – os “Omnibus” (ônibus)!... Bondes, automóveis, ônibus, lotações, utilitários, motos... Depois Lambrettas, Vespas, Volkswagens, Dauphines, Gordines, DKWs e, acredite, um trambolho de nome Romi-Izzeta!...
São Paulo, uma cidade evoluída, progressista. Da pra acreditar que ainda circulam carroças de entrega? Pois é!...
E o Viaduto, através das décadas foi sendo abalado na sua capacidade estática e rolante, necessitando, cada vez mais, de reparações onerosas. Quase desativado foi deixado ao Deus dará... As lindas luminárias desaparecidas há muito tempo, o banheiro em extrema decadência foi fechado. Agonizava o viaduto.
Durante e depois da construção da Estação São Bento do Metro, de passagem de pedestre, o Santa Efigênia foi tomado pelos ambulantes.
Com a revitalização do Vale do Anhangabaú, cogitou-se o desmonte do Viaduto. O clamor público fez com que o Patrimônio Histórico reagisse rápido tombando o Santa Efigênia. Restaurado, transformado em calçadão ele continua lá. Sabe Deus por quanto tempo!
Ele é velho, velhíssimo. Mas é tão Paulistanamente Paulista. Ele é São Paulo.
Alguém, Paulista e Paulistano pode me dizer, em número de quilômetros, o quanto andou, percorrendo, indo e vindo, pelo Viaduto de Santa Efigênia?...





Por Wilson Natale